Old School Nerds

Old School Nerds

domingo, 28 de fevereiro de 2010

Simplesmente Complicado

Com boa premissa e desenvolvimento precário, Nancy Meyers nos dá um filme esquecível.

As comédias românticas são um dos gêneros mais preferidos do público, e , logo também dos estúdios. Entretanto , por existir uma larguíssima variedade de filmes do gênero, fica ás vezes complicado de se criar mais tramas, já que quase todas dão no mesmo resultado final, passando pelas mesmas situações. Talvez na Inglaterra, pelas mentes dos componentes da Working Title, o terreno seja mais fértil, mas nos EUA a situação nem sempre é a mesma . Nancy Meyers, roteirista e diretora(mais recentemente) é uma daquelas que trabalha recorrentemente com comédias românticas, e conheçe melhor do que ninguém o gosto do público. Criou diversos filmes do gênero, e já está calejada de criar esses roteiros.

Por vezes, a diretora criou filmes batidos, sobre mulheres de meia-idade que voltam ao amor , casais que se encontram e desencontram . Entretanto, ás vezes vem uma boa idéia, como em Do que as Mulheres Gostam , que tem uma premissa interessante . Nesse ano, Meyers nos dá Simplesmente Complicado, que possui uma trama rasoavelmente diferenciada, nesse infinito mar de ''mais do mesmo''. Contudo, se na hora de conceber idéias Meyers tem até algum sucesso, na hora de desenvolve-las tudo se resume ao fracasso .

Fracasso crítico, já que o público se lambusa com os caminhos ruins que a criadora dá a sua obra. Principalmente mulheres de certa idade que já se separaram (o que não é muito difícil de se encontrar hoje em dia, obviamente ). Afinal, qual dessas mulheres não ia gostar da nova história de Meyers? Uma mulher separada há tempos, Jane (Meryl Streep) , não consegue arrumar um namorado, e não faz sexo há muito tempo (e o roteiro adora enfatizar isso). Um dia, na formatura de um de seus filhos, ela reencontra seu ex, Jake( o patético assumido Alec Baldwin), então casado com uma mulher muito mais jovem . Depois de beber e dançar muito, os dois passam um noite juntos . A partir daí, começam a ter um caso. Porém, Jane vai ter que decidir entre Jake de novo, ou o arquiteto recém divorciado Adam , que passa a reparar em Jane .

A premissa é até interessante, e acredito que foi ela e algumas piadas bem elaboradas que renderam ao longa a indicação no Globo de Ouro de melhor roteiro original . Fora isso, não há muito do que se pegar do roteiro. Parece , por vezes -principalmente no final - que foi o próprio Sid Field que escreveu o script . Para quem já está acostumado com filmes do tipo, tudo já é facilmente captado, e o que vai acontecer a seguir não é novidade . As situações são as clássicas do gênero, e nisso, o filme carrega quase zero de originalidade. A falta de sutileza também dá as caras . O respeito a inteligência do espectador não está ali, e tudo que aparece em tela tem que ser explicado - tanto com imagens como com palavras - ao extremo . Ora, mesmo antes de entrar na sala, já sabemos que Jane é uma mulher que se sente sozinha e que queria ter um companheiro . Mostrar isso em tela está correto . Mas Meyers pesa a mão e exagera . Quem assiste não precisa nem se inclinar sobre a situação para senti-la. Tudo vem já mastigado . Quando Jane está triste por sua solidão, aparece um casal muito feliz e entra no elevador com ela. Então a diretora corta pra dentro dele, e mostra as carícias do casal, e a cara de tristeza de Jane. É realmente necessário colocar isso deste modo? Prova de que Meyers está muito longe de saber guiar um filme com inteligência necessária .

E se o roteiro estrutural desenrola reviravoltas e clichês óbvios, os diálogos mostram certa qualidade . As piadas são boas, e as atuações - principalmente de Streep e John Krasinski - conseguem colaborar para efetua-las com timing certo . Com boas tiradas, o filme até faz rir, apesar de não muito. De resto, os diálogos mostram a falta de habilidade de Meyers de introduzir informação sem parecer artificial . ''Afinal, são dez anos''- de divórcio- , diz a protagonista logo no início do filme . Não fosse a ótima atuação de Streep, a frase poderia se tornar mais artificial ainda. Não seria mais fácil fazer a coadjuvante da vez perguntar quanto tempo faziam de separados ?

É também explícita a falta de qualidade na direção de Nancy Meyers. Seu jeito sem sal de dirigir já é colocado a vista logo no primeiro frame dos créditos iniciais. Não há cuidado por parte da cineasta em fazer algo mais diferenciado, e coordena o set com desleixo digno de alguns diretores de telenovelas. Além disso, alguns de seus takes são tão mal escolhidos que atrapalham o trabalho de edição, que já seria ruim o suficiente por si só. Deste modo, ocorrem erros até de continuidade. De fato, Meyers não consegue passar o que quer dizer de forma satisfatória, e sua direção deixa muito a desejar.

As atuações demonstram um pouco de qualidade em Simplesmente Complicado . Destaque para a renomada Meryl Streep . Mesmo fazendo o papel de mulher -comum, de meia-idade, que parece ter saído de Sex and the City- o tipo de personagem que Meyers adora - Streep demonstra todo seu talento. Consegue engolir o roteiro ruim com uma atuação extremamente realista e crível . Steve Martin está ali no meio com qualidade habitual, mas com destaque para seu timing com humor físico. Já Alec Baldwin não podia estar em melhor personagem . Risível, faz o papel de si mesmo, e enfim consegue assumir seu jeito estúpido de ser . É mais fácil - pelo menos para o resenhista aqui - rir de Badwin do que o que ele faz. É nada mais do que uma piada ambulante.

Mas Simplesmente Complicado foi feito para o público, que quer apenas dar umas gargalhadas fáceis e aliviar a mente . Pensando assim, o filme até funciona . Consegue mesclar o humor com o drama sem descompassar, até. Mas para por aí . Se quiser se divertir, procure uma forma inteligente, como comédias mais bem elaboradas como as dos Coen . No caso desse filme, é melhor ver uma comédia romântica da Working Title . Ou assisitir o núcleo cômico de uma novela das 8 global. É tão ruim quanto, mas é mais barato, e economiza tempo.

2 Estrelas **

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Um Homem Sério

Os Irmãos Coen criam memorável crônica cômica, o humor negro do ano.

Quando anunciam um novo filme, Joel e Ethan Coen sempre são esperados uma direção competente, um roteiro afiadíssimo e o habitual humor negro da dupla. As vezes, porém, eles fogem do habitual e criam algum suspense, como o fabuloso Onde os Fracos não tem Vez. Mas claramente é na comédia que eles se baseiam. Depois do afiado Queime Depois de Ler, os Coen chegam com Um Homem Sério. E tudo estava indo nos conformes, com a ansiedade de sempre. Mas quando o trailer lançou e quando o elenco foi anunciado, estava ensaiado um filme a se lembrar por tempos. O Trailer, montado de forma diferente e inusitada, apresantava genialidade. O elenco, composto exclusivamente por desconhecidos, anunciava uma despida de pudores(coisa que os Coen já não tem por natureza). Sendo assim, era só esperar. E agora que Um Homem Sério chega ao Brasil, já indicado ao Oscar de Melhor Filme, vai um recado de amigo: Vão rápido e vejam o filme. Foi mais que merecidamente lembrado para o Oscar.

