Old School Nerds

Old School Nerds

segunda-feira, 28 de março de 2011

Batalha de Los Angeles

Meliante metido a cineasta faz amálgama digno de Michael Bay se tornar uma tortura extrapolada .

Antes mesmo do logo da Columbia Pictures desaparecer no fade-out que precede o primeiro fotograma de Batalha de Los Angeles , já escutamos aquele som típico dos longas de Rolland Emmerich : Algum jornalista alegando um desastre sem precedentes em algumas regiões do planeta . Então, quando o filme de Jonathan Liebesman realmente começa, somos jogados á um redemoinho de imagens tremidas, dentro do foco do desastre, para depois sermos enviados ao arco que interessa ao filme - um helicóptero recheado de marines que sobrevoa uma área onde naves alienígenas caem aos montes . Gerando uma tensão interessante, o título aparece em tela numa imagem aérea épica e desoladora . Tudo fica preto . Então o filme começa de fato . E não demora mais que um minuto para ter-se idéia da hecatombe nuclear que Batalha de Los Angeles realmente é .

Dentro desses poucos minutos de filmagem interessante e agressiva, fomos claramente enganados , mas talvez seja apenas uma dose irrelevante de enganação comparada á daqueles que aguardavam euforicamente pelo filme - criando um hype que se revela obviamente falso - devido aos trailers bem montados e cartazes no mínimo criativos . Perante á película, porém, não há como ser enganado - a babaquice de níveis estrondosos que essa produção mostra ser, não pode se esconder de ninguém . Um erro em cima do outro , tudo que poderia implodir qualquer filme , foi introduzido á mistura, e o mínimo que poderia dar certo , foi elevado a níveis de uma overdose fatal .

Explico . Batalha de Los Angeles utiliza uma trama extremamente simples - dignas de filmes de Michael Bay ou Rolland Emerich - mas extrapola qualquer ponto, não usa nenhuma medida para estacionar sua cotação em apenas ''ruim'' , não controla qualquer perímetro de qualquer que seja o aspecto, resultando numa verdadeira catástrofe . Os clichês de Bay e sua excitação com o exército americano - o diretor de Armaggedon deveria ter sido um peseudo-personagem tipo Tio Sam, e não um cineasta - se fazem presente de maneira exponencial , e Jonatahn Liebesman mostra seu apreço incondicional ao ridículo . A máxima antológica do sargento batendo continência em frente a bandeira americana , é , acreditem ,uma das passagens patrióticas mais leves do filme . A saudação aos marines é intensa , sufocante, angustiante de tão inflada . Assim como outros pontos do filme , esse nacionalismo inchado, que numa dose baixa pode até ser engraçadinho, se torna nocivo com o passar do tempo de exibição .

E se Jonathan Liebesman tem um amor incondicional ao exército americano - mesmo sendo sul-africano - parece não possuir tanto apreço a materiais básicos e essenciais para a vida de qualquer cineasta - como um mero tripé, por exemplo . É a única explicação para tamanho descaso e desuso de qualquer apoio ou sustentação de sua câmera . Talvez seja mais fácil encontrar diálogos decentes no filme - e olha que esta é uma tarefa árdua e complexa - do que apontar um take estático que seja . Nada contra a câmera na mão . Quando bem usada, é fundamental para a respiração de um filme , como na urgência brilhante da câmera de Lee Daniels em Precious, para citar algum exemplo mais recente . Mas aqui , Liebesman exacerba . Demais .

Não é mera implicância , o projeto de diretor faz Michael Bay parecer cauteloso em seus cortes se comparado ao seu modo de filmagem em Batalha de Los Angeles . Urgência em alguns pontos é adequado. Usar o leve tremor da câmera e zooms intimistas em conversas descontraídas e nada importantes é, no mínimo, inadmissível . Sem falar que esses mesmos zooms intimistas acabam proporcionando um ar documental - e nem preciso dizer que tentar enxergar algo documental no exagero maniqueísta que Batalha de Los Angeles é, é simplesmente estapafúrdio . Pra encurtar, Liebesman usa câmera na mão o filme todo, perde qualquer potencial dessa técnica ao emprega-la durante modorrentos 116 minutos, e ainda de quebra deixa seus espectadores com dor nos olhos .

Mas se havia algum ponto que poderia dar certo no longa, talvez fosse uma diversão de um filme de pancadaria entre aliens e humanos . Entra em cena aí , então, o outro carrasco de Batalha de Los Angeles : Christopher Bertolini . O cidadão que criou o script do filme - não acho que chama-lo de roteirista seja prudente - deve possuir sérios danos mentais ou então fez o roteiro (roteiro?) para curtir com a cara do sagaz espectador . Aposto numa terceira opção, a pura falta de compreensão do que é bom, do que é ruim, e do que é desastroso . O último adjetivo , aliás, é perfeito para caracterizar o... err... hmm... roteiro , de Bertolini . Como um adolescente com ejaculação precoce , Bertolini inicia a pancadaria sem fim com uns 20 minutos - se muito - de filme . Pelos meus cálculos, tirando créditos , são mais de 95 minutos de pura ação , correria, tiroteio, explosões, etc.

