A série Harry Potter é, sem dúvida, a maior da História do cinema, tanto em termos lucrativos como em amor do público. Como o cinema blockbuster ainda se apóia nos adolescentes, espectadores médios que querem apenas diversão, muitas franquias surgem com tramas aventurescas e limitadas, com única e exclusiva função de obter lucros. Transformers é uma delas e, ainda que tenha começado bem, teve uma segunda parte que fez jus a essa ideologia de cinema que só vê lucro. E Harry Potter começou como só mais um filme de aventura, discípulo de Star Wars, baseado numa série de livros que visava apenas um entretenimento passageiro e diversão voltada para o público infanto-juvenil. Porém, quando a escritora J.K. Rowling percebeu que o público que a acompanhava não iria gostar tanto de sequências desnecessárias
que eram apenas "mais do mesmo"(como as séries atuais Crepúsuculo e Percy Jackson), resolveu amadurecer. Aproveitando sua competência adquirida com os 3 primeiros livros, J.K. criou O Cálice de Fogo com uma pegada um pouco mais séria. E isso fez um sucesso tão grande que ficou viável criar os 3 últimos livros com um clima bem mais denso.
que eram apenas "mais do mesmo"(como as séries atuais Crepúsuculo e Percy Jackson), resolveu amadurecer. Aproveitando sua competência adquirida com os 3 primeiros livros, J.K. criou O Cálice de Fogo com uma pegada um pouco mais séria. E isso fez um sucesso tão grande que ficou viável criar os 3 últimos livros com um clima bem mais denso.
Como não li nenhum dos livros e apenas vi o 1, o 3 e o 6, não posso afirmar que HP foi muito melhor nos livros que nos filmes(até porque sou a favor de uma pegada mais dramática e adulta no gênero fantasia, como Sandman), mas é fácil constatar que J.K. começou a virar escritora de verdade, romancista, a partir de A Ordem da Fênix. E mesmo que os fãs tenham reclamado tanto dos problemas de fidelidade dos filmes anteriores, é desnecessário comentar que nenhum deles deixará de ir conferir a nova aventura no cinema e encher os cofres da Warner. Mesmo tendo esse pensamento em mente, os executivos da Warner conseguiram unir o útil ao agradável, depois de mais uma bilheteria astronômica no sexto filme(que na minha visão, é bem legal): Dividiram HP 7 em dois filmes visando mais lucro e menos sessões de cinema por dia, devido a quantidade grande de informações contidas no livro. E já que é pra dividir, criaram uma adaptação literal, segundo meu amigo e co-editor Joaquim, leitor dos livros. Sendo assim, os fãs ficarão satisfeitos ao sair da sessão.
Mas e os não-fãs, como o escritor dessa resenha? Depende do tipo de público. Com certeza os leitores de HP não gostariam do filme se ele não fosse... um HP. O tom sombrio, quieto e bem solitário do filme só funciona com os jovens que acompanharam a série desde 1998(ou 2001, no primeiro filme) por ser baseado no livro do personagem preferido dos juvenis. Praticamente um road movie com tons de fantasia e umas duas parcas sequências de ação, HP e as Relíquias da Morte Parte 1 é um passo gigantesco a franquia, se tornando algo a mais que o alegre balé de vassouras dos 3 primeiros, os dilemas dramáticos do quarto e a fantasia séria dos 2 filmes anteriores. Numa análise mais profunda, sem contar com a vindoura segunda parte, o filme poderia até ser considerado como um estudo da solidão de 3 recém-adultos, os limites deles e os dramas de suas vidas. E nesse drama o filme ganha mais pontos, afinal os personagens de HP podem até ser bem-desenvolvidos, mas são em sua maioria, arquétipos com dramas de mesma categoria.
A trama começa com a ameaça de Lord Voldemort (Ralph Fiennes) ganhando proporções épicas, forçando Harry, Ron e Hermione a tomar providências para proteger seus familiares. Com o inimigo se tornando cada vez mais forte, é preciso esconder Harry Potter, que se torna a última esperança da resistência dos bruxos para impedir o reinado de Voldemort. Com a queda do Ministério da Magia e sua posterior reestruturação pelo inimigo, a situação se complica. E os três amigos partem em busca dos únicos artefatos que podem parar de uma vez por todas esses eventos: as horcruxes.
Ressalto novamente que não li o livro, mas quem leu diz que a fidelidade foi obsessiva. Deixando isso de lado, avaliarei apenas como filme. O roteiro, pela sexta vez adaptado por Steve Kloves(depois de uma entrada mal-sucedida de Michael Goldenberg no quinto, fazendo os fãs chiar), é vitorioso em diversos pontos. Sua estrutura é completamente diferente dos anteriores e puxa mais pro lado dramático, quase se esquecendo de toda a desenfreada trocas de magias atiradas pelas varinhas. Há sim os confrontos, todos se encaixando perfeitamente na narrativa, mas eles são praticamente sufocados pelo isolamento que ocupa 75% do filme. Esse isolamento, presente no livro, se faz necessário justamente para haver o desenvolvimento aprimorado de personagens e a quantidade grande de detalhes que HP 7 oferece. Se o sexto filme apostava num ritmo fluente e drama conciso porém pouco maduro(Hermione chora por Rony, sendo que o Mal está presente no mundo da magia), a coisa se torna muito mais séria aqui. Não só tendo que se preocupar com a ameaça de Voldemort, os 3 amigos agora tem que lidar com os problemas pessoais, que acabam culminando em tocantes sacrifícios, como o feitiço de Hermione em seus pais.
