Old School Nerds

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quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Gamer

A psicótica dupla Neveldine/Taylor trás o seu mundo para o mundo digital.

Quando Adrenalina foi lançado, em 2006, não dava pra entender o que estava acontecendo na frente dos olhos dos espectadores. A trama batida, rasa e violenta, mas com alta qualidade técnica e de roteiro de diálogos, surpreendeu a todos. Era incrível como algum diretor poderia ser capaz de trazer algo tão safado para as telas. Jason Statham era um matador durão que precisava manter a adrenalina lá em cima para não morrer. Pra isso, corre, cheira e transa no meio de uma multidão. Engrçadíssimo e honesto, foi um sucesso até mesmo para os críticos. A dupla de diretores e escritores, Mark Neveldine e Brian Taylor, não foram acolhidos da mesma forma pelo público, que deve ter achado aquilo muito maluco ou fora da realidade. Pois a Lionsgate, corajoso produtora americana independente, continuou dando dinheiro pra dupla. Depois de uma espetacular, maluca e genial sequência pra Adrenalina, Neveldine e Taylor atacam com Gamer. Desde o primeiro trailer, o filme se mostrou uma boa pedida, por mostrar uma história criativa ao extremo e violenta. E digo, com segurança, que Gamer é melhor que seu trailer.

A trama segue James Tillman(Gerard Butler), codinome Kable, um homem que está preso e condenado á morte. Por isso, ele é obrigado a entrar num jogo de simulação real, onde a violência é real. O simulador se chama Slayers e é jogado por muitas pessoas no mundo e não é o único simulador. Existe também Society, The Sims com pessoas reais. Ambos foram criados pelo gênio da computação Ken Castle(Michael C. Hall), que criou o conceito Nanex, Nano-robôs e córtex cerebral. Unindo os dois, ele consegue plugar o prisioneiro ao controle do jogador em casa. Em Slayers, o prisioneiro que obtiver 30 vitórias, será libertado. Considerando que nunca ninguém chegou ao nível 30, Kable é o melhor da história, estando no nível 27. A partir daí, ele começa a se deparar com várias pessoas e situações estranhas e bem interessantes que o fazem querer resgatar sua mulher(Amber Valleta), que está presa no Society.

Gamer é, assim como Adrenalina, curioso e competente nos quesitos técnicos. Inovadores, tudo se reinventa num filme de Neveldine e Taylor. A direção dos dois está competente e com o mesmo corte clipado de sempre, com uma agilidade monstruosa. Com takes bem planejados e cheios de identidade e estilo, a direção é corajosa ao extremo e perfeita. A edição de Fernando Villena também é precisa, auxiliando como pode a direção da dupla. Outro fator excelente é a fotografia de Ekkehart Pollack. Com tons azulados e escuros, bem metalizados, a fotografia de Pollack é esquisita e desafiadora. Esteticamente formidável e bem diferenciada por retratar uma atmosfera bem suja por natureza, pela violência, a fotografia tem o mesmo estilo psicótico da dupla. Um fator chamativo também é a trilha sonora, composta por Robb Williamson e Geoff Zanelli, é tensa e rápida, com um humor negro impregnado de ação bem interessante. Com a mesma atitude sacana de Adrenalina, a trilha sobe toda hora, descaradamente, para causar risadas e tensão no espectador. Rock pesado, música eletrônica e músicas conhecidas pelo público mais antigo são excepcionais. Uma sequência em especial que retrata a maravilha de trilha é uma cena com Kable e Castle. Enquanto a luta rola, Castle, ciente de sua maluquice, começa a cantar "I've got you, under my skin" enquanto sangue cai no chão. Sensacional. Mas, a estética impressiona principalmente pela direção de arte. Toda aquela atmosfera metálica e suja é mostrada nos cenários, no figurino e nas ruas, cada vez mais industriais.

Em atuações, não há muito o que falar de Gamer. Gerard Butler está perfeito como Kable, o Leônidas do futuro. Excessivamente durão, excessivamente macho e totalmente faixa-preta. Um adepto, da famosa porrada, perfeito. Limitado ao que o papel oferece, Butler cumpre seu papel, muito menos denso dramaticamente do que o já raso sentimentalmente Leônidas. Amber Valleta aparece pouco, então não acrescenta muito. No papel de mãe dramaticamente ferrada, ela desempenha bem. Ludacris e Alison Lohman também aparecem pouco. Ludacris faz a mesma atuação de sempre, sendo um cool que sabe atuar normal. Alison atua muito bem, demonstrando sua habitual competência, mesmo com tão pouco tempo na tela. Logan Lerman, no papel do jogador que comanda Kable, também está muito bem, um perfeito anti-herói recém-adulto. Mas, o destaque do elenco, o único personagem com alguma profundidade para poder ser analisado a fundo, é Michael C. Hall. Seu Ken Castle tem uma atitude blasé, despreocupada e cool sem limites. Michael faz uma cara de maluco sensacional e isso contribui pro personagem. Na já citada cena de luta, a cena em que Michael dança e canta é brilhantemente cafona e divertida. Incrível também como tudo casa com a situação que o filme se encontrava no momento. Esplêndido, C. Hall se destaca como nunca antes, talvez até mais que Dexter.

O roteiro da dupla Neveldine/Taylor dispensa qualquer compromisso com a realidade. Tudo em seu universo é caricato e, mesmo assim, possui uma qualidade incrível. É impressionante como um filme de ação e ficção pode se assumir como um passatempo artístico vagabundo e descarado como Gamer. A violência da dupla está figurada ao extremo aqui, sendo o filme com mais voo de membros e sangue da dupla. Mutilações de pernas estão mais presentes que diálogos dramáticos aqui. A censura R está justificada. Como se esperava, as situações continuam inverossímeis e estilosas, mas dessa vez se percebe um pouco mais de maturidade no texto de Neveldine/Taylor. Isso poderia ser ruim, pois a graça do mundo retratado até hoje pela dupla era sua irrealidade, mas incrivelmente ajuda a trama. O desenvolvimento maior de diálogos, câmeras mais quietas e um surto mental menor que Adrenalina, sem dúvida. Acredito que, para projetos futuros, essa maturidade seja contida, pois pode prejudicar a carreira impecável da dupla. O segredo dela até hoje foi não se levar a sério e, por isso, se figura como uma das mais promissoras e brilhantes da história.

Safado, tenso, emocionante, engraçado e violento, Gamer poderá divertir alguém que quer apenas uma distração semanal ou para um crítico que sabe reconhecer quando um filme de ação não se leva á sério. Sendo louvável essa atitude, torço para a dupla continuar essa sua linha de filmes malucos e cheios de estilo. Apesar de ter erros, como o habitual excesso de ação, o filme perde muito pouco com isso. Não dá para dar nota máxima a um filme com tal desenvolvimento de roteiro estrutural, mas seu roteiro é tão bom que poderá ofuscar todos os erros visíveis. Poucos erros, esses. Em seu terceiro filme, a dupla já está criando identidade própria. O último que fez isso foi Tarantino e viram no que deu. Neveldine/Taylor, uma dupla a se observar e admirar. Que seu espírito continue assim para sempre e que nunca se rendam aos caprichos de qualquer estúdio. Produtores acham que Hollywood é coisa séria. A dupla zomba disso com seu competente cinema. Resumindo: Ela é tudo o que Michael Bay e Roland Emmerich deveriam ser.

**** 4 Estrelas

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