Obviamente, em 20 minutos ele não explora adequadamente os personagens - e pelo o que o filme se propõe, isso nem era necessário - mas faz questão de colocar letreiros com nomes das personas quando elas aparecem - tomando a inteligência do espectador pela burrice que apodera sua mente . E no que se refere a esse espaço de pancadaria que toma conta da maioria do filme, deve-se dizer que , mais uma vez, há o claro exagero . Mesmo aquele que é mais aficionado por ação, achará Batalha de Los Angeles insuportável . Até determinado ponto, a loucura da batalha sem fim parece palatável , mas a partir de um determinado momento - principalmente nos 40 minutos finais - tudo começa a ficar extremamente enfadonho, cansativo, repetitivo e sem a menor graça . Ter sono nessa parte, e se sentir perdido, sem foco e sem atenção, não é difícil .

Tomando exagero e extrapolação como palavras de ordem básicas , Batalha de Los Angeles vai além de qualquer limite que qualquer cineasta ruim já teve . E se vai além no aspecto do absurdo, da ruindade , não tem nem a vergonha na cara de ser escrachado - como Michael Bay e Rolland Emmerich tantas vezes fazem . Não tem aquele ar de descontração dos filmes de Bay, por exemplo . Se leva a sério, e isso culmina com uma sensação perversa, mas verdadeira : a de que estamos assistindo a uma sátira de filmes de guerra , no estilo Trovão Tropical .

Não se espante se não perceber a ofensividade do filme enquanto assiste a ele . O teor exacerbado é tanto, que só adquirimos consciencia de seu ultraje a nossas mentes quando ele se encerra . Catarticamente, percebemos o terror que assistimos de maneira hipnótica . A sensação é de ter sido estuprado, não por um alien, mas por todo um pelotão americano patriótico. Agora, não sou eu que estou exagerando . É só o resultado do crime de Jonathan Liebesman, um verdadeiro violentador de mentes e de qualquer senso de sanidade intelectual.

1 Estrela * - Péssimo

Sem Limites

Neil Burger cria interessante lógica visual em bom roteiro.

Diretor com apreço pelo técnico, Neil Burger realizou em seu trabalho mais famoso, O Ilusionista, um dos mais belos filmes de 2006 em termos técnicos. Indicado ao Oscar por fotografia, com trilha de Philip Glass e direção de arte que cria com precisão o clima antigo da produção, Ilusionista já demonstrava a habilidade de Burger por trás das câmeras. Seu último filme, porém, foi bastante criticado. E sendo o roteiro do próprio Burger, o prudente era assumir apenas a função de diretor. E tendo em mãos o roteiro de Leslie Dixon, de Hairspray, Burger entrou de cabeça na adaptação do livro The Dark Fields, de Alan Glynn. Tendo no elenco Bradley Cooper, Abbie Cornish e Robert de Niro, Burger começou sua produção de 27 Milhões de dólares. Contando a história do escritor Eddie Morra, que ganha uma pílula que ativa 100% da atividade cerebral, Burger alcançou o topo das bilheterias americanas e ainda arrancou elogios da crítica americana.

E a receita desse sucesso é clara. Num filme que mescla boas situações, diálogos ágeis, bom humor e roteiro descomplicado, o resultado raramente dá errado. Nesse circuito ameno, é previsível ver como Sem Limites se tornou um sucesso. Ainda mais competindo com o ousado e contemporâneo Sucker Punch, que foi massacrado pelos críticos conservadores.

O roteiro de Dixon começa interessante. Ao criar um desnecessário, porém eficiente, prólogo, Dixon lança o espectador nos créditos iniciais com um tom de mistério interessante, pensando o que poderia ter levado o protagonista até aquilo tudo. E a primeira sacada vitoriosa de roteiro se reside ali: ao sugerir que o filme siga o caminho clássico, ou seja, conhecer a pílula-ascender na vida-cair do topo(literalmente, no caso), Dixon é esperta em brincar com o conceito do clichê do espectador, visto que quando a cena chega, Eddie já tinha caído, voltado ao topo e ainda continuaria oscilando entre eles até o final. Fugir do previsível se estabeleceu como a grande sacada do filme inteiro, que constrói situações interessantes até culminar no final poderoso em sua simplicidade, apenas por fugir das convenções comuns aos filmes do gênero.

Porém, se essa sacada implícita parece algo realmente memorável, não se espantaria se detectasse que ela é acidental. Ainda que o roteiro tenha um relativo esmero estrutural, os caminhos que levam ás tais situações interessantes são irritantemente esquemáticos. Se a própria insistente narração em off de Eddie já explica desnecessariamente a história, visando descomplicá-la, a carpintaria do roteiro pode soar engenhosa, mas é absurda quando relembrada. Ao criar algumas situações, Dixon as soluciona com desleixo, manipulando fatores apenas por ser uma solução conveniente. Quando Bradley Cooper precisa se livrar de um atirador, usa uma agulha para furar seu olho. O problema é: o homem pode atirar ainda sim com um olho. Então Dixon, se achando muito genial, acha relevante tornar o atirador cego de um olho, afim que Eddie escape com mais facilidade. Da mesma forma, ela torna a solução do problema de saúde que as pílulas causam, que permeia a trama toda, um evento que depende da idiotice de um personagem. Mais: Eddie não é revistado após ser o único na cena de um crime, tornando possível que ele leve as pílulas consigo. Se fossem situações irrelevantes, até daria para se perdoar esse erro. O problema é que todas essas são centrais á trama. E ainda tem mais de onde saíram essas, como o mafioso russo com a solução da pílula na agulha. Esquemático demais.