A trama segue Larry Gopnik(Michael Stuhlbarg), um professor normal dos Estados Unidos que leva sua vida sem muitas surpresas. É o esquema do average guy americano: Casa no subúrbio, família de 2 filhos, vida previsível e rotina definida. Mas então, o judeu Larry é atacado por um mal existente no mundo: O Caos. E tudo começar a dar errado a Larry, que como professor de Física, nada pode fazer para descobrir o que está havendo. Essa trama começa de forma objetiva, indo direto ao ponto. Ela é costurada pelos 30 minutos iniciais para que nos acostumemos com a vida de Larry e isso faz toda a diferença. E aqui vemos outra marca dos Coen: Mesmo que o fator apresentado possa parecer irrelevante, ele poderá sim causar algo importante durante o filme.

Tecnicamente, Um Homem Sério é um dos mais brilhantes filmes dos Coen. A direção dos irmãos está segura como sempre, fazendo takes abertos e sem grandes movimentos, permitindo os atores terem uma liberdade de atuação pouco vista. Sendo aqui um filme de diálogos e situações pequenas, a direção de atores teria que ser bastante precisa e é exatamente isso que os Coen entregam. A edição de Roderick Jaynes(Pseudônimo dos Coen) é fantástica e continua ajudando a direção, determinando até mesmo o humor de algumas cenas. A trilha sonora de Carter Burwell também é algo de nota, apesar dela aqui ser menos usada. Com algumas pequenas melodias minimalistas(note a beleza da melodia da cena do lago), ele é preciso em sua composição. E merece destaque também sua escolha musical: Somebody to Love. A melodia e a letra combinam muito bem com o que o filme é.
Mas o fator que rouba a cena é a poderosa fotografia de Roger Deakins. O veterano fotógrafo, oscarizado, cria um novo memorial trabalho. Aqui, sua fotografia se assemelha a de Onde os Fracos, mas com tons mais leves e bonitos(como esperado, afinal, aqui há a troca do deserto de Onde os Fracos para o subúrbio). Gênio. Merecia uma indicação. Outro destaque é a direção de arte, que com 7 milhões de orçamento, fez uma belíssima recriação dos anos 60, a época em que se passa o filme.

As atuações de Um Homem Sério são todas boas, mas é inegável que o filme é de Michael Stuhlbarg. Aqui, o desconhecido ator cria um personagem complexo e muito interessante e entrega as doses de humor negro que o texto pede. Um destaque de Stuhlbarg são suas notáveis expressões faciais, que determinam o nonsense do filme em vários pontos. E a inocência com que seu personagem é construído é engraçadíssima e muito bonita. Apesar de duvidar de tudo o que esteja fazendo, apesar de analisar cada situação e ser tratado como um tapete em muitas partes, Larry continua um homem admirável, com um excelente coração. Espero muito mesmo que o ator ganhe visão para o cinema depois desse brilhante papel. Quanto as outras atuações, o único destaque é Fred Melamed, o Sy Ableman. Ele transmite a calma e serenidade que seu personagem pede, o que é um achado. Richard King, o Arthur, também atua bem, com uma profundidade até bem grande para seu papel, que tem pouca participação.

Em roteiro, o destaque de Um Homem Sério, os Coen novamente dão um show de construção narrativa. Em Queime Depois de Ler, prevalecia a sátira. Em Onde os Fracos, o duelo. Em Fargo, o absurdo da trama. Aqui, eles criam uma trama que, além de investir em humor negro, brinca com recursos cinematográficos. Não se espante se achar que elementos da trama irão se fundir(como uma colisão, lá no meio da película) e na verdade não dê em nada. Ou talvez dê. E essa é grande sacada dos irmãos: A utilização de recursos narrativos que instiguem a plateia a pensar no óbvio, mas na verdade ocorra o inesperado. Em diálogos, o roteiro é soberbo e bem preciso, entregando diálogos tão engraçados quanto estranhos. E o humor negro continua sendo a marcar da dupla, que esbanja identidade em muitas partes da película. Se as situações que ocorrem com Larry não fossem levadas de um modo tão absurdo, talvez fosse bem triste. Mas aí tudo cairia no lugar comum, o que os Coen nunca fizeram. Mesmo com um leve perda de ritmo no terceiro ato, o roteiro é um enorme ponto positivo para fazer de Um Homem Sério, um excelente filme. E além de tudo ele é um filme bem maduro e de certa forma, atemporal. Afinal, Larry pode ser qualquer um que você conheça, mesmo ele sendo de 67.

Assim, segue a recomendação de ver Um Homem Sério e esmerar seus olhos e cerébro com tal qualidade. Com certeza não é o filme de sua vida, nem o melhor dos Coen, mas figura facilmente entre os melhores do ano. Um filme bem maduro e cômico que pode agradar muita gente. A pequena crônica de Lawrence Gopnik pode emocionar e rir com facilidade e inteligência. Um personagem para entrar no hall dos mais carismáticos. Agora fica a espera pro novo filme dos Coen, seguindo a linha mais séria, de um faroeste. E claro, fica a torcida pra que a nova comédia deles chegue logo, para nos brindar com um novo espetáculo de narrativa, técnica e atuações.

***** 5 Estrelas

domingo, 21 de fevereiro de 2010

Um Olhar do Paraíso

Peter Jackson cria descompassado mix de gênero distintos.

Quando Peter Jackson resolveu transformar a grande trilogia de J.R.R. Tolkien, O Senhor dos Anéis, para o cinema, ele obteve um êxito enorme. Filmar tudo aquilo com 92 Milhões de dólares foi muito impressionante e isso transformou-o em um dos grandes diretores da atualidade. A partir daí, todo projeto seu começou a ser bem esperado. E, como de praxe, todos ficaram ansiosos pra adaptação de The Lovely Bones. Por vários motivos mas, principalmente(inclusive pra esse resenhista), pra ver como a Weta Digital, produtora de efeitos de Jackson, iria fazer o Paraíso proposto pelo livro de Alice Sebold. Aos poucos, o elenco foi sendo definido e tudo foi sendo modelado na cabeça do fã. Mas, pelo menos pra mim, houve uma enorme desconfiança pouco antes da estreia: A censura seria PG-13, uma censura branda. Branda até demais, considerando que é uma história de estupro + assassinato. Então, houve a espera até a estreia brasileira, esta semana.

E, definitivamente, a tal desconfiança fez total sentido na exibição do filme, um dos maiores fracassos da temporada de dramas.

