Bom blockbuster de verão reinventa o Amigão da Vizinha - mas com roteiro burocrático.
Muito se questionou sobre a necessidade de um reboot para uma franquia tão jovem quanto a de Homem-Aranha. O sucesso arrebatador (e um tanto inesperado) do primeiro filme acabou gerando frutos: não só ajudou a consolidar o gênero nas telas como conseguiu render duas sequências que arrecadaram pouco mais de 1,5 bilhão de dólares juntas. A produção do último capítulo da trilogia foi conturbada, porém. O apressado cronograma (a estreia do terceiro filme fora definida ANTES do lançamento de Homem-Aranha 2), misturado á uma pressão constante dos produtores, acabou por limitar o controle criativo do diretor Sam Raimi. Vitimando, assim, a qualidade do fraquíssimo terceiro segmento. Sendo assim, entende-se a necessidade mercadológica em prosseguir a franquia com um reboot: não havia muitos caminhos a serem trilhados após o insosso final. Com a saída de Raimi, o superprodutor Avi Arad anunciou o reinício, roteirizado por James Vanderbilt (roteirista requisitado e profílico, indo de Zodíaco a Violação de Conduta).
Após uma produção folgada, sem pressa, o filme ganha uma massiva campanha de divulgação. Mas seria essa a tal "historia nunca contada" do Aranha? Do ponto de vista cinematográfico, seria O Espetacular Homem-Aranha (curiosamente, um título mais operístico que o do primeiro filme) uma válida experiência?
O desenvolvimento de Peter Parker, apesar de aparentar mais extenso, é um tanto semelhante ao de Homem-Aranha 1. Temos a presença do bullying; a vingança contra Flash Thompson; o amor platônico pela garota da sala; a situação com os tios. É no tom que há a diferença. Muitos acusam o filme de Marc Webb como “desnecessário”, mas mesmo falho, essa nova abordagem não soa idêntica ao filme de Raimi. É como se fossem as mesmas situações, mas com um olhar diferente.
Desde os breves créditos iniciais, já se percebem as intenções da estrutura do longa. A estilizada abertura, cheia de teias e ligações, sugere uma historia toda conectada entre si. O que, por sua vez, parece uma mania dos roteiristas atuais, que seguem essa tendência que os produtores parecem gostar tanto. Entende-se aí a contratação de Vanderbilt: veterano em roteiros policiais "intelectuais", cheios de suas viradas em estrutura (Violação de Conduta, o ultimate filme de reviravoltas, é um roteiro original de Vanderbilt), o roteirista abraça a tentação de interligar tudo no passado e presente de Peter Parker.
Oposto em tom e mais focado nesse tipo de narrativa falsamente intrincada, o novo Aranha conta com uma atmosfera muita mais sisuda que a da primeira trilogia. E mesmo mais sério e sóbrio, o filme de Webb é muito menos dramático que o de Raimi. Há pelo menos três situações dramáticas bem semelhantes aos filmes anteriores e, em todas elas, o peso não é sentido como no filme de 2002.
Muito se questionou sobre a necessidade de um reboot para uma franquia tão jovem quanto a de Homem-Aranha. O sucesso arrebatador (e um tanto inesperado) do primeiro filme acabou gerando frutos: não só ajudou a consolidar o gênero nas telas como conseguiu render duas sequências que arrecadaram pouco mais de 1,5 bilhão de dólares juntas. A produção do último capítulo da trilogia foi conturbada, porém. O apressado cronograma (a estreia do terceiro filme fora definida ANTES do lançamento de Homem-Aranha 2), misturado á uma pressão constante dos produtores, acabou por limitar o controle criativo do diretor Sam Raimi. Vitimando, assim, a qualidade do fraquíssimo terceiro segmento. Sendo assim, entende-se a necessidade mercadológica em prosseguir a franquia com um reboot: não havia muitos caminhos a serem trilhados após o insosso final. Com a saída de Raimi, o superprodutor Avi Arad anunciou o reinício, roteirizado por James Vanderbilt (roteirista requisitado e profílico, indo de Zodíaco a Violação de Conduta).
Após uma produção folgada, sem pressa, o filme ganha uma massiva campanha de divulgação. Mas seria essa a tal "historia nunca contada" do Aranha? Do ponto de vista cinematográfico, seria O Espetacular Homem-Aranha (curiosamente, um título mais operístico que o do primeiro filme) uma válida experiência?
O desenvolvimento de Peter Parker, apesar de aparentar mais extenso, é um tanto semelhante ao de Homem-Aranha 1. Temos a presença do bullying; a vingança contra Flash Thompson; o amor platônico pela garota da sala; a situação com os tios. É no tom que há a diferença. Muitos acusam o filme de Marc Webb como “desnecessário”, mas mesmo falho, essa nova abordagem não soa idêntica ao filme de Raimi. É como se fossem as mesmas situações, mas com um olhar diferente.
Desde os breves créditos iniciais, já se percebem as intenções da estrutura do longa. A estilizada abertura, cheia de teias e ligações, sugere uma historia toda conectada entre si. O que, por sua vez, parece uma mania dos roteiristas atuais, que seguem essa tendência que os produtores parecem gostar tanto. Entende-se aí a contratação de Vanderbilt: veterano em roteiros policiais "intelectuais", cheios de suas viradas em estrutura (Violação de Conduta, o ultimate filme de reviravoltas, é um roteiro original de Vanderbilt), o roteirista abraça a tentação de interligar tudo no passado e presente de Peter Parker.
Oposto em tom e mais focado nesse tipo de narrativa falsamente intrincada, o novo Aranha conta com uma atmosfera muita mais sisuda que a da primeira trilogia. E mesmo mais sério e sóbrio, o filme de Webb é muito menos dramático que o de Raimi. Há pelo menos três situações dramáticas bem semelhantes aos filmes anteriores e, em todas elas, o peso não é sentido como no filme de 2002.
Mas antes do fundo dramático, há
a problemática estrutura. Tentando interligar todas as pontas da narrativa
possíveis, o roteiro de Vanderbilt, Alvin Sargent e Steve Kloves encontra nas
coincidências o seu fio da trama. Quando estoura o cano da casa, Peter encontra
a maleta do pai. Maleta essa que tem um símbolo estranho, junto com fórmulas.
Símbolo este que Peter encontra ao esbarrar
no advogado de Norman Osborn, que estava (que coincidência!) levando esses
documentos naquela exata hora. Hora esta em que ele visita um viveiro de
aranhas radioativas. Esta fórmula dos símbolos que, estudada por Peter, é
solucionada para que Curt Connors possa realizar sua teoria. A já citada “teia
de acontecimentos” incomoda, apesar de ser admitida e adorada pelos
roteiristas. Quando Peter fala com o Capitão Stacy sobre o Lagarto, o policial
explicita: “então quer me dizer que Connors, brilhante mentor de minha filha, é esse monstro?”. Fora que, por
Deus, se você fosse um super-herói mascarado, você colocaria seu nome na câmera
na hora de ir atrás do vilão? A mudança de foco no drama é o que salva o script
mal-construído.
O que nos leva á tal crise de
identidade do adolescente. Peter encara a máscara em certa cena, como se fosse
uma maldição. Essa direção, de um menino aprisionado por não saber quem é, é
levada a exaustão. “Sei qual é seu nome, mas quero saber se você sabe”, diz
Gwen. Peter é amargurado por isso e, mesmo que desenvolvido sem muito capricho,
o conceito é interessante.
O desenvolvimento dos
personagens, mesmo falho, acaba se tornando a maior força de O Espetacular
Homem-Aranha. E o elenco envolvido, todo muito bem dirigido por Webb, só ressalta
isso. Andrew Garfield está perfeito no papel, Emma Stone é novamente adorável,
e a química dos dois atores nas cenas de romance transpira na tela. Martin
Sheen exala segurança como Tio Bem, o tornando inclusive o mais humano dos
personagens. E mesmo ecoando a esquizofrenia de Willem Dafoe no primeiro filme,
Rhys Ifans se demonstra um bom vilão e suas cenas como Curt Connors são bem
fundamentadas e discutidas pelos personagens envolvidos. E isso reforça a
qualidade de atuação de Ifans, já que o Lagarto de CGI raramente convence,
soando inclusive tolo nas suas tentativas de diálogo (e se salvando, pra
variar, na pancadaria).
Um Aranha mais brincalhão, que
se diverte ao balançar em “teias” de ferro e extravasa suas piadas na roupa
vermelha e azul, acaba soando um tanto novidateiro. Ao acordar, a demonstração
de raiva pelo sono através dos poderes rende uma engraçada cena, além da fome
gigantesca de Peter ao chegar de sua primeira jornada com os poderes (o que me
fez testemunhar um herói quase drogado, o que não deixa de entreter). A teia de
vibrações, construída por ele, também empolga (e nos lembra da inteligência de
Peter). E pra qualquer fã, ver um Aranha magrelo, soltando suas teias pelo
lançador no céu de Nova York, nunca deixa de empolgar. Mas o interessante é que
faltou justamente uma essência ao herói. Há apenas uma cena, a do filho do
bombeiro (que, COINCIDÊNCIA!, salva nosso herói mais tarde), que nos faz
lembrar do que é feito o Amigão da Vizinhança – o que é muito pouco. Sem ser
contagiado pela ciência de suas responsabilidades, o Peter Parker de 2012 perde
força e não sente as dores do que é renunciar sua vida pelo herói. A cena
responsável por isso, com Gwen, idêntica a do filme original, não carrega a
mesma angústia que tinha com Mary Jane no Aranha de Raimi.
A diferença no tom do novo
filme, que torna o reboot um tanto válido, se deve muito a dois fatores em
especial: a busca pelo realismo (provavelmente após o sucesso do Batman de
Nolan) e o diferente desenvolvimento de Peter Parker. Ainda que, como já dito,
diversas passagens sejam bem parecidas, o foco no drama do protagonista é
outro: a busca pela identidade. E nesse ponto, a verossimilhança merece
crédito. Mesmo que aqui e ali soe genérico (mas não menos eficiente) como o uso
dos celulares no clímax, esse realismo é realçado pela atuação muito boa de
Garfield - e funciona. Desde ás solitárias passagens pelo colégio do início até
a presença constante da câmera no quarto de Peter, o filme ecoa a geração de A
Rede Social. A condição social do jovem cientista é sentida por toda a primeira
hora de projeção, mesmo quando Peter encontra o doutor Connors (rendendo
excelentes interações). Porém, algumas cenas acabam perdendo sua força devido á
preguiça do script.
Cenas essas que, pelo seu
reducionismo, acabam soando alheias no meio da introdução. Peter acaba sendo
abordado como um loser típico, sem muitas diferenças em relação ao arquétipo.
Quando vai buscar seu material no armário, há um casal se beijando e impedindo
a passagem; ao ver o nerd sendo humilhado pelo valentão, Peter toma partido e
acaba apanhando – e ganhando a atenção da mocinha. Fora isso, o núcleo dos tios
Parker é bem menos competente que no filme de 2002 na tarefa de evocar as
responsabilidades de Peter com sua família. Além disso, Ben e May perdem as
características básicas na trama estrutural (demonstrar a relação de valores
para o protagonista se tornar um herói) e terminam como meros tutores do jovem.
Justamente por isso, (OH! MAJOR SPOILER!) a morte de Ben é muito menos sentida
que no longa original.
Mas talvez, a maior falha de
Kloves, Vanderbilt e Sargent seja em quem é o tal Homem-Aranha. Em certo ponto,
um personagem diz para Parker: “Essa Cidade precisa de você”. Vendo a projeção
(e como Peter se tornou o heroi), nunca sentindo a mudança que o Aranha traz e
sem saber de sua tarefa quase compulsória como vigilante de Nova York, fica a
dúvida: precisa mesmo?
E se o roteiro trabalha com
temas interessantes mas carece de um cuidado maior, a estética visual se
apresenta completamente oposta ao filme de Raimi – e igualmente excelente. O
Techno-coro criado por James Horner, numa trilha á antiga, funciona mesmo sem
criar um tema específico pro herói. A direção de arte do recém-falecido J.
Michael Riva investe em um ar mais científico e cria ambientes assépticos,
contemporâneos e belíssimos, como o laboratório da Oscorp e o magnífico prédio,
todo baseado em vidro. Ainda com uma fotografia estupenda de John Schwartzmann,
abundante em tons sóbrios e sombria na medida certa (e munido da resolução
monstruosa da excelente câmera Red One), o filme possui na direção segura de
Marc Webb um ponto chamativo.
Mesmo que ainda falte certa sensibilidade em reconhecer uma solução estúpida e ignorá-la (lagartos em todo o lugar, a analogia peixe/lagarto na hora do jantar, a marcha dos lagartos na teia), Webb demonstra bom olho estético. Mais arrojado que o diretor de aluguel comum que os estúdios contratam, Webb cria soluções visuais interessantes para a ação do filme e demonstra a segurança de seu debut, 500 Dias com Ela, na hora de dirigir seus atores. Tanto a sequência na escola quanto o enérgico clímax (a cena de Emma se escondendo do Lagarto é excelente) são favorecidos pelos ângulos elegantes e montagem limpa que Webb prefere. Com destaque, ainda, para as boas transições de cena que Webb e seu editor Alan Edward Bell criam, como o link do prédio sendo clicado e tomando a tela inteira logo depois. Além disso, inspirado nas melhores fases de Todd McFarlane nas HQs do herói, o diretor cria quadros memoráveis com as estilosíssimas poses do Aranha (o que rende o último frame do longa, que busca encerrar esse primeiro filme com a maior solenidade possível). E para fechar: o novo sentido de aranha é muito, muito legal. Será uma boa aposta a volta de Webb para o segundo(há ecos do Duende Verde em pelo menos dois lugares), e inevitável, filme.
Se a tarefa foi apresentar um
Homem-Aranha mais crível para o novo público, até que O Espetacular
Homem-Aranha funciona: definitivamente, o Peter de Andrew Garfield e o de Tobey
Maguire são diferentes. Essa abordagem jovem, mais realista e menos operística
e de homenagem, funciona para o tempo atual e ainda diferencia bastante os dois
trabalhos. Ainda que não seja um espetacular e perfeito filme do que é um
super-herói de verdade, o novo Aranha ao menos é seguro. Mas é mais que um
script mais completo e menos preguiçoso o que melhorará essa futura franquia,
assim como é mais que uma busca de identidade pela alma de Peter Parker.
Falha, então, aonde o original
mais triunfava. A melhoria será a compreensão dos envolvidos de qual é o peso
real de ser o Homem-Aranha.
*** 3 Estrelas - Mediano
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