Mas se esses erros impedem o filme de ser memorável, ao menos não o tornam enfadonho, tampouco irrelevante. A versatilidade do roteiro em atravessar gênero com conforto(do drama ao suspense, humor, ficção e até mesmo duas sequências de ação) é notável e torna o filme uma experiência agradável. A já citada narração em off pode até incomodar o espectador mais atento ao explicar demais a trama, mas nos torna mais próximos do personagem e auxilia algumas passagens de humor. E a parte dramática inicial, refletida pela competente direção de arte no apartamento de Eddie, é sintetizada de maneira eficiente na conversa entre o escritor e sua namorada, que demonstra rapidamente as ambições e peculiaridades da personalidade do primeiro. A transição de gêneros ocorre de maneira fluida também, variando de acordo com o rumo que o personagem ascende.

E é nessa transição queda-ascenção que Neil Burger se engrandece. Se sua direção competente é feita com ângulos firmes, as cenas de delírio adotam a lógica visual esplêndida que Burger realiza aqui em Sem Limites. Os créditos iniciais já demonstram personalidade ao usar um gigantesco zoom que emulará, em uma cena mais á frente, a rapidez excessiva do raciocínio do protagonista, que não consegue acompanhar a própria mente. Mas é em conjunto do diretor de fotografia Jo Willians que Burger realiza a grande sacada visual: o contraste ensolarado-opaco. As cenas dramáticas são cinzentas, frias. A paleta de cores escolhida é opaca e as tomadas externas de Nova York só aumentam essa sensação triste. Já nas partes de ascenção, ágeis e interessantes, a fotografia vira ensolarada, quase dessaturada, com tons amarelados muito bonitos. E a supra-citada transição de gêneros não poderia ser melhor retratada pela fotografia: Quando tudo melhora na vida de Eddie, o primeiro lugar que ele vai é a praia, síntese solar. Não só estimulante visualmente, a fotografia de Willians é crucial á narrativa.

E é no delírio que Burger ganha mais liberdade. Colocando diversos Eddies na tela, afim de retratar passagem temporal, o americano ainda utiliza da paleta de cores distintas do filme para criar a sua própria lógica visual de delírio, quando mescla as cores de forma quase onírica. Profissional meticuloso, Burger ainda extrai boas interpretações de Abbie Cornish e Robert de Niro, além de tirar de Bradley Cooper uma atuação que segura tranquilamente o filme sozinho, demonstrando seu talento já demonstrado em Se Beber Não Case. E para finalizar, o diretor ainda conduz a cena de luta(!!!) que há num metrô de forma segura.

Ao quase se sabotar pelas soluções preguiçosas que escolhe pra resolver alguns entraves da trama, Sem Limites não consegue alcançar voos mais altos, mas se estabelece como um suspense divertido e competente. Seguro e bem-humorado, vale a visita. Engenhoso dentro de suas limitações, o filme de Neil Burger consegue agradar e traz o diretor á boa forma de O Ilusionista. Se escolhesse usar mais sugestões, como a perna manca dos consumidores da NZT, o filme poderia ser melhor. Mas mesmo explicando demais, acaba saindo vivo no meio de tanta besteira em cartaz.

Ao menos em manter o espectador interessado ao abandonar o lugar seguro de um final redentor, Sem Limites é poderoso.

*** 3 Estrelas - Mediano

domingo, 27 de março de 2011

Sucker Punch

Zack Snyder abraça seu estilo em filme de linguagem simples e visual.

Que o diretor Zack Snyder tem em suas principais qualidades o talento nato para a excelência visual , isso não é novidade para ninguém - pode até não ter sido o criador da câmera lenta acelerada , mas foi com certeza o cineasta que melhor a aperfeiçoou para uma estilística tão cool. Um esteta como poucos, Snyder herdou dos videoclipes essa sensibilidade e modernismo , e conseguiu os inserir de maneira estupenda em produtos que continham material intelectiual pré-existente. Foi assim nas batalhas plásticas de 300 , nos belíssimos cenários e coreografias de Watchmen. Mas atacar Snyder talvez fosse tão fácil quanto se encantar com seu desbunde técnico - e se ele não tinha dedo no script de seus filmes, sobressaía-se com êxito no seu modo de filmar. Agora , seu recente - e já controverso - projeto, Sucker Punch, chega ás telas do mundo todo.

Sendo este novo filme o primeiro projeto tirado por completo da cabeça do realizador , pode ser considerado um mínimo avanço narrativo para o diretor. Snyder busca em Sucker Punch um caminho de transição , mas principalmente uma busca por consolidação de identidade. Este, afinal , não é um filme que vem para reinventar a roda , mas sim para trabalhar o lado visual tão original de Snyder, em cima de um material de sua autoria. Um filme de gestos, de texturas visuais, assim como tantos outros, mas que se aceita assim por ser justamente calcado com simplicidade proposital no intelecto narrativo. E já fique avisado quem chama Snyder de clipeiro - aqui o diretor abre o peito para receber esse tão injusto rótulo, e faz os detratores engolirem o tom pejorativo.

A trama conta como Babydoll (Emily Browning) uma garota órfã , é colocada num hospício pelo padrasto, e lá , corre o risco de sofrer uma lobotomia. Para fugir deste destino nada agradável, a jovem entra em um universo fantasioso numa busca para escapar do sanatório onde foi colocada. Para tanto , ela vai utilizar da ajuda das também fugitivas Sweet Pea (Abbie Cornish), Rocket ( Jena Malone), Blondie ( Vanessa Hudgens) e Amber ( Jamie Chung).

