Zack Snyder abraça seu estilo em filme de linguagem simples e visual.
Que o diretor Zack Snyder tem em suas principais qualidades o talento nato para a excelência visual , isso não é novidade para ninguém - pode até não ter sido o criador da câmera lenta acelerada , mas foi com certeza o cineasta que melhor a aperfeiçoou para uma estilística tão cool. Um esteta como poucos, Snyder herdou dos videoclipes essa sensibilidade e modernismo , e conseguiu os inserir de maneira estupenda em produtos que continham material intelectiual pré-existente. Foi assim nas batalhas plásticas de 300 , nos belíssimos cenários e coreografias de Watchmen. Mas atacar Snyder talvez fosse tão fácil quanto se encantar com seu desbunde técnico - e se ele não tinha dedo no script de seus filmes, sobressaía-se com êxito no seu modo de filmar. Agora , seu recente - e já controverso - projeto, Sucker Punch, chega ás telas do mundo todo.
Sendo este novo filme o primeiro projeto tirado por completo da cabeça do realizador , pode ser considerado um mínimo avanço narrativo para o diretor. Snyder busca em Sucker Punch um caminho de transição , mas principalmente uma busca por consolidação de identidade. Este, afinal , não é um filme que vem para reinventar a roda , mas sim para trabalhar o lado visual tão original de Snyder, em cima de um material de sua autoria. Um filme de gestos, de texturas visuais, assim como tantos outros, mas que se aceita assim por ser justamente calcado com simplicidade proposital no intelecto narrativo. E já fique avisado quem chama Snyder de clipeiro - aqui o diretor abre o peito para receber esse tão injusto rótulo, e faz os detratores engolirem o tom pejorativo.
A trama conta como Babydoll (Emily Browning) uma garota órfã , é colocada num hospício pelo padrasto, e lá , corre o risco de sofrer uma lobotomia. Para fugir deste destino nada agradável, a jovem entra em um universo fantasioso numa busca para escapar do sanatório onde foi colocada. Para tanto , ela vai utilizar da ajuda das também fugitivas Sweet Pea (Abbie Cornish), Rocket ( Jena Malone), Blondie ( Vanessa Hudgens) e Amber ( Jamie Chung).
O roteiro de Sucker Punch é simples , e tem como principal trunfo assumir essa simplicidade. Não é uma esfinge, nada mui elaborado ou complexo , mas que apresenta alguns conceitos e conexões narrativas ousadas -e por isso talvez tão rejeitadas mundo afora - no cinema. O foco aqui é no fetiche do escritor/diretor , e na explosão de idéias que o mesmo queria colocar em seu longa metragem. Cabe ao script basicamente achar esses possíveis espaços para onde encaixar tantos cenários diferentes, e tanta ação de variados tons. E o estratagema criado pro Snyder é muito interessante, pois gera diversas camadas de realidades - algo como em Inception , mas troque o termo ''sonhos'' por ''representações''.
Essas realidades, sobrepostas , tornam possível a compreensão da história , focada na fuga das meninas, em uma aventura de proporções apocalípticas. Mas é claro, incontáveis pessoas estenderão o dedo para atacar as frenéticas cenas de ação - que parecem e muito saídas de um video-game tresloucado - e culpar Snyder pela aventura aparentar ser tão rasa em suas motivações . '' Qual o sentido de tudo isso ? Puramente desnecessário ''. Confesso que isso chegou a passar pela minha mente durante a exibição , mas logo que se tem entendimento de que aquela é a proposta do diretor, tudo vale a pena - principalmente se os personagens tiverem carisma suficiente para manter o interesse do espectador, o que é o caso aqui.
Contudo, se Sucker Punch pode parecer vazio em mensagem em primeira análise, podemos retirar boas conclusões sobre alguns itens. Ao contrário do que muitos possam imaginar ,este não é um filme com discurso machista. Talvez um filme feito para homens - até porque assistir á Emily Browning, Abbie Cornish e Vanessa Hudgens é um alento ao olhar masculino - mas com um discurso completamente feminino. Ora, cada dança erótica , vista por muitos como vulgar , é uma verdadeira batalha dentro da mente das meninas. E se Snyder consegue fazer um grupo de garotas andar de um modo que nos remeta a Reservoir Dogs , já é uma conquista grandiosa. Mas num filme onde o fetiche e os conceitos visuais são tão importantes , a linguagem de diretor de Zack Snyder não poderia faltar.
E por mais que no início ele utilize closes de maneira levemente dura, no restante da exibição o cineasta se mostra muito á vontade, principalmente nas cenas de ação. Planos-sequência insanos, travellings de câmera impossíveis , e até alguns tiroteios com direito a cortes mais ágeis - algo antes não experimentado por ele. Aqui o cineasta assume o estilo clipeiro, e faz isso de maneira literal - o longa se assemelha a uma colcha de retalhos de videoclipes em determinados pontos, com música não-diegética rolando a todo instante.
E é preciso dar o braço a torcer a esse estilo peculiar, quando por exemplo, o diretor faz toda uma introdução ao filme sem que seus personagens profiram uma só palavra. Funcional e original, Snyder nos ganha de vez já nesse primeiro momento. E ele ainda reserva mais espaço para sua cinematografia em tela. Se digo que Sucker Punch é uma obra que auxilia na formação de uma identidade mais bem modelada de Snyder, não é de graça - sobram referências e auto-homenagens, principalmente envolvendo Watchmen. Detalhes ,mas que servem para marcar bem a imagem de Snyder . Partindo de uma cena de enterro chuvosa, passando pela música de Mozart usada no desfecho de Watchmen , e culminando até na formação de personagens - ou Carla Gugino faz uma persona polonesa por pura coincidência?
Numa frequência acelerada que se diferencia do modo de se fazer cinema em geral - algo que remete muito a Scott Pilgrim - Sucker Punch só não alcança a pontuação máxima dentro de suas limitações, graças a uma incômoda tentativa de passar uma mensagem pseudo-filosófica desnecessária ao final , que tira um pouco o foco do longa. Um defeito mínimo dentro de um filme que auxilia na consolidação da identidade de Zack Snyder como um dos melhores estetas de hoje em dia. E se não é ainda seu filme essencial de méritos narrativos, é um bom começo para o cineasta , que tem tudo para que essa carasterística floresça nos seus próximos projetos originais, acoplados, é claro, de suas façanhas visuais.
4 Estrelas **** - Muito Bom.
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