Old School Nerds

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segunda-feira, 21 de junho de 2010

Toy Story 3 - Crítica 1

Pixar realiza o grandioso e absoluto final de sua maior saga .

Quando Toy Story foi lançado em 1995, o sucesso foi imediato. Com revolução na parte técnica e profunda criatividade na hora de contar histórias, todos se apaixonaram pelo primeiro filme de Woody e Buzz. Ora, a continuação foi feita em 1999 , com mais uma boa história e uma constatação que já rondava as mentes dos bonecos : “ Um dia Andy vai para a faculdade, e todos seremos esquecidos’’ . Mesmo com essa mensagem na cabeça, todos os brinquedos continuaram fielmente ao lado de Andy, até quando tudo acabasse. Onze anos depois de Toy Story 2 e quinze anos depois de sua primeira aventura, a Pixar decide corajosamente retratar o dia tão temido pelos brinquedos . Corajosamente, pois realizar uma sequencia de um filme depois de mais de uma década, é de um risco inimaginável. Há toda uma geração nova, e as crianças de 1995 são adolescentes crescidos de hoje em dia. Mas a trilogia assim foi pensada. A maior saga da Pixar chega ao seu ponto final .

A trama é levada ao espectador de maneira reta, crucial, sem rodeios. Os personagens estão reduzidos , e não dúvida do que aconteceu com eles : foram jogados fora . Os bonecos sentem tudo que ocorre a sua volta, mas o que poderiam fazer? A hora também chega para os poucos que restaram. Quando Woody fala para os brinquedos se reunirem, e a resposta é “Estamos todos aqui , Woody” há um vislumbre do que o filme representará para todos os personagens. Na trama em si, Andy decide que levará apenas Woody para a faculdade , e que todos os outros brinquedos ficariam no sótão . Por azar do destino, os brinquedos são colocados no saco do lixo, e ao pensar que seriam jogados fora, fogem para a caixa de doações que vai para a creche Sunnyside. Começa então a tentativa de Woody em trazer os companheiros de volta para casa , e mostrar que foi tudo um engano . Mas todo o grupo se decide em ir para a creche, e ser eterno lá . É a volta do discurso de Toy Story 2, onde rondava o questionamento de fidelidade á casa de Andy ,ou favorecimento solo.

E não há questionamentos de que esse é o filme mais adulto e dramático da série Toy Story, e muito provavelmente o da Pixar também . Não há mais o tom de porto seguro, e o termo “voltar pra casa” já não tem o mesmo significado que antes. A simbologia mais clara de que este é o filme mais realista e sombrio dos cativantes personagens está no início da película . Em 1995, no original , o filme começa com Andy brincando com seus bonecos, e sua voz narrando enquanto os balança pelos móveis de seu quarto. A partir da cena mostrada, somos introduzidos á imaginação do menino. Em Toy Story 3, o filme se inicia com uma cena épica de aventura dos brinquedos e logo corta para a cena do mesmo Andy pequeno brincando com seus bonecos. A mensagem que fica é que nesse filme não há mais espaço para deslizes ou brincadeiras. O destino deles é definitivo e real. O que se segue após essas cenas é a seqüência de filmagens feitas pela mãe de Andy quando ele era pequeno. Neste momento, temos certeza de que não sairemos da sala de exibição sem chorar pelo menos uma vez.

O foco do roteiro como sempre , é na construção de personagens. Ou melhor, desconstrução de personagens . A maior parte das personas de Toy Story 3 já está estabelecida na mente de todos que assistem, e não cabe acrescentar nenhuma informação nova . O destino do filme é levar todos esses personagens ao limite : da emoção, da razão, da força , da esperança . E é assim que o filme corre ; sob a pressão de todos os acontecimentos , Woody assume a responsabilidade de protagonista , e tem o dever de reunir todos os amigos e salvá-los do destino trágico ; Buzz tem a força necessária para assumir a liderança do grupo em vários momentos, e não demonstra fraqueza perante os desafios monstruosos . Como resultado disso tudo tiramos a mensagem que o filme passa durante seu desenvolvimento : Não importa a crise pela qual passamos, mas a tradição e a amizade dos companheiros é maior do que qualquer promessa falsa .O símbolo máximo disso é uma das cenas finais, onde todos os personagens, cientes de seus destinos e incapazes de reverter a situação, simplesmente dão-se as mãos, enquanto a música dramática sobe. Um dos gestos mais emocionantes que já vi em toda a história do cinema. Passar incólume a cenas desse tipo é impossível .