O roteiro de Sucker Punch é simples , e tem como principal trunfo assumir essa simplicidade. Não é uma esfinge, nada mui elaborado ou complexo , mas que apresenta alguns conceitos e conexões narrativas ousadas -e por isso talvez tão rejeitadas mundo afora - no cinema. O foco aqui é no fetiche do escritor/diretor , e na explosão de idéias que o mesmo queria colocar em seu longa metragem. Cabe ao script basicamente achar esses possíveis espaços para onde encaixar tantos cenários diferentes, e tanta ação de variados tons. E o estratagema criado pro Snyder é muito interessante, pois gera diversas camadas de realidades - algo como em Inception , mas troque o termo ''sonhos'' por ''representações''.

Essas realidades, sobrepostas , tornam possível a compreensão da história , focada na fuga das meninas, em uma aventura de proporções apocalípticas. Mas é claro, incontáveis pessoas estenderão o dedo para atacar as frenéticas cenas de ação - que parecem e muito saídas de um video-game tresloucado - e culpar Snyder pela aventura aparentar ser tão rasa em suas motivações . '' Qual o sentido de tudo isso ? Puramente desnecessário ''. Confesso que isso chegou a passar pela minha mente durante a exibição , mas logo que se tem entendimento de que aquela é a proposta do diretor, tudo vale a pena - principalmente se os personagens tiverem carisma suficiente para manter o interesse do espectador, o que é o caso aqui.

Contudo, se Sucker Punch pode parecer vazio em mensagem em primeira análise, podemos retirar boas conclusões sobre alguns itens. Ao contrário do que muitos possam imaginar ,este não é um filme com discurso machista. Talvez um filme feito para homens - até porque assistir á Emily Browning, Abbie Cornish e Vanessa Hudgens é um alento ao olhar masculino - mas com um discurso completamente feminino. Ora, cada dança erótica , vista por muitos como vulgar , é uma verdadeira batalha dentro da mente das meninas. E se Snyder consegue fazer um grupo de garotas andar de um modo que nos remeta a Reservoir Dogs , já é uma conquista grandiosa. Mas num filme onde o fetiche e os conceitos visuais são tão importantes , a linguagem de diretor de Zack Snyder não poderia faltar.

E por mais que no início ele utilize closes de maneira levemente dura, no restante da exibição o cineasta se mostra muito á vontade, principalmente nas cenas de ação. Planos-sequência insanos, travellings de câmera impossíveis , e até alguns tiroteios com direito a cortes mais ágeis - algo antes não experimentado por ele. Aqui o cineasta assume o estilo clipeiro, e faz isso de maneira literal - o longa se assemelha a uma colcha de retalhos de videoclipes em determinados pontos, com música não-diegética rolando a todo instante.

E é preciso dar o braço a torcer a esse estilo peculiar, quando por exemplo, o diretor faz toda uma introdução ao filme sem que seus personagens profiram uma só palavra. Funcional e original, Snyder nos ganha de vez já nesse primeiro momento. E ele ainda reserva mais espaço para sua cinematografia em tela. Se digo que Sucker Punch é uma obra que auxilia na formação de uma identidade mais bem modelada de Snyder, não é de graça - sobram referências e auto-homenagens, principalmente envolvendo Watchmen. Detalhes ,mas que servem para marcar bem a imagem de Snyder . Partindo de uma cena de enterro chuvosa, passando pela música de Mozart usada no desfecho de Watchmen , e culminando até na formação de personagens - ou Carla Gugino faz uma persona polonesa por pura coincidência?

Numa frequência acelerada que se diferencia do modo de se fazer cinema em geral - algo que remete muito a Scott Pilgrim - Sucker Punch só não alcança a pontuação máxima dentro de suas limitações, graças a uma incômoda tentativa de passar uma mensagem pseudo-filosófica desnecessária ao final , que tira um pouco o foco do longa. Um defeito mínimo dentro de um filme que auxilia na consolidação da identidade de Zack Snyder como um dos melhores estetas de hoje em dia. E se não é ainda seu filme essencial de méritos narrativos, é um bom começo para o cineasta , que tem tudo para que essa carasterística floresça nos seus próximos projetos originais, acoplados, é claro, de suas façanhas visuais.

4 Estrelas **** - Muito Bom.

sexta-feira, 18 de março de 2011

Pânico na Neve

Tensão descomunal em longa limitado.

Filmes independentes de baixo orçamento são uma grande aposta de cineastas com recursos cinematográficos limitados ou uma ideia criativa e barata na cabeça para realizar seus debutes na direção. Chris Kentis realizou sua estreia na função, Mar Aberto, justamente nesse contexto. Daniel Myrick e Eduardo Sanchez criaram a mitologia de Bruxa de Blair e contribuíram ao cinema independente de maneira devastadora, trazendo o gênero do mockumentary ao terror, honrando a tradição da tensão de exemplares antigos como O Exorcista e O Bebê de Rosemary. Oren Peli, recentemente, abusou da boa vontade do público ao tentar recriar o efeito de Bruxa para a nova geração, sem sucesso crítico(embora financeiro). Rodrigo Cortés comprou sua entrada em Hollywood realizando seu esplendoroso Enterrado Vivo com essa mesma ideologia, em apenas um cenário.

E Pânico na Neve insiste justamente nesse modo de narrativa. Situado em apenas um local, em parcos 5 cenários, o filme tenta se apoiar na tensão desesperada em takes engenhosos e atuações desesperadas de seus protagonistas. Mas se em Enterrado Vivo, uma aula de tensão recente, temos a atuação vitoriosa de Ryan Reynolds, aqui temos que contar com Emma Bell, Kevin Zegers(egresso de Transamerica e Bud-O Cão Amigo) e Shawn Ashmore, o Iceman do X-Men. A questão diferente em Pânico na Neve, porém, é que Adam Green, roteirista e diretor, não é um novato em questão e nem teve essa sua ideia vendida como revolucionária, como geralmente acontece com esse tipo de filme. Seu roteiro depende demais das atuações dos envolvidos, que são limitados. Fora que Adam Green não é um sujeito conhecido por ser um mestre da tensão, tendo em seu currículo a série Hatchet.