A trama conta a história de Susie Salmon(Saoirse Ronan), uma garota de 14 anos que vive com seus pais e irmão no subúrbio de Pensylvannia. Ela é uma garota bastante ingênua e apaixonada que se interessa por fotografias e afins. Então, em uma de suas idas ao shopping local, ela desperta a atenção de seu vizinho, George Harvey(Stanley Tucci). Logo após, ela é cruelmente estuprada e esquartejada por ele(não se preocupe, não é spoiler) e então começa uma busca por seu corpo na Terra. Do Paraíso, ela acompanha tudo, descobrindo em si mesma sentimentos de vingança, ódio e depois, felicidade plena.
Se a trama aponta um grande potencial inicial, a abordagem trata de matar todas as expectativas. Peter Jackson, excelente criador de mundos(como em King Kong e Senhor dos Anéis), não conseguiu impor uma simplicidade a esse drama. Digo, ele fez algo grande demais, descompassado. Tentou misturar dois temas que simplesmente não combinaram aqui: Brutalidade e Poesia. Expandiu demais a fantasia e minimizou demais o drama. Quando falar de roteiro, explico detalhadamente.
Tecnicamente, Um Olhar do Paraíso é bom, mas não empolga muito. A direção de Peter Jackson é boa, porém irregular. Se ele consegue filmar campos abertos e cenários com efeitos de forma arrojada, ele falha na direção de atores, sendo que não consegue extrair boas atuações de alguns atores. Mas seu esmero pela tecnica e seu perfeccionismo afloram em takes bonitos visualmente. A edição de Jabez Olssen é mediana, fazendo um trabalho bom, sem exageros. A fotografia de Andrew Lesnie é fantástica e muito bela. Seja no núcleo dramático, seja no núcleo fantasioso, Lesnie faz um trabalho irretocável, que enche os olhos. Porém, tudo o que a fotografia faz consegue ser eclipsado pela péssima trilha sonora de Brian Eno. O compositor, além de criar melodias irregulares, coloca-as mal no filme. Por exemplo: Numa cena dramática, ele coloca uma música mais leve e bonitinha. Se ele quis passar que Susan desaparecida era algo tranquilo, ele conseguiu. Sendo totalmente fora do espírito do filme, a trilha é estranha demais.
As atuações de Um Olhar no Paraíso são, em maioria, exageradas demais. Mas a culpa talvez nem sejam dos atores, mas sim da falta de coordenação que Jackson estranhamente teve e, principalmente, pela precária construção de personagens do roteiro. Mark Walhberg nada pode fazer, afinal não compromete. Seu personagem é talvez um dos mais apagados da trama e isso limita a já limitada atuação do ator. Rachel Weisz está mal no papel, o que é uma pena. Tendo uma competência enorme, a atriz só consegue expor sua qualidade na cena em que recebe a notícia da morte da filha. Fora ali, a atuação é artificial e soa até vazia. Compreensível, afinal, sua personagem tem um papel no filme que beira o figurante. Susan Sarandon é outra que sofreu pelo roteiro. O exagero dá as cartas no papel da avó de Susie. Susan exagera em tudo, levando sua persona ao limite do caricato. Nas cenas de humor do filme, um enorme excesso é detectado, o que prejudica o filme até.

Stanley Tucci, indicado ao Oscar de Ator Coadjuvante, tem uma atuação boa, porém não é brilhante. Tudo bem que é de se reconhecer a imersão total de Tucci no papel, que fica irreconhecível até na voz, mas as cenas em que seu personagem aparece representam a habitual indecisão do filme. As vezes, ele aparece sendo humanizado, como o psicopata. As vezes, ele aparece sempre no escuro, mitificando a figura do vilão. Mais um prejudicado pelo roteiro. Saoirse Ronan é a única que não é prejudicada. Sua interpretação para Susie Salmon é tocante e beira o irretocável. Se a personagem pode parecer comum, Saoirse dá um jeito de fazer uma pessoa diferente e profunda, alternando alegria e ódio com emoção. Ela sim merecia uma indicação a Atriz Coadjuvante. Uma revelação que apresenta a competência habitual que vem desde Desejo e Reparação.

Sendo o fator que praticamente sepulta o filme de qualquer emoção e apego, o roteiro é um problema tão grande em Um Olhar no Paraíso que os fatores já citados acima são prejudicados por ele. Indeciso sobre seu tema, Um Olhar no Paraíso até caminha bem até a morte da menina, mas depois, o filme mescla fatores de fantasia(o Paraíso) e os fatores dramáticos(a Terra) de uma forma ruim. Quando o drama dá as cartas, ele é tratado de forma leve demais e sem sentimento algum. Na cena do estupro, por exemplo, o problema da censura aflorou. Na mão de um diretor mais corajoso, uma cena crua e realista acabaria com os nervos do espectador, que se sentiria até mais emocionado com o filme. Mas aqui, Jackson não consegue transmitir sua mensagem. A cena sai bonita visualmente, mas opaca sentimentalmente. Já na parte da fantasia, as cenas são muito belas visualmente também(destaque para o criativo Paraíso da Weta), mas são levadas de forma beirando o melodramático. Apesar de tudo, o segmento de fantasia é excelente e tem poucos defeitos, graças até a bela interpretação de Saoirse. E ainda tem a já citada cena de humor de Susan Sarandon. Quando a família acaba de perder a filha, ainda baqueada, Susan faz uma cena com os filhos felizes, brincando, com uma música de rock ao fundo e por cerca de 1 minuto, o que até provoca risadas na plateia. Sim, quando Jackson pode ousar um pouco e pegar pesado no drama, ele resolve apelar pro riso fácil. Lastimável.

Num quadro geral, o roteiro não traz diálogos pouco convincentes ou situações inverossímeis, mas traz um mix batido entre brutalidade e poesia. Aqui, fica claro que não dá para passar lições bonitas baseadas em brutalidade. Em outras mãos, talvez, mas aqui não. Fora isso, o roteiro também erra em outros pontos, como um estranho anti-clímax. Spoiler a seguir. Quando Rachel Weisz volta pra casa depois de uma viagem, sua filha encontra uma evidência contra o vizinho. Exatamente quando poderá pegar o culpado do assassinato, um fator emocional entra em tela. Mal-colocado e com uma solução indecisa: a filha entrega a evidência mesmo depois de ver a família feliz. Resultado: Um buraco de roteiro que resulta nesse péssimo anti-clímax.

Bonito porém indeciso, Um Olhar do Paraíso resulta num grande paradoxo. Um exemplo disso é seu final, que pode até soar egoísta e deverás piegas para muitos, beirando uma experiência espírita. Se tentasse mesclar as situações com mais clareza e mais calma, talvez Um Olhar ficasse melhor. Mas talvez a falta de ousadia de Peter Jackson seja a culpada por matar um material tão promissor e estimulante. Talvez nos outros a decepção seja maior. Mas em mim, apesar de grande, ela poderia ser maior. Desde o anúncio do PG-13 eu previa isso e até ajudou. Seria um baque esperar demais de Um Olhar no Paraíso.

** 2 Estrelas

domingo, 14 de fevereiro de 2010

Preciosa - Uma História de Esperança


Drama pesado choca e emociona com qualidade vistosa.