E a escolha da direção foi das mais acertadas. Lee Unkrich pode não ser o melhor cineasta, mas soube utilizar todos os manerismos típicos da série, sem errar na mão , dirigindo ação de maneira incrível e tornando todos os momentos épicos e emocionantes . Escolher o diretor do primeiro longa, John Lasseter, seria menos correto . Apesar de Lasseter ser genial , é um diretor que cria ótimas obras originais, e o que este último capítulo não pedia originalidade, mas sim forte emoção e engrandecimento dos personagens. E foi o que Unkrich conseguiu fazer com sucesso . As sensações de nolstagia que ele consegiu passar ao público ainda vão ecoar por algumas semanas.

Por fim, Toy Story 3 passa sem erro nenhum , superando as expectativas criadas e tirando o medo que muitos fãs (inclusive aquele que vos escreve) que o filme fosse ruim e estragasse a série. Muito pelo contrário . O longa de 2010 de Woody e Buzz consegue honrar seus predecessores e ir além , superando os outros dois filmes e se consagrando como o melhor da trilogia . Somando todos os seus extratosféricos acertos , a constatação final é indubitavel : Toy Story 3 é isoladamente o melhor filme do ano até aqui, e um dos melhores filmes da história. Divertido. Emocionante. Dramático. Perfeito.

5 Estrelas *****

domingo, 20 de junho de 2010

Kick-Ass


FUCKIN' AWESOME!


Mark Millar sempre foi um escritor extremamente polêmico. E competente. Desde trabalhos obscuros e irônicos como O Procurado até mega-blockbusters em páginas de quadrinhos, como Guerra Civil e Old Man Logan, Millar é um sucesso entre os críticos e os leitores, sendo sucesso de vendas. Ainda fez um clássico moderno pela Marvel, Os Supremos, que é tido como referência pra criação de Universo dos filmes Marvel. Em 2008, Millar resolveu escrever outra história. Dessa vez, rumava para o rumo irônico que se tronou sua marca. O tema: O que aconteceria se um fanático por quadrinhos virasse um super-herói? Juntando tudo ao gênio vivo chamado John Romita Jr. e temos Kick-Ass. A HQ fez muito sucesso e os fãs(eu entre eles, diga-se de passagem), aguardavam ansiosamente a conclusão dela(as 8 partes saíram de 2008 a 2010, com incrível atraso) e a adaptação cinematográfica. Cerca de 3 meses depois do melancólico final da HQ, surge o filme nos cinemas. E com censura 18 anos, o que torna evidente o fato da HQ ser ultra-violenta. E como ficou o resultado? Alucinantemente sensacional.

A trama gira em torno de 3 arcos principais. O de Dave Lizewski(Aaron Johnson), um adolescente de 16 anos, nerd fanático por HQs que quer se transformar em super-herói por não mais aguentar as pessoas nada fazerem pra combater o crime. O do mafioso Frank D'Amico(o cada vez mais genial Mark Strong), que quer descobrir quem é o tal super-herói que está matando seus homens e o de Big Daddy e Hit-Girl(Nicolas Cage e Chloe Moretz), dois super-heróis, pai e filha, que querem vingança contra D'Amico por ter feito sua esposa e mãe ter se matado. E ainda temos o filho de Frank, Chris(Christopher Mintz-Plasse), que vai completar 18 anos e quer ter um papel central na "família". A trama se extende até o meio com agilidade e muitas informações engraçadas e construção de personagens formidáveis.

Porém, se o espectador achar que é apenas um blockbuster comum, se chocará.

Kick-Ass tem doses cavalares de violência, que justificam uma censura R nos USA e tem palavrões a todo momento, sendo eles proferidos por um mafioso irado ou uma menininha de 11 anos. Essa, por sua vez, é a Hit-Girl, que esfacela criminosos ao longo de toda a película e com requintes de violência realmente extrema(mutilações, tiros na cabeça e até mesmo uma morte pelas costas, de uma mulher "indefesa"). Logo, se o espectador preza pela dignidade moral e acha repreensível comportamentos violentos, corra do filme. É um dos maiores e mais divertidos exemplos da glamurização da violência de toda a história do cinema. Tudo isso potencializa o fato de que Kick-Ass, como bom filme de nicho que é, se tornará um novo cult, a ser apreciados por cidadãos que prezam por uma boa história.

O roteiro de Jane Campion e Matthew Vaughn é simplesmente sensacional por transformar a já difícil de digerir HQ de Millar e Romita Jr. em uma película absurda e original ao extremo. Além de abusar dos clichês de todos os filmes de super-herói(o Big Daddy se veste como o Batman, Dave é um típico Peter Parker, as motivações dos heróis são todas chupadas de quadrinhos), o roteiro expõe uma excelente crítica a sociedade ridícula que tomou conta do mundo, áquela que nem liga em ter violência urbana nas ruas e esqueceu honra e respeito. Quando frases geniais como "Por que todos querem ser Paris Hilton e ninguém que ser o Homem-Aranha?" são proferidas, a verdadeira identidade da primeira metade do filme fica evidente. Segue á risca a aversão aos clichês(e deboche a eles). Porém, na segunda metade do filme, ele se torna um filme mais sério, se tornando um filme de personagens e deixando os clichês, se distanciando da HQ. E, sinceramente, ficou bem melhor. O final da HQ seguia a linha de deboche aos clichês. Resumo: Dave terminava simplesmente acabado. Não conseguiu nada que queria, um desastre total. Já no filme, o roteiro visou mais um apego aos personagens e uma linha séria, o que só transformou o filme numa experiência soberba, irretocável. Mesmo que o distanciamento cronológico do que houve na HQ tenha ocorrido, nas telas Kick-Ass continuou extremo, alucinado e corajoso, sem ter amolecido ou reduzido a fortíssima mensagem(gráfica e mental) que a HQ pensava. Os ideais permaneceram, mas os personagens foram premiados por eles. Em síntese, o que se coloca em Kick-Ass no cinema é mais simples do que na obra original, despertando emoções mais verdadeiras e apego mais fácil e tangível à história, deixando assim toda a narrativa mais palatável ao espectador, sem tirar sua originalidade ou sua mensagem.

Tendo um roteiro fiel e bem adaptado, o que Matthew Vaughn faz na direção é acima da média, mas sem abusar demais. -o que é bom no caso desse filme - Enquadra atores perfeitamente bem, diferente da maneira enlatada de Hollywood , e utiliza planos limpos e largos como o quadrinista John Romita Jr. fez na HQ . Quando abusa de cortes rápidos, eles não confundem o espectador, mas criam um dinamismo maior dos movimentos executados . Sem dúvidas, não perde o controle em momento nenhum, e permanece em sintonia com a proposta do filme. Para tanto, também precisou utilizar takes mais modernos (afinal o filme é modernidade pura) como a pistola indo na câmera e a divertida sequencia em primeira- pessoa de Hit-Girl.

Nas outras partes técnicas , Kick-Ass passa sem erros. A trilha sonora montada é uma colcha de retalhos de vários ritmos e canções, que no final combinam perfeitamente. As músicas entram com um propósito, tanto de criar uma ironia - como nas sequencias de mutilação de Hit-Girl - ou por puro estilo de fundo musical. Já a trilha original também consegue ter um espaço considerável, utilizando um estilo clássico a lá Hans Zimmer, tendo ritmos muito parecidos com o do último Batman. Mas a própria fotografia já deixa bem claro que Kick-Ass não é nada sombrio. Esse quesito, aliás , é importantíssimo para a compreensão final da mensagem da obra. Os quilos de violência do filme combinados com o toque colorido-vivo da fotografia , deixam bem claro que aquele não é uma película sombria, mas sim extremamente divertida, com alguns momentos non-sense e por fim, feel good.

Nas atuações, Kick-Ass também não erra. A escolha mais acertada parece ter sido da garota Chloe Moretz, que não só atua soberbamente mas também parece ter adorado e se divertido nas gravações. Encontrar uma garotinha de 11 anos que participasse de tantas cenas de violência gráfica não poderia ser fácil, e a equipe achou a menina certa. Todos os outros tem atuações competentes, e Nicolas Cage não erra como Big Daddy, e concretiza-se em dois trabalhos seguidos sem nenhum erro .

Com toda a sua violência e proposta de criar um shake de cultura pop e de super-herois, Kick-Ass cumpre o que promete, mas vai além. Não só adapta de maneira perfeita a parte inicial da HQ escrita por Mark Millar ,como também apara seus erros na reta final . É definitivamente, então, melhor que sua obra original. O Kick- Ass dos cinemas é mais do que um fã podia esperar.
Não se espantem se no futuro esse filme reverberar como um consagrado cult de nossa década. Ele merecerá - e merece- todos os elogios .

*****5 estrelas*****