A trama dos 3 amigos que ficam presos no teleférico do Esqui por uma semana, na neve e com lobos lá embaixo, é bastante pobre, mas de uma iniciativa calcada na tensão. Nesse tipo de filme, a limitação é visível e reconhecê-la é a chave para uma narrtiva eficaz. Enterrado Vivo apostava no subtexto político para criar um roteiro inesquecível, enquanto Mar Aberto, além de ter uma trama com desenvolvimento impecável a ponto de torná-la possível aos olhos do espectador, apostava na ligação emocional com seus protagonistas. Porém, Pânico na Neve usa as limitações não por falta de dinheiro, mas por falta de criatividade de seu criador. Sem criar um atrativo suficiente pra tornar seu filme algo além do mediano, Green abraça a catarse com uma confiança tão grande que faz, pelo menos, com que os vazios 95 minutos de projeção passem de forma rápida(e bem tensa).

O roteiro raso de Green abusa de qualquer coerência com a realidade em prol da taquicardia. E, por mais que seja extremamente estúpido, é de uma engenhosidade incrível. Se é possível se incomodar com o fator absurdo que leva os 3 a se meterem naquela confusão, é só levarmos em conta que a inteligência dos mesmos é abaixo da ignorância. E ainda tem o idiotizante motivo que Green usa para justificar o sumiço do trabalhador que cuidava da estação. Decisões narrativas, como a escalada do cabo, se tornam demoradas e ficam apenas pro final, sendo substituídas por inacreditáveis soluções como a queda voluntária do teleférico, apenas para inchar a narrativa. Sendo assim, qualquer erro é permitido dado que não são as situações que se resolvem mal pela falta de inteligência dos personagens. A ignorância deriva do diretor/roteirista. Só assim se explica como 3 esquiadores desceram no exato momento que não podiam e como lobos só chegam quando preveêm que alguém tentará descer.

Até aí, seriam defeitos fatais. Porém, a engenhosidade citada é provada pelo atropelado modo que Green filma o pré-tensão. Ainda que abuse de uma linguagem pouco original de criar tensão, como a filmagem em close das engrenagens do teleférico, a sucessão de erros do filme é apenas colocada ali pra pular para a adrenalina de uma vez. Espanta-se até que demore cerca de 10 minutos para a trama começar. Green não tem o mínimo talento para diálogos ou situações realistas(e reconhece isso bem), criando diálogos completamente dispensáveis que parecem estar ali apenas para evitar o silêncio dos envolvidos. Cheio de pressa, o diretor não deixa que os personagens tenham alguma qualidade para o espectador se importar. E os diálogos não mudam nem mesmo no teleférico, em que a tensão dos envolvidos se dá apenas por rostos chorosos ou desesperados(ou pelas pavorosas falas). Atente, por exemplo, para o monólogo sobre o cachorro de Parker(Emma). Ainda que bonito, é de uma cretinice tremenda.

Percebe-se então que Green quer mesmo é pular o que não sabe fazer, o desenvolvimento até a tensão. Mas se o público parece apenas conformado em acompanhar o teleférico até a metade do filme, ocorre um evento decisivo que desmascara totalmente as ambições de Green. Criado no cinema Gore, da já citada "franquia" Hatchet, Green fica claramente mais á vontade no meio da sangueira e das vísceras. E se analisarmos os grandes exemplares desse gênero independente de suspense, gore é o que menos importa. Porém, Green vai na contra-mão e filma cada detalhezinho mais pesado de sua produção com uma violência gráfica explícita. Em certo ponto, o diretor filma os ossos expostos de uma perna em super-close. Em outro, filma um corpo em decomposição com a câmera acima dele. Até mesmo geladuras o cineasta faz questão de filmar de maneira exagerada. Sendo assim, é complicado saber se Green faz uma introdução totalmente apressada para chegar á tensão ou se é para mostrar umas vísceras de fora. E se analisarmos Hatchet I e II(que tem um machado no cartaz), temos a resposta.

Desafiador seria então enquadrar Pânico na Neve em uma categoria apenas. A trama propõe um suspense desesperador e claustrofóbico, enquanto seu diretor prefere ser um sub-Eli Roth e esperar pra filmar violência gráfica. Já o final da projeção comete um erro idiota ao colocar o letreiro final de forma abrupta, como se quisesse chocar alguém(coisa que não funciona, já que o final depende de ligação emocional). Os diálogos criam os laços necessários emocionais, sem ter originalidade, fazendo o feijão com arroz. E a tensão está presente na película inteira, sem decepcionar os fãs.

Assim, Pânico na Neve é catártico pela catarse, colocando em jogo qualquer conexão com a realidade em prol da tensão e das tripas de fora. Entretenimento para os sádicos, divertido e bem executado. E apenas isso. Ainda que o final tente emular a angústia emocional de um Mar Aberto, por exemplo, não funciona pelo contexto em que Green filma. O diretor simplesmente se contenta em fazer o básico. E isso, nem sempre, é demérito grave.

Frozen, constata-se, está mais para Jogos Mortais e Premonição do que para Enterrado Vivo. Não se engane. Adam Green cria a tal tensão que propôs, mas só quer ver o banho de sangue. Se bateu crise de coinciência no seu final humanizado, aí é outra história. Mas nos autos dos mestres do suspense, o cineasta não entra.