É comum , todo o final de ano, um pouco antes das grandes premiações cinematográficas, surgirem dramas de baixo orçamento feitos pra essas ocasiões. Na maioria das vezes, feitos para o próprio Oscar. São fórmulas para ganhar prêmios, utilizando artifícios dramáticos fortes, situações realmente apelativas que sensibilizam e ‘‘ganham’’ os críticos do mundo todo. Preciosa , que chega nos cinemas brasileiros essa semana, é , superficialmente, um filme feito pra Oscar, com uma fórmula pra este sentido . Entretanto, olhando mais de perto, podemos ver a beleza e profundidade infinita que o filme de Lee Daniels tem, que o difere graciosamente do geral.

Baseado no livro Push, escrito por Sapphire, como o longo título original diz, Preciosa é daqueles filmes que, também a primeira vista, aparenta ser baseado apenas em grandes atuações e num roteiro bem esmerado, e que o diretor serve apenas como ‘‘carregador de piano ’’ (aqueles cineastas que se resumem ao trivial e não fazem nada além daquilo). Mas não. Surpreendentemente, além de atuações imponentes e roteiro forte, Lee Daniels arrebenta com um estilo que dá gosto de ver.

Só por isso, já dá pra admitir que é um filme extremamente diferenciado. A história se baseia na personagem do título Claireece Precious Jones(Gabourey Sidibe), uma garota que vive na década de 80 e enfrentra diversos problemas. Só pra começar, ela é obesa, negra, tem uma filha com problemas e está grávida de outro bebê. E se só isso já não fosse o suficiente, o filme ainda dá mais “surpresas” . Ela ainda sofre da tirania da mãe ( Mo’Nique) que vive da renda do auxílio desemprego somado da ajuda da assistência social para a neta que nem vive com as duas . E , graças a essa nova gravidez de Preciosa, a protagonista é transferida para uma escola alternativa, onde ela é aluna da professora Blu Rain (Paula Patton), que a ensina muito mais do que a ler e a escrever , mas a ter uma válvula de escape para a vida duríssima.

A realidade mostrada no filme é mais do que só emocionante. Preciosa é a síntese mais recente da máxima ‘‘o que está ruim pode ficar pior ”. Entretanto, nada é apelativo ou forçado. A imersão no mundo destruído de Preciosa não é caricata, não faz maniqueísmos. Tudo é bem realista, e, se a realidade é quase insuportável, ela é mostrada desse jeito. E a dose de realidade é tão grande que aparece inclusive no desfecho, um dos melhores do ano . Não há nada de irreal ou de super-acontecimento. Apenas algo muito belo, e que se encaixa muito bem no contexto da trama. Outro ponto interessante para a composição do roteiro são os pontos para respirar no meio de tanto caos. Esses pontos são os sonhos de Preciosa, onde seu mundo é perfeito, ela é desejada por homens bonitos, é branca e rica, e vive no mundo de celebridades . Ainda há alívios cômicos, mas que surgem tão naturalmente que nem parecem propositais. Todos esse ‘‘alívios’’ da trama, são praticamente os mesmos alívios que Preciosa tem para sua vida .Por isso a fluidez é tão boa.

A direção de Daniels também impressiona muito . Tendo feito anteriormente apenas o fraco Matadores de Aluguel , Daniels apresenta uma direção bem inesperada, pelo menos pra mim. Quem fez tão mal seu primeiro e até então único filme, dificilmente apresentaria tal feito aqui. Sua direção de atores é precisa e confiante, abusa de takes longos, variando de um ator para outro. Usa muito bem também a câmera na mão, que treme e balança enquanto enquadra os rostos das protagonistas. Também abusa repetidamente de zooms nas faces dos atores. Nesse aspecto, é quase experimental seu modo de dirigir. Entretanto, o efeito desses zooms e cameras balançanates é um tom quase documental, que combina muito com o filme.Do ponto de vista técnico, só a fotografia não se sobressai tanto. Dá um tom sujo, mas não vai muito além disso.A trilha mistura várias faixas de músicas do guetos na década de 80. Combina e ajuda a cosntruir o filme, mesmo que timidamente.

Em atuações, o longa é quase irretocável. Gabourey Sidibe faz muito bonito e quase não dá pra perceber se está atuando ou não. Consegue personificar toda a angústia, tristesa e personalidade forte de Preciosa . Já com Mo’Nique, a história é outra. Simplesmente, a melhor atuação feminina do ano. Merece o Oscar e deve levar, depois do Globo de Ouro. Sua interpretação é ótima , muito profunda e intensa , como a personagem pedia .O resto do elenco também é ótimo . Destaque para Mariah Carey, que atuou muito bem quando pedida. Só Paula Patton, que pareceu um pouco artificial.

Preciosa –Uma História de Esperança merece estar figurado entre os melhores filmes do ano, e todas suas indicações a todos os prêmios são merecidos. É uma obra de arte muito bonita, escondida sob o rótulo de ‘‘ filme de Oscar ’’ . O choque de realidade misturado com técnica dá num resultado para se aplaudir de pé.

5 Estrelas *****

sábado, 13 de fevereiro de 2010

O Lobisomem


Remake demonstra bom resultado, com forte importância nos dias de hoje.

Ná década de 40, surgiram nos cinemas a fase dos ‘‘Monstros da Universal’’. Os vampiros, lobisomens e toda a gama de personagens gore tiveram seu apogeu nas telonas, e suas obras são, hoje em dia, considerados clássicos, e servem de base para a concepção de todos os personagens em questão. Entretanto, apesar da existências desses clássicos, várias obras bem recentes conseguiram desfigurar a cultura dos mosntros . Sim, pois sub-produtos como Crepúsculo nada mais são do que uma grande e feia cicatriz na face sangrenta de vampiros e lobisomens.

Não só por seu modo de contar história completamente avesso a boa e velha tradição, essas obras deturpam as características dos consagrados personagens . Ora, os lobisomens do filme Crepúsculo nada mais são do que grandes lobos, que surgiram a partir de mocinhos que adoram tirar a camisa. Graças a Deus, a história do cinema agora nos dá um alívio . Nessa geração onde reboots e remakes são concretizados aos baldes, a Universal decidiu ressuscitar seus velhos monstros, e o primeiro a ser lançado é O Lobisomem.

Logo ao ser confirmado, o longa gerou óbvia ansiedade. Com o elenco poderoso e competente contratado, as expectativas aumentaram muito. E tudo ia muito certo para a produção de Lobisomem. A única supresa negativa na espera pelo filme de Joe Johnston foi um problema na hora de editar o longa. Uma complicação na hora de definir qual seria o design do personagem (como ele se moveria) e alguns problemas na hora de monstar o longa fez os produtores recorrerem ao mestre da montagem(Walter Murch). Isso tudo 5 semanas antes da estréia mundial.

