Cinema nacional tem ação, mas roteiro peca.
Um dos grandes problemas do cinema brasileiro sempre foi a restrição a determinados gêneros. O drama,bom como sempre, retratando a dura realidade brasileira. As comédias românticas globais com atores nacionais famosos. Os policiais que mostram a violência. Esses são as bases do cinema brasileiro numa visão rápida e geral. Nunca foi feito, entretanto, algum filme de ação, ficção ou até mesmo um simples suspense brasileiro. Talvez um grande complexo do nosso país seja mostrar nas telonas uma realidade dura demais com violência e miséria, para ganhar prêmios interinacionais. Nesses filmes o objetivo é chocar o público. Era preciso pensar, que mostrar uma vida difícil e com choque talvez não seja suficiente. É de bom gosto de vez em quando, portanto, mudar um pouco esse objetivo e mostrar a realidade brasileira com arte cinematográfica.
Besouro, filme do estreante em longas João Daniel Tikhomiroff, envereda por esse caminho. Faz, então, o primeiro filme de ação nacional, que não tem o objetivo de chocar, mas sim de mostrar artisticamente, a cultura brasileira, não necessarimente sua miséria urbana. O filme tem um embasamento que não complica muito e honra a história brasileira. A trama é sobre Besouro, conhecido como o melhor capoerista de todos os tempos, que ,em 1924, tem o desafio de combater os grandes coronéis do recôncavo baiano, que tratavam a população negra ainda como escrava.
Tendo essa premissa, o filme se inicia com aspectos realmente dignos de filmes de ação.Uma sequencia inicial inovadora que acompanha a visão de um inseto. O suspense que ocorre em uma cena é aumentado quando intercalada com uma cena de luta. O capanga é subjugado pelo herói e seus golpes. Tudo isso, unido em seu início, nos faz sorrir e ficar empolgados com o filme. Pensamos : " o cinema brasileiro finalmente aprendeu a lição e fez um filme diferenciado". Um filme de ação, emfim, que trás como pano de fundo uma história da cultura brasileira.
Entretanto, nem tudo são flores em Besouro. A história mostra desde seu início que será baseada em um herói, que dá título ao filme. Esperamos logo então a chegada desse herói ao seu destino, seu drama e suas implicações. Porém, o roteiro se esquece um pouco do herói durante o filme, dando espaço para um novo núcleo, o da personagem de Dinorá(interesse romântico do protagonista) e sua mãe. Não reclamo pois não acho que esse núcleo seja descabido. É um núcleo que, após o término do filme, demonstra sua importância. Entretanto, é uma importancia um pouco exagerada que esse roteiro dá ao núcleo. Outro problema do longa é o fato do protagonista ficar muito tempo se preparando. Demora muito, e quase chega a enrolar. Mas esse problema seria solucionado caso a sequencia da luta final fosse mais bem aproveitada. O herói demora, se prepara física e espiritualmente, e no seu momento de clímax contra os vilões tem uma luta rápida demais. Quase passa despercebida essa sequencia, e sendo ela curta demais, perde todo o resto, como o drama e a emoção. Deste modo, fica aquele gosto amargo de " faltou algo a mais", e o filme que se baseava em um herói, se foca muito mais na preparação desse personagem. E isso, obviamente, compromete a quantidade de cenas de lutas ao longo do filme. Não é um filme de ação com muitas cenas de pancadaria. A ação é pontuada, e acho que nese aspecto, a ousadia dos realizadores fariam mais pelo filme. Se é um filme de ação, ela podia ter sido colocada em uma dose maior, sem medo. Até porque, essa é uma primeira experiência do cinema nacional nesse gênero.
A técnica do filme, porém, é muito boa. A direção de estréia de Tikhomiroff é ótima e se encaixa perfeitamente no gênero do filme. Ela tem cortes rápidos, longas sequencias únicas colocadas devidamente em momentos de espiritualismo maior. Os closes nas armas na parte em que os capatazes as preparam são ótimos, e nos remetem a filmes de Hollywood. Aliás, eu, que estava vindo de dias que assistia apenas filmes americanos não me senti muito estranho na exibição de Besouro. Nas coreografias de cenas de luta, o filme se sai muito bem. Também pudera, com o coreografista chinês Huen Chiu Ku( que trabalhou para coreografar lutas de filmes como Kill Bill e O Tigre e o Dragão) as cenas não fazem feio. Tem desde saltos acrobáticos que fazem o personagem sair do chão e chegar no telhado a lutas sobre os galhos de uma árvore. O que falta é a quantidade dessas cenas no filme.
Besouro então, se torna um marco no cinema brasileiro, por três motivos. Um é pelo motivo óbvio do gênero de ação aqui no Brasil, que se inicia, mesmo que de maneira um pouco tímida.O outro é pelo gordo orçamento. Dez milhões de reais, uma quantia alta se comparada a outros projetos nacionais. O terceiro é pela apresentação de Tikhomiroff ao cinema. Grande diretor.Um dos melhores nacionais, sem dúvidas. Já estou ansioso por seu próximo trabalho. Esse entretanto, escorregou um pouco no roteiro.
3 estrelas ***
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