*** 3 Estrelas

sábado, 12 de março de 2011

Old School Trailers

Super 8

Trazendo á memória os clássicos oitentistas de Steven Spielberg - com o emblema clássico da Amblin logo de cara - o primeiro trailer de Super 8 serve como um aperitivo vistoso e encantador . Desde a trilha sonora que permeia todo o vídeo - e que é de uma refêrencia singela e belíssima a filmes como Contatos Imediatos e E.T - até sua sinopse enfim revelada , este primeiro trailer dá a gostosa impressão de que J.J. Abrams volta com seu estilo de sempre, mas contando uma história digna de Spielberg em sua melhor fase. A trama acompanha um grupo de garotos que realizava um filme com uma câmera Super 8, quando uma terrível colisão de um trem com um caminhão ocorre . Os meninos registram o acontecimento , e após isso , começam a desconfiar se a ocorrencia foi mesmo acidental, se deparando posteriormente com vários mistérios que surgem na cidade, com o Exército se esforçando para encobrir tudo da população . Se lembrou dos longas spielberguianos ? Vamos aguardar essa bela homengem com alta expectativa .


5 estrelas *****


Os Smurfs
O primeiro trailer completo de Os Smurfs - título que têm uma mitologia criada nas infâncias de várias pessoas - chega sem apresentar muitas novidades que venham a encantar os não-fãs , embora quem tenha certo carinho pela série deva ter tido uma sensação diferente . Uma sensação indiscutível, contudo , é a da semelhança perigosa com o inegável lixo ''Alvin e os Esquilos''. Vozinhas anasaladas , protagonista humano idiota , etc. Torçamos para que essa seja apenas uma impressão equivocada , e que os miúdos seres azuis façam bonito em sua estréia, que vale a conferida .


3 Estrelas ***

domingo, 6 de março de 2011

Rango

Inspirado faroeste transcende a camada de referências para digno exemplar do gênero.

Um dos mais celebrados gêneros já realizados no cinema, o faroeste deu á Sétima Arte clássicos obrigatórios como Três Homens em Conflito, Por um Punhado de Dólares, Meu Ódio será tua Herança, Os Brutos também Amam, Era uma Vez no Oeste e vários outros. Desde os primórdios, quando os épicos italianos pararam de ser realizados(assim dando lugar aos spaghetti westerns), os faroestes chamam atenção por sua estética apurada(mesmo com custos relativamente baixos) e sua mitologia totalmente peculiar. Sergio Leone popularizou e mitificou o faroeste spaghetti em parceria com astros como Clint Eastwood e Lee van Cleef, atingindo seu auge no fim de sua trilogia dos dólares, o já citado Três Homens em Conflito. Após o esquecimento no gênero, que foi caindo em desuso frente ao apelo de filmes como os blockbusters, uma revisão foi realizada e neo-westerns como Tragam-me a Cabeça de Alfredo García e Os Imperdoáveis foram aclamados pela crítica(o primeiro, nem tanto, sendo apreciado apenas hoje em dia). Nos dias atuais, o faroeste só vem para as telas pelas mãos dos Irmãos Coen, que modernizaram a lenda do homem-mito/homem-comum em Onde os Fracos não tem Vez e ressurgiram com o gênero no estado puro, clássico, no recente e espetacular Bravura Indômita.

Ver um gênero ser tão baqueado pelo tempo, demorando anos até ser colocado de novo no mapa do público, é raro. Juntos com o faroeste, os únicos que compartilharam desse amargo momento foram os filmes de animação. Apenas após a revolução de Toy Story, em 95, os desenhos voltaram de vez pras graças do público. Agora, o faroeste está ressurgindo e nada poderia ser melhor que um conjunto deste com a animação, um dos gêneros mais ousados e abertos a possibilidades na indústria.

E é com essa curiosa ideia em mente que o diretor Gore Verbinski nos traz Rango. A história do camaleão com crise de identidade que vai parar numa cidadezinha típica do Velho Oeste americano, é uma ousada homenagem a Sergio Leone e ao cinema de faroeste/violência dos anos 60/70. Não só isso, é uma fábula competente e madura sobre o envelhecimento da região.

O roteiro de John Logan, de filmes distintos como Gladiador e Sweeney Todd, é feliz em criar uma história coesa, cheia de originalidade e que, ainda assim, faz homenagens e referências a todo momento, sem nunca soar fora da narrativa, tudo organicamente acoplado á estrutura. Os closes que Verbinski realiza em seus personagens nas cenas de impacto são puro Leone, enquanto a tresloucada sequência no deserto com a Cavalgada das Valquírias ao fundo já se torna icônica por sua perfeita execução e pelo humor refinado. Ainda nessa sequência, uma referência á Transformers surge de maneira tão impecável que jamais soa forçada ou até mesmo desnecessária. A caracterização dos personagens também segue o estilo spaghetti, com um inspirado Bill Nighy dublando Jake, a cobra idêntica ao gênio Lee van Cleef. O prefeito da cidade também é outra clara homenagem, o que se torna impressionante com o tempo. E Verbinski faz uma questão quase religiosa em demonstrar seu amor e respeito aos clássicos do gênero, filmando duelos com vigor e indo de hiper-closes de Leone á icônica visão do oponente á distância, entre as pernas do pistoleiro. A prova máxima do respeito dos realizadores é o duelo final, filmado com a parcimônia digna de Três Homens em Conflito, incluindo takes nervosos do relógio da igreja, com suas badaladas barulhentas.