Entretanto, nenhum desses problemas é perceptível,e não atrapalha o andamento de Lobisomem. A trama, baseada na Inglaterra Vitoriana, conta a história de Lawrence Talbot(Benício Del Toro), um ator de teatro que retorna a mansão de seu velho pai (Anthony Hopkins) após o desaparecimento de seu irmão Ben, que era casado com a bela Gwen Conliffe( Emily Blunt). Quando chega, Lawrence recebe a notícia de que seu irmão foi encontrado já morto, em condições misteriosas. Ao tentar desvendar o caso, Lawrence se depara com a criatura e é mordido, dando continuação a estranha maldição que sua família sofre.

O roteiro não é uma pérola em criatividade no geral – A história é basicamente a clássica, e não poderia se esperar algo muito revolucionário aí – mas gera situações interessantes com seus personagens e consegue prender o espectador com um vigor e tanto. Isso se explica principalmente pela falta de enrolação que o filme nos mostra. Nada é introduzido pra encher a linguiça e ganhar tempo, como no ruim e recente Atividade Paranormal. A cada sequencia que desenvolve de maneira boa os seus personagens, há sequencias com o bicho, mutilando aos montes. Nada é colocado em excesso – a criatura aparece moderadamente na tela, pelo menos – e nada também falta. O único problema com o roteiro são algumas derrapadas nos clichês. Frases feitas e algumas passagens mais regurgitadas - principalmente com a personagem de Blunt – tiram uns pontos do filme.

A direção de Johnston é boa, mas não vai muito além disso. Captura tudo sem confundir o espectador, tem seus momentos mais modernos e estilosos. Mas isso são por alguns momentos. No resto, Johnston opta por um estilo mais padrão. Na ação, aliás, o diretor se mostra também muito a vontade, criando cenas ótimas . O filme, em si, poderia até ser comparado com a atuação do diretor – Nos envolve e nos faz apreciar, prova que é acima da média, mas não merece nota máxima.

A fotografia também agrada bastante, e merece uma comparação com outro filme que retrata a Inglaterra Vitoriana, mas de maneira mais moderna. Sherlock Holmes , que tem uma forografia ótima, e só deixa a desejar nos momentos de maior escuridão. O Lobisomem, por sua vez, tem um ponto melhor. Sua paleta, apesar de bela, é normal, não busca cores muito diferentes do tradicional. E não decepciona nos momentos escuros. Consegue mostrar tudo o que acontece nessas situações.

A edição é competente, prova de que a mão salvadora do experiente Walter Murch conseguiu consertar o que havia de pendente e dar qualidade vistosa no quesito. Já a trilha trabalha normalmente. Aumenta em momentos-chave de susto, e só. As atuações de Del Toro e Hopkins também contribuem muito. Talentosos, conseguem dar uma profundidade aos seus persongens e seguram de forma impressionante.

No final das contas, O Lobisomem se destaca por reeditar um clássico de maneira muito competente. Sua principal importância porém, é trazer a cultura dos monstros DE VERDADE de volta. Ver um homem-lobo estripando pessoas nos dias de hoje é sensacional. O Lobisomem pode não ser o filme gore de sua vida– e passa longe disso - mas ve-lo nos cinemas da atualidade é de um luxo imenso.

4 Estrelas **** Nota - 7,o

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Guerra ao Terror

Kathryn Bigelow ressurge. E como uma das melhores.
A diretora Kathryn Bigelow foi muito famosa na transição dos 80's pros 90's, com Caçadores de Emoção, cult-sessão da tarde estrelado pelo saudoso Patrick Swayze e Keanu Reeves. O filme era um descartável exercício de diversão e Bigelow nada fazia para ser reconhecida pela direção, tudo bem normal. Era mais famosa até por ser esposa do pré-Oscar James Cameron. Logo depois de Caçadores, Bigelow não fez mais nada de importante mesmo. Mas em 2009, ela apostou numa produção independente com orçamento de 11 Milhões, sobre a guerra no Iraque. Logo depois de estrear, Guerra ao Terror foi ganhando uma repercussão incrível e enorme, sendo elogiado por todos. Aqui no Brasil, o filme lançou primeiro em DVD(a Imagem Filmes deve estar se mordendo agora) e passou batido. Mas, depois de tanto hype, o filme chega aos cinemas aqui. E com um status enorme: Senão bastasse ter sido glorificado por sites respeitados como o Rotten Tomatoes(que deu 97%), Guerra já vinha ganhando prêmios importantes pelo mundo todo e, em 2 de Fevereiro, foi indicado a 9 Oscar. Era Kathryn Bigelow voltando ao estrelato e agora agraciada pela crítica. Mas fica a dúvida: Guerra ao Terror é tudo isso mesmo? Vale a pena?

A resposta é mais que clara: Sim. E vale torcer por ele para vencer o Oscar porque é o que tem mais chances, ao lado do bom Avatar.

A trama, contada de forma pouco vista e nada convencional, acompanha um grupo de soldados no Iraque. Eles estão lá para andar de quarteirão em quarteirão com o objetivo de desarmar bombas, conter pequenas ameaças armadas ou apenas ficar explodindo armamento desnecessário. Até que esses 3 soldados vão desarmar uma bomba comum e acabam se deparando com um terrorista, que dispara ela, matando um deles(Guy Pearce). Assim, um substituto chamado William James(Jeremy Renner) entra no lugar para comandar a equipe, também formada por Sanborn(Anthony Mackie) e Eldridge(Brian Geraghty). Enquanto eles realizam suas atividades até completarem seu turno no exército, cada um deles vai demonstrando seus medos e ambições.
A narrativa do filme se desenrola assim, com um desenvolvimento diferente e que entrega mais construção de personagens e situações do que uma trama de suspense propriamente dita. Nisso, a rotina da guerra é valorizada e as reviravoltas que os estúdios e massa tanto anseiam, não aparecem. O foco aqui é no realismo.

Tecnicamente, Guerra ao Terror é impressionante para seu parco orçamento. A direção de Bigelow, indicada ao Oscar, é alucinante. Lembrando o jeito de Paul Greengrass, Kathryn filma a ação com cortes bem rápidos e bem utilizados. E tudo isso num estilo bem de guerrilha, com a tensão sempre lá em cima. Curiosamente, apesar dos cortes serem rápidos, a direção de Bigelow é fácil de acompanhar, com uma direção de atores excelente. Até nas parcas cenas fora da Guerra, ela dirige bem. Aqui, ela foi merecidamente reconhecida porque essa é uma das 3 melhores direções do ano, talvez a melhor. Agora, fica a espera por um próximo trabalho dela. A edição de Chris Innis e Bob Murawski auxilia de forma precisa o estilo agressivo de Bigelow filmar. A agilidade imposta é soberba e merece ser premiada esse ano. Ela é um dos grandes atrativos visuais do filme(e não são poucos). Alguns cortes rápidos que a edição introduz são soberbos. Como o filme não tem uma fixa estrutura narrativa, a edição coloca com perfeição transições de tempo grandes, como quando uma bomba é desarmada. O corte pula para outro frame com agilidade pouco vista esse ano.
Outro primor, digno de uma premiação(apesar de Eric Steeberg ter feito um trabalho melhor em 500 Dias com Ela) é a fotografia. Barry Ackroyd fez um trabalho fabuloso, fotografando a guerra como ninguém. Os tons mais amarelos, valorizando o ambiente quente e desértico é fabuloso, extraindo imagens pós-modernas com arrojo e segurança. Aqui, a fotografia é bem parecida com a de Trent Opaloch em Distrito 9, outra peróla em quesito fotografia. Merecidamente, Ackroyd ganhará esse Oscar.

