Piratas do Caribe 4
A série de sucesso da Disney, que teve em seus dois capítulos anteriores, somando-os, uma arrecadação de 2 Bilhões vêm de volta, dessa vez tendo um livro de base: On the Strangers Tide. E a curiosa estratégia dos roteiristas de basearem um filme num material previamente existente é interessante, ao ponto que a partir daqui, novos capítulos podem ser realizados. O trailer aponta justamente tudo o que se espera da série: Diversão, fantasia, batalhas e Johnny Depp salvando o filme com seu Jack Sparrow. Dessa vez, apenas ele e Geoffrey Rush voltam dos filmes anteriores, provando a busca de novos horizontes que a franquia almeja. Um bom lançamento para quem gostou dos anteriores. Para os não-fãs da série, como eu, apenas um blockbuster corriqueiro de verão, com a dose certa de diversão.
*** 3 Estrelas
Rango
O novo filme de Gore Verbinski - que deixou a direção de Piratas 4 justamente por esse Rango - apresenta um interessantíssimo trailer, com um personagem com muito potencial de ser um dos mais carismáticos do ano. O lagarto Rango, dublado pelo neurótico Johnny Depp, é introduzido de forma brilhante nesse trailer vitorioso. O uso pontual da trilha sonora, as cenas bem editadas e um clima bem-humorado e inteligente contrasta totalmente as animações de ação atuais, com seus trailers ágeis e com trilha altíssima. Uma pequena obra a ser vista, com seu humor inocente e sua trama competente e interessante. Teoricamente um faroeste cômico de animação, Rango promete.
***** 5 Estrelas
Pânico 4
O trailer do novo filme da antologia, dirigida pelo esquecido Wes Craven, joga com todos os elementos que fizeram a série famosa, numa trama que resgata a metalinguagem cômica do filme original. Fora isso, o filme é atualizado por mostrar, novamente na metalinguagem, que os fãs dos filmes de terror estão vascinados já. É hora de revolucionar o gênero do terror, pensa o jovem diretor do filme dentro do filme. Assim como o jovem, Craven tentará de todas as formas colocar a franquia nos trilhos e, principalmente, apresentá-la ao novo público que o conhece pelo imbecil A Sétima Alma, e não por clássicos como A Hora do Pesadelo. Resta esperar pela estreia.
*** 3 Estrelas
Mother's Day
O idiotizante trailer do novo filme do "diretor" Darren Lynn Bousman, de filmes como Repo! The Genetic Opera e Jogos Mortais 2 e 3, apresenta o remake do trash da Troma, lançado em 1980. A trama, que pouco tem a ver com o tom exploitation do original, conta a história de uma mãe que, após ser desapropriada, ajuda a soltar os 2 filhos delinquentes para eles aterrorizarem os novos moradores da casa. A trilha sonora retardada e de tons excessivamente cafonas só atrapalham a visualização do mal-montado trailer, que só dá sinais de ser a bomba do ano, ao tentar ser sério numa trama tão implausível(e remake de um trash!). Rebbeca de Mornay faz a mãe, demonstrando estar no fundo do poço. Lynn Bousman promete aqui atestar, mais uma vez, sua falta de talento. Evite.
* 1 Estrela
The Mechanic
O remake do filme com Charles Bronson é desta vez estrelado pelo lutador-ator mais cool do cinema atual, Jason Statham. A rasa trama conta a história de uma assassino que precisa ensinar as funções de "mecânico" para um aprendiz(Ben Foster). O descompromisso e a presença constante de sangue no trailer tornam esse filme um bom candidato a guilty-pleasure do ano. As câmeras super-lentas em