Mas diferente da Dreamworks, que atira referências em excesso e a esmo na tela, Rango demonstra personalidade ao criar uma história que independe delas. Nisso, o desenvolvimento da narrativa impressiona por seus minuciosos detalhes. Já devidamente estabelecido quanto ás suas ambições e seus sentimentos nos minutos iniciais, no cenário artificial, Rango vai se tornando um mito desde sua queda do aquário. Inicialmente entendidos como um desnecessário ritmo lento apenas para causar risadas nos infantes na sala de cinema, esses primeiros minutos crescem ao analisar o desenrolar do filme, sendo essenciais para determinar o carisma inocente e a personalidade desfuncional do camaleão, um herói que impressiona por sua complexidade emocional. A história de fato começa após a sequência na estrada, quando Rango anda sem rumo pelo deserto. Ali, é jogado um elemento em tela que auxilia um surpreendente delírio do protagonista e ainda serve no futuro como pista/prova pro desfecho. E além deste elemento de cena, outros são jogados durante o filme antes do espectador ter pleno conhecimento deles, como a enigmática risada coletiva no Saloon e a passagem do último xerife de Dirt, a cidade do filme.

A construção do Mito em Rango, aliás, é parte fundamental da narrativa. Se o camaleão é fadado à lenda desde o princípio, nada mais apropriado que a testemunha ocular dos feitos do mesmo esteja lá no Saloon, afim de estabelecer sua própria verdade. E o que importa o fato de ser o próprio Rango a testemunha dessa lenda, que sabemos ser irreal? A partir da leitura na garrafa de cacto, pouco importa se o homem matou ou não Liberty Valance. Em tempos da falência do homem perante o ambiente, cada um germina seu mito. E se o conceito estabelecido parece forçado dado que o filme é uma animação, isso logo se anula. O clímax do filme, recheado de beleza da natureza, é a genial prova de que o ambiente vence o homem novamente. Mas quando é analisada a inocência e bondade de Rango, percebe-se que não foi o Texas sujo dos anos 80 de Anton Chigurh que venceu. Foi o puro espírito do Velho Oeste, não por acaso personificado e peça-chave da narrativa, dublado por Timothy Olyphant. Quando aquela vastidão natural invade a tela de forma descontrolada, o Mito que desde o início vinha sendo traçado, é finalmente consolidado. O ambiente venceu, mas o Homem se consolidou, provando que há espaço para os dois. E não há prova maior dessa velha máxima que o respeito mútuo dos personagens ao final do filme.

As divertidíssimas corujas fazem parte dessa ideologia. Ainda que passem a narrativa inteira cantando e tocando seus instrumentos para divertir as crianças, seria pobre pensar nelas apenas como alívio cômico. Elas são o Mito, descrito em prosa e poesia musical, contando a história do homem que virou lenda. E é tocante a passagem em que as corujas se abstém de cantar, com tristeza explícita nos olhos. Ali, não foi demonstrado apenas um imenso respeito por Rango(e pelo gênero do faroeste), mas foi colocada em dúvida pela primeira vez a consolidação do Mito. Quando as corujas voltam a falar e cantar felizes, é o espírito do Velho Oeste nela presentes, não apenas um gesto cômico mas sim um fio de esperança na crença.

As sequências de ação grandiloquentes são um fôlego a mais pra narrativa, uma modernização da estrutura do faroeste. Coordenadas com uma direção irretocável e belíssima estéticamente de Gore Verbisnki, as sequências são perfeitas e servem pra divertir, aumentar o ritmo da narrativa e liberar a trilha espetacular de Hans Zimmer para reverenciar 2001, Apocalipse Now e Ennio Morricone. A fotografia de Roger Deakins, conhecido por vários faroestes como Bravura, Onde os Fracos e Assassinato de Jesse James, ajuda ainda mais a ambientação realista(a ILM é tão fantástica que faz parecer live-action em algumas cenas) que Verbinski queria pra seu projeto.

Com uma construção de personagens impecável, especialmente de Rango(que encontrou em Johnny Depp seu perfeito alter-ego live-action), o roteiro ainda brinda-nos com um clímax instigante e que aborda um assunto que consegue, ao mesmo tempo, ser atual e metalinguístico com a modernidade versus velho oeste. Contudo, o filme tem um erro que impede-o de alcançar a nota máxima, ainda que chegue muito perto. A necessidade em abordar uma mudança no terceiro ato, ainda que excelente no contexto da narrativa, é abordada de maneira clichê e anteriormente testada. Uma pena, pois se não fosse essa necessidade que o roteiro se impôs pelos próprios caminhos narrativos que resolveu trilhar, seria irretocável. Claro que isso é um detalhe ínfimo perto da qualidade adquirida, mas ainda sim o defeito considerável. O humor, inteligente em grande parcela do filme(a lápide do xerife antigo é genial), é substituído por passagens mais físicas, o que claramente é pra colocar os pequenos nas risadas ou, se pensarmos alto, uma homenagem a Buster Keaton e Charles Chaplin. Não devendo ser vista como um defeito(ou homenagem desnecessária), essa tentativa é perdoável se pensarmos que essa animação de 130 milhões de dólares é, na verdade, um faroeste revisionista que poderia ter sido dirigido pelos Irmãos Coen ou Quentin Tarantino.