Um fator estranho desse filme, curiosamente, foi indicado ao Oscar: A trilha sonora. Marco Beltrami e Buck Sanders resolveram valorizar o realismo aqui e deixaram a mixagem de som e edição trabalharem, construindo trilhas minimalistas e em poucas oportunidades, visando apenas fortalecer a tensão do filme. Mas, todos agraciaram a trilha de forma bem esquisita, afinal, a trilha pode até ter qualidade quando exigida, mas ela é MUITO pouco exigida. Enfim, é um ponto positivo pro filme como um todo, mas isoladamente é bem estranho(ainda mais pela indicação). A edição de som e a mixagem do filme são fantásticos e os pontos mais profissionais do filme(com exceção da direção). Empolgantes e bem realistas, eles ajudam o espírito do filme. A direção de arte também é boa, mas perde em relação aos outros quesitos técnicos. Apenas um pouco acima da média, fazendo o habitual em filmes de Guerra.

As atuações de Guerra ao Terror são muito dignas. Jeremy Renner, antes ator coadjuvante de filmes médios, aqui ganha a chance de sua vida. Ele pega um papel arquetípico em um filme independente e se transforma num personagem como nunca visto, alguém diferente, de forma que a abordagem recebida ficou melhor. Logo, a indicação ao Oscar de Melhor Ator veio e digo que é muito justo. A transformação de Renner em James é tocante e corajosa. Junto a ele, os coadjuvantes fazem bonito. Anthony Mackie, o Sanborn, atua muito bem. Eu até o indicaria-o para Ator Coadjuvante. O pouco conhecido ator(como a maioria, exigência de Bigelow, em prol do realismo) arrebenta e exala veracidade. Brian Geraghty, o Eldrigde, acrescenta uma boa atuação ao elenco, acima da média. Mas nada parecido com as poderosas facetas criadas por Renner e Mackie. Fora eles três, é difícil falar de Guerra ao Terror. Afinal, os conhecidos David Morse, Guy Pearce e Ralph Fiennes tem papéis míseros e de pouco destaque. E os outros são apenas figurantes relacionados a guerra. Então, funcionando como um perfeito ensemble cast, Guerra ao Terror apresenta um dos conjuntos de elenco mais completos do ano.

O roteiro de Mark Boal ajuda a veracidade que o filme quer impor. O ex-jornalista, sempre baseado em áreas de combate, estudou bastante do tema e isso dá pra ver com facilidade nas situações críveis e nos diálogos precisos que foram escritos. E a direção de Bigelow ainda ajuda esse espírito, dando um ritmo tenso e quase documental pro filme. Foi uma combinação perfeita, afinal, é difícil achar uma maneira completa de filmar um roteiro tão complexo e inovador. Inovador, eu digo, pela estrutura que Boal usou para construí-lo. O filme não tem uma trama definida ou linear, ele segue a equipe de James desarmando bombas e lidando com situações cotidianas, como um ou outro rebelde iraquiano armado. Por isso, não há um clímax definido e não há as explosões finais, reviravoltas de roteiro ou até mesmo uma ou outra situação de blockbuster. Em Guerra ao Terror, a estrutura valoriza o ambiente e a Guerra, que moldam o homem. Guerra moldando o homem... Ta aí um conceito bem explorado pelo roteiro, que vai da frase inicial do filme(A Guerra é um vício) até o final, quando o roteiro preza pela transformação e construção final de personagem. O motivo pelo qual James encara aquilo tudo é corajosamente bem abordado e absurdo tamanha a situação que o filme joga na nossa cara. No meio de todo aquele caos, ainda há gente que goste.

Num conceito geral, Guerra ao Terror pode não ser o melhor filme de guerra já feito. Mas, sem dúvida, é o que mais nos trata como espectadores reais da guerra. Aqui, sabemos dos horrores dela sem pudores e sem censura. Talvez Guerra não seja carismático como Soldado Anônimo, não seja divertido como Falcão Negro em Perigo, não seja tão aclamado quanto Apocalypse Now, nem tão bom quanto um Bastardos Inglórios. Ele é o que nos trata com mais inteligência, nos mostra com precisão o que uma guerra é, o típico filme que é visto superficialmente como filme-denúncia, mas no âmago é um filme sobre os homens e seus vícios. Um filme memorável, que usa a Guerra, o ambiente, o clima e até mesmo um traje(o tal Hurt Locker do título original) para mostrar que homens só são homens quando estão guerreando. E essa questão abordada é linda. Guerra ao Terror nos faz um grande questionamento no final: Seria mais verdadeiro o homem com uma arma na mão, numa Guerra, ou com uma faca na mão, cozinhando com sua família?

Bigelow e Boal jogam na cara a realidade de vários homens no mundo. E se no final o choque é grande, não se preocupe. Não é sempre que a guerra é mais importante que um bebê.

PS.: Imagem Filmes, tenha mais cuidado com o modo que você lança seus filmes. Uma pérola como essa, direto em DVD, é no mínimo estranho. E coloque os atores principais na capa do DVD, não os mais famosos. Chega a ser até absurdo o fato dos 3 atores na capa aparecerem, somando, 4 minutos no filme. Por favor né...

***** 5 Estrelas

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Zumbilândia


Outro olhar aos zumbis - Comprovando de que estão mais vivos do que nunca !

Filmes de Zumbi são hoje em dia um sub-gênero formado : Tem uma grande variedade e tipos de criações, com um mestre sagrado responsável por sua criação : George A. Romero. Indo desde o terror concretizado até a comédia, poderia dizer que Zumbis são um gênero em si, e não um derivado. Os grandes responsáveis por isso são os vários diretores e roteiristas que fazem questão de inovar sempre a trama, criandos resultados finais brilhantes . Zumbilândia ,é , com certeza, uma das provas concretas de que os Zumbis estão bem vivos - e não erram nos seus filmes.

A história de Zumbilândia é bem simples, porém longe de simplória ou fuleira . Conta com vários recursos modernos e interativos para contar sua trama, e isso se encaixa muito bem, dando uma áurea muito mais original a um filme que podia ser vendido como diversão barata apenas. E ele está a quilômetros, muitos quilômetros de distância disto. Como todo o filme de zumbi, fala sobre um infestação de um vírus por todo o mundo, mas aqui o foco é nos EUA. Porém, diferente de um Madrugada do Mortos, remake de Zack Snyder do clássico antigo de Romero, Zumbilândia não vai ao drama de quem fica vivo e isolado, - o ponto dos filmes de Romero - mas procura um meio muito mais cômico e sacana de mostrar os zumbis. Desde as imagens até a refêrencia dos personagens que passam pela tela apenas segundos. Mas também não é como Shawn of The Dead, do inglês Edgar Wright . O clima de Shawn of the Dead é de comédia? Sim. Mas vai mais além, pois tem um ponto dramático maior e mais intenso. O mérito do filme de Ruben Fleischer não é superar a genial obra inglesa - até por que não supera - mas abordar de uma forma muito descarada esse tema.