Algumas sacadas do contexto daquele universo colocadas em tela também são interessantes, como a bolsa infinita de Hermione, uma inteligente saída para uma possível falta de continuidade futura, com alguns objetos podendo aparecer sem explicação em tela. Quanto ao ritmo do roteiro, Kloves foi meticuloso. Esse drama todo usado para a construção de personagem, nunca visto na série, é espetacular e torna o ritmo desse filme muito melhor que o dos outros. Essa jornada existencial é interessantíssima e parece retirada de um road movie europeu. A utilização de ambientes abertos, entupidos de natureza em sua forma selvagem, se fazem necessários também, como saída narrativa(Hermione imagina os lugares pra onde os 3 vão) e como belíssima metáfora da natureza sufocando as personalidades perdidas do trio. E se 75% do filme são nessas partes esplendidamente construídas, os outros 25% são muito bons também, mas é onde residem os típicos problemas da franquia. A memorável sequência no Ministério da Magia é organizada de forma ágil e tem cortes sucintos, com informações brotando na tela sem soar gratuitamente, porém tem os conhecidos alívios cômicos da série, um verdadeiro abismo de contraste em relação áquela solidão.
As poucas sequências de ação empolgam, sem atrapalhar as partes dramáticas e acrescentando tensão á película. Nas florestas, são sempre alguns guardas procurando o trio, o que torna tudo mais realista e natural. Há sim ás batalhas épicas, como a que abre o filme, um duelo de magias no meio da cidade, mas parece que o roteirista deixou todo o tom exageradamente épico no trailer para a Parte 2. Sendo assim, é fácil constatar que essa Parte 1 só é apreciada e vista no cinema por ser baseada no livro tão amado pelos adolescentes. Com certeza, se não houvesse a presença do bruxo ali, várias pessoas tachariam o filme de chato, modorrento e sem clímax. Não é o meu caso, que mesmo sem ser fã adorei, mas é instigante o fato de que o público a quem se destina o filme, simplesmente não gostaria isoladamente. Até mesmo os fãs estariam reclamando dessa falta de clímax e do ritmo lento se não fosse a fidelidade absurda. Mesmo sem final, sem ação e com pouco ritmo, HP 7 agrada bastante pelo drama ali colocado, mesmo que ele não seja todo esse abismo choroso.
Se o roteiro de Steve Kloves impõe ao filme um tom digno de filme indie como Valhalla Rising, a direção caprichada de David Yates entende isso e faz um trabalho seguro. Na pouca ação existente, a condução é interessante e competente, tendo destaque a já citada batalha no Ministério da Magia e o espetacular confronto na floresta, acompanhado com o mesmo filtro de câmera de Robin Hood, que auxilia a movimentação. Além disso, a sequência é registrada apenas pelo barulho dos personagens e o som abafado dos "tiros", o que traz uma elegância nova aos confrontos da saga. Nas partes dramáticas, Yates conduz normalmente, ainda que erre alguns enquadramentos e deixe de trocar o foco dos zooms. Mesmo assim, os erros são perdoáveis vistos perto da interessante saída que o diretor arrumou para as sequências de impacto: A câmera na mão. Tremida, a câmera dá um certo desconforto e surge logo que os personagens estão tendo um conflito verbal ou sentimental. É uma solução manjada em certos filmes, mas quando visto numa série com direções de aluguel e drama pouco atrativo(por ser tipicamente adolescente) nos capítulos anteriores, é de se reconhecer a inteligência do competentíssimo diretor.
A fotografia de Eduardo Serra, depois da saída do indicado ao Oscar Bruno Delbonell, é interessante, ainda que perca grandiosamente para o esverdeado clima do filme anterior. Ainda que nas sequências urbanas a fotografia não passe da média, nas sequências de natureza é linda a percepção do fotógrafo em deixar o clima mais sombrio. Uma solução inteligente e que torna o filme esteticamente belíssimo, como na sequência de neve. A trilha sonora de Alexandre Desplat mantém o nível ótimo de compositores que a série teve e cria notas grandiosas, ainda que siga o estilo fantasioso de John Williams em alguns pontos. Nas partes dramáticas, porém, a trilha se sobressai e se distancia do resto das melodias que permearam a saga. A edição de Mark Day é sucinta e auxilia bem a direção, mesmo sem se destacar.
Nas atuações, pouco a se falar, mas é notável de que Radcliffe, Emma Watson e Rupert Grint aprenderam a atuar e melhoraram as atuações animadinhas dos primeiros capítulos e os tiques dos dois episódios anteriores(Emma sempre chorosa, Grint só servindo como alívio cômico). Agora o negócio é mais sério e os atores captaram a essência do roteiro, fazendo com que os 146 minutos passem tranquilamente.
No geral, Harry Potter 7 agrada bastante e consolida os novos(e certos) rumos que a série tomou. Que a seriedade continue na Parte 2, que tem promessa de bastante ação e onde reside todos os clímaxes que faltaram a essa Parte 1. Talvez o ritmo maravilhoso desse dramático episódio desande, mas já fica a certeza de que a espera continua, mais amplificada. Um excelente filme sobretudo e um gigantesco passo rumo a maturidade absoluta da antes boba série que agora entra no panteão das melhores obras juvenis da história.
***** 5 Estrelas
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