Sendo assim, Rango se consolida como uma das animações mais ousadas e arriscadas em muitos anos. Investindo num gênero pesado e envolvendo armas de fogo e fumo com naturalidade bizarra para um filme "infantil", Rango foge do campo de referências e finca seu pé nos autos dos grandes faroestes revisionistas. Se lembrando de onde veio e repaginando o gênero para a animação. Quando o Espírito do Oeste aparece em seu automóvel engraçado, Rango pergunta se o costumavam chamar por "homem sem nome". A referência é clara, mas porque não pensar que isso é plausível e neural á narrativa, já que estamos vendo um "homem sem nome" transformar-se em Mito em tela? Rango não é um nome, é um mantra, uma lenda.

E provando que o Velho Oeste continuará vivo pra sempre no código moral de cada um, é novamente UMA bala que muda tudo. E o respeito incomensurável entre os envolvidos é tão impressionante, tão bem arquitetado, que vemos ali, bem na nossa frente, Clint Eastwood e Lee van Cleef evitando seu confronto em prol do que todos eles respeitam num faroeste: a Lenda. Afinal, a bala constrói um Mito, mas nunca O mata.

***** 5 Estrelas

Bruna Surfistinha

Pieguice e Deborah Secco em filme hipócrita sobre prostituição.

No Brasil e em todo mundo, a temática sexual possui , obviamente, apelo maiúsculo . Tema que atrai atenções, multiplica opiniões . Várias opiniões surgiram, afinal , com o livro O Doce Veneno do Escorpião , lançado por Raquel Pacheco , contando as aventuras de sua rotina como a prostituta Bruna Surfistinha . Claramente , o livro possui ousadia , - já de cara pela história que conta - tendo em vista obviamente suas páginas negras lacradas onde a ex-garota de programa dava detalhes de suas façanhas sexuais . Não há pudores , nessa área , pelo menos , para Raquel Pacheco ,nem em sua vida , nem em seu livro .

Na adaptação cinematográfica , no entanto , não é bem por esse caminho . Um filme que pretende debater e ilustrar um cotidiano que não é conhecido a fundo pelo público geral necessita-se, antes de mais nada, despir-se de pudores . Mas não falo de pudores de conteúdo sexual, ou de suas cenas picantes, ou qualquer coisa do gênero - era preciso se livrar do modo convencional, e por vezes burro, de lidar com seu protagonista. Martirizar, vitimizar e fragilizar, são as vozes de comando essenciais para o filme de Marcus Baldini . Abordagem clichê, típica da visão limitada de alguns roteiristas existem sempre , e sempre veremos . O que prejudica mesmo é um filme sobre prostituição portar essa pieguice .

Sem se enrolar na hora de montar a linha narrativa, o longa dá uma pincelada na vida de Raquel antes de fugir da casa dos pais - e é nesse meio tempo que começa a vitimização da protagonista . Mostrando ela sendo agredida verbalmente pelo irmão em casa , e destruída moralmente na escola , o roteiro faz questão de atenuar qualquer atitude ''duvidosa'' da protagonista - como roubar jóias dos pais - mas, por outro lado , ora , não dosa a quantidade de maniqueísmo contido nas atitudes cruéis dos coadjuvantes .

É só o lançar das bases de uma modelação infeliz de ''vítima'' , da personagem principal. Esse olhar na tentativa de ''elevar'' a protagonista, de algum modo, acaba por tirar bastante de seu realismo - e se o filme não descamba para o chavão pastelóide, muito se deve por Déborah Secco, que segura até onde consegue . E se um filme sobre prostituição perde seu realismo, perde logo sua visceralidade, e fica a sensação desconfortável e irônica de assistir um produto piegas que conta uma história que , na prática, nada tem disso. Essa perda da visceralidade, aliás , deve-se em suma pelo roteiro, por fim . A cada take mais bem ajambrado de Baldini - a câmera fixa na cara de Secco quando Raquel está em seu primeiro programa - temos uma narração em off desnecessária e inconveniente , que só traz de acrécimo uma hiper-exposição infeliz .

Mas não é só disso que vive Bruna Surfistinha , afinal . O objetivo era mostrar o início, o galgar do sucesso, o apogeu, a decadência e o desfecho. Aí é um somatório de pequenos erros coroados com um ato falho final . Ora, Bruna fala, em certo momento de seu apogeu , para nunca desistir de seus sonhos, que seu objetivo sempre chegará se você lutar . Não me parecia o sonho de Raquel - tão pouco de qualquer ser humano - se tornar uma grande prostituta . Parece, sim, um caminho em círculos '' batalhar muito para ser prostituta, e assim ser coroada uma grande prostituta'' . Isso lá parece grande conquista ? Enfim, isso varia de cabeça, mas o filme já deixa seu argumento com embasamento dúbio .

E se Bruna tem sua desgraça na cocaína, o script desenha sua derrocada de maneira preguiçosa e pouquíssimo detalhada, pra não dizer capenga . Feita as pressas, fica dificil absorver as proporções do acontecimento . Arco importante e mal desenvolvido, algo que não pode ser feito.

Mas talvez o principal problema de Bruna Surfistinha seja seu tom hipócrita que incomoda de verdade . O discurso de Raquel, é afinal, a independencia, a liberdade, o fim das amarras, a felicidade de ser solta . Por esses motivos e por outros ela deixou a casa dos pais, certo ? Pois no seu desfecho, no seu ponto final, é que todo o filme parece ser um enorme loop que vai até muito longe para voltar a praticamente o mesmo lugar . Por mais que o longa acredite que Raquel foi uma vitória de independência , ele mesmo se contradiz - a imagem que fica, ao fim da exibição, afinal, não é de um vulcão sexual determinado, mas de uma frágil menina perdida.

2 Estrelas **