Toda a técnica também contribui para essa didática animada e engraçada do filme . Os créditos iniciais são em câmera lentíssima de alta definição, e mostram cenas cotidianas do universo zumbi : Casamentos, Fugas com crianças e muito sangue e tripas balançando lentamente causando gargalhadas incontáveis na platéia. Fora isso, Fleischeir não faz muito além do normal.Dá pra falar que o estreante poderia ter feito mais . Sua maneira de contar histórias não é ruim. Não perde nada, utiliza cortes rápidos , mas não vai além da barreira do muito bom. Takes mais ousados não seria pedir demais, mas considerando que é seu primeiro trabalho, podemos dizer que está mais que perfeito. Toda a equipe por trás das câmeras também trabalha com louvor . A edição está perfeita, e a trilha sonora deixa o filme com um patamar cool como poucos.

Mas , falando a verdade, tudo isso citado acima está de certo modo ofuscado pelo marvilhoso roteiro da dupla Paul Wernick e Rhett Reese . A história aborda o nerd nominado apenas como Columbus (Jesse Eisenberg) que diz desde o principio que só conseguiu sobreviver ao mundo repleto de zumbis comedores de carne humana respeitando a suas regras. Tirada genial da espirituosa dupla. Toda a introdução mostra por que devemos respeita-las .E essas famigeradas regras são sensacionais. Básicas na sobrevivencia no mundo zumbi, e algumas já até conhecidas do público acostumado com filmes de zumbi. Depois disso, nos mostra como o protagonista conhece Tallahassee(Woody Harelson) um bad -ass que tem como dom matar zumbis. Se unem para seguir viagem adiante até o leste . Nesta viagem, acabam encontrando as irmãs Wichita (Emma Stone) e Little Rock (Abigail Breslin), em situações peculiares , e elas se unem a dupla.

O roteiro estrutural é muito bem criado por sua simplicidade . O grupo que se forma está muito mais preocupado em matar zumbis e fugir deles com piadas inteligentes do que ter um drama mais aprimorado nas suas relações.Sobram maneiras interessantes de se explorar o tema :Usar armas exóticas(como um cortador de grama), roubar carros abandonados, esmigalhar zumbis e falar sobre isso sem pudor de pegar uma censura rated R . Junto a isso, temos a maneira genial de apresentar as situações engraçadas sob narração em off de Columbus. E o filme cria , de um modo nada forçado, seu próprio universo - O fato dos protagonistas se conhecerem apenas pelos nomes dos lugares aonde se destinam, não por seus nomes reais, para evitar a intimidade em demasia, sedimenta a situação psicológica que os vivos estão . Os títulos de morte de zumbi da semana e os vícios dos personagens só reafirmam isso - algo deveras bem elaborado. É preciso, claro, citar uma das passagens mais engraçada do filme : A parte em que aparece Bill Murray. É roteiro inteligente que nos faz pensar "Como nenhum cineasta não pensou nisso antes ?" É nessa passagem aliás, que se concentram as maiores referencias pop do filme.

E a construção de personagens ajuda bastante também. O personagem Columbus nos dá uma familiaridade enorma, e a identificação com ele é instântanea. O modo familiar vem provavelmente da semelhança com Michael Cera(quase gêmeo do protagonista), e seu modo nerd de ser . Talahasse também é carismático ao extremo, e a atuação majestral de Harelson só constribui para o personagem. As duas meninas atuam também muito bem, com Emma Stone se destacando principalmente pela beleza estonteante.

Zumbilândia pode não ser perfeito. Mas chega bem perto, pelo menos. Não é o filme de zumbi deste século - não tem o refinamento de tão alto nível como o de Shawn of the Dead sem dúvidas- mas nos ajuda a conceber a idéia de que os Zumbis são um ótimo tema, tanto para entreter de forma escapista quanto para encher os olhos de um crítico que goste de filmes com humor refinado e roteiro de ótimo gosto . Que venham mais!

5 Estrelas *****

Nine

Rob Marshall encanta, mas apresenta inconstância.

Em 1982, Arthur Kopit escreveu um livro baseado no clássico dos cinemas 8 e Meio, de Federico Fellini. Logo, seu livro virou uma peça chamada Nine. A peça virou sucesso na Broadway e logo foi se espalhando pelo mundo inteiro. Então, como qualquer grande sucesso de outras mídias, Nine atraiu os olhos de Hollywood e logo foi adaptada. Os roteiristas responsáveis pela adaptação foram Michael Tolkin e Anthony Mingella. Mingella, infelizmente falecido em 2006, foi um dos maiores escritores/diretores recentes, sendo responsável por excelentes filmes como O Talentoso Ripley e O Paciente Inglês. Logo, a expectativa ficou altíssima. Mas, há um porém. Fazer um remake de um verdadeiro clássico do cinema mundial é bem complicado e sempre é digno de desconfiança. Com essas contradições, Nine virou uma incógnita na cabeça dos cinéfilos. Mais tarde, foi divulgado o diretor. Rob Marshall, diretor do premiadíssimo Chicago e famoso na Broadway por inúmeros espetáculos, iria comandar o set. As mulheres lindíssimas e Daniel Day-Lewis no elenco pendiam a balança para algo positivo.
Mas, infelizmente, é fácil constatar que Marshall errou a mão e fez um filme descontrolado, descompassado. Indeciso sobre sua natureza e até mesmo sobre seu lado emocional, Nine decepciona, mas não afunda.

A trama, conhecido do público mais velho e mais apreciador do cinema, conta a história de Guido Contini(e não Anselmi, como em 8 e Meio), um cineasta italiano que tem um grande filme nas mãos, com o ambicioso título Italia. Sets prontos, profissionais contratados, coletivas de imprensa. O pacote todo de divulgação já está sendo realizado, mas há um problema: Ás vésperas das filmagens, Guido tem um bloqueio, está completamente sem inspiração e sem uma palavra no roteiro. E seu produtor começa a pegar em seu pé para iniciar logo as filmagens. Então, desesperado, Guido começa a buscar inspiração nas mulheres de sua vida: Sua mulher Luisa(Marion Cottillard), sua amante Carla(Penélope Cruz, lindíssima), a atriz e sua musa inspiradora Claudia Jenssen(Nicole Kidman), Sua figurinista(Judi Dench), uma jornalista americana(Kate Hudson) e até mesmo sua falecida mãe(Sophia Loren). E o filme se arrasta nessa jornada, da qual Guido fica cada vez mais desesperado e triste. Tudo então é entregue sem surpresas e com um ritmo bem mais lento do que o habitual, mesmo se tratando de um filme dramático. E talvez esse seja o grande problema de Nine: A falta de apego ou sentimento.

Nas técnicas, Nine é soberbo, muito lindo e bem-realizado, digno de alguns Oscars técnicos. A direção de Rob Marshall é segura e bem feita. Nas partes dramáticas, Marshall não extrapola e conduz bem o filme, com uma excelente direção de atores. Nas partes musicais, ele se solta. Tudo é profissional, com extrema qualidade de filmagem. Seus números são bonitos de se ver, empolgantes e muito bem montados, demonstrando a especialidade de Marshall. O único dos musicais que ficou ruim foi Be Italian, com Fergie. Mal dirigido e com uma música fraca, o número simplesmente não empolga. Mas tudo é compensado com Cinema Italiano, com Kate Hudson. Inegável perfeição. A edição de Claire Simpson e Wyatt Smith é excelente e bem realizada. Impondo um ritmo ágil nos musicais e seco nos dramas, a edição até ofusca um ou outro erro de Marshall.
A trilha composta de Andrea Guerra é mediana. Pode até empolgar com algumas melodias divertidas, mas é extremamente desconexa e descompassada. Em alguns momentos, Andrea introduz uma música á la Danny Ocean no núcleo mais cômico-cool. Estranho, porém médio.
Já a fotografia de Dion Beebe, colaborador frequente de Michael Mann, é soberba e perfeita. Merece sem dúvida o Oscar desse ano. É daquelas fotografias que fazem os olhos brilhar. Com tonalidades mais escuras e condizentes com o clima italiano, a fotografia é fantástica, o ponto alto. Outro ponto alto do filme é a direção de arte. Os cenários de época do filme são recriados com perfeição e obsessão. Outro ponto que merece, pelo menos, uma indicação ao Oscar.

Num musical como Nine, alguns espectadores mais mainstream procuram saber se as músicas são boas ou empolgantes. E quer saber? Sim e Não. Maury Yeston compôs músicas bem engraçadas pela sua própria letra mesmo. O jeito com que elas são introduzidas no filme é excelente e muito bem realizado. Até mesmo inovador. Certas vezes, as músicas representam os sentimentos de Guido e outras apresentam algumas falas cantadas, mas tudo fantasioso, na mente de Guido. Interessante. Mas há alguns erros. Isoladamente, as músicas são estranhas por seu conteúdo vazio. Cinema Italiano, por exemplo, é extremamente empolgante, assim como Folies Bergères(muito bem filmada). Mas Be Italian é desnecessária e mal-feita, a própria Cinema praticamente nada tem a ver com o filme e o início, com apresentação a todas as divas do filme, é bonito porém igualmente vazio. Assim, fica empolgante, mas não tão bom. Num DVD de Clipes, as músicas devem valer a pena. No filme, elas apenas divertem e entretem de forma segura. Apenas as melodias dos sentimentos de Guido e da fantasia dele com Penélope Cruz valem realmente a pena. Mas acredito que assim que exigem de um bom musical. Mas, sinceramente, acho que o gênero musical já foi bem mais explorado no cinema(Moulin Rouge é uma máxima).

Nas atuações, Nine é caprichado. Daniel-Day Lewis demonstra mais uma vez o gênio que é e encarna um bem construído Guido. Mas, é um Guido diferente do de Mastroianni. Aqui, Lewis exalta a falta de segurança e os amores de Guido pelas mulheres. Em 8 e Meio, Mastroianni se focava em fazer um homem forte porém "talentosamente debilitado". Então, se o objetivo é reinventar o personagem, Lewis faz um ótimo trabalho. Marion Cottillard, a atriz com mais tempo de tela junto a Lewis, arrebenta. Faz mais um excelente trabalho e demonstra todo seu talento que a fez ganhar o Oscar 2007 por Piaf. Apesar de ser uma comparação estranha, acho válido dizer que aqui ela esbanjou a qualidade que não pode em Inimigos Públicos, por seu pouco tempo de tela. Sua Luisa é uma mulher de garra, bem feita, bem construída e provocativa. E... bem insegura. Ponto pra atriz, que poderia figurar nas indicações no Oscar. Judi Dench faz um papel bem mínimo, mas demonstra um belo talento. E até mesmo canta(formidavelmente). Penélope Cruz é outra que tem aqui um espaço limitadíssimo de tela, mas mostra a mesma competência de sempre. Até mesmo quando é exigido seu número musical, ela não faz feio(apesar de uma desafinada grande no final...).
Sophia Loren também atua bem, numa clara homenagem a diva italiana, que aparece em três ou mais cenas, mas até canta bem. Mas há certos pontos bem curiosos nas atuações de Nine. E eles respondem por Kate Hudson, Fergie e Nicole Kidman. Kate, atriz competente e dona de uma voz surpreendente, faz duas cenas no filme. E, faz Cinema Italiano. Chega a ser constrangedor o fato de apontar Kate no cartaz como uma das protagonistas. Fergie também faz duas cenas e Be Italian, mas pelo menos estava claro que a aspirante a atriz nada faria ali. E Nicole Kidman, a maior estranheza de Nine. Vendo um excessivo orçamento de 80 milhões, fico imaginando porque não deram 10 reais pra uma atriz iniciante bem bonita fazer o papel de Kidman. Apagada, ofuscada e em pouquíssimas cenas, Kidman faz seu pior trabalho. Novamente, só vale seu número musical, muito bem cantado(impossível não lembrar de Moulin quando a linda atriz solta a voz). Um talento desperdiçado.

O roteiro de Nine é onde reside seu maior problema. Os roteiristas criaram uma boa trama com uma boa base, mas seu desenvolvimento é precário e bem falho. As falas e narrações em off dos personagens explicam as imagens com frequência(uma coisa bem incomum para um drama) e ainda não são refinadas. O ritmo do filme também é outro problema. Lento e sem propósito, o ritmo é desnecessariamente arrastado. E ainda há algumas falhas bem curiosas, como por exemplo a indecisão do filme. Em momentos, ele é uma comédia. Logo após, muda arruptamente para um drama pesado. Depois, musicais entram na tela. Uma coisa é uma premissa agridoce, que promete um certo gênero cômico-dramático. Outra coisa é um filme descompassado e indeciso que tem momentos excelentes mas se perde ao tentar se levar a sério demais(ou de menos). Isso acaba tornando Nine uma incógnita, um paradoxo, um filme sem sentimento. O cômico que se leva a sério ou o drama que tira sarro. Uma pena um roteirista tão metódico quanto Mingella ter cometido esses erros.

Divertido e com seus altos e baixos, Nine cai no lugar comum. Torna-se só mais um produto encomendado pra Oscar mas que decepciona. E acredito que se a expectativa do resenhista que escreve aqui não fosse baixa, o filme teria um gosto muito amargo na boca. Mas, já dava para esperar de Nine um filme assim: Corajoso porém comum. Definitivamente, nenhum diretor dramático ou alguns números musicais salvam um roteiro que precisava de uma mínima polida antes de sair do forno. Uma pena. Mas fica o recado: Espere pouco e você terá um filme bonito, bem feito e um musical empolgante. Se esperar Oscar, sairá meio mal da sala. Nine reflete bem o que Nicole Kidman foi no filme: Um talento desperdiçado.

*** 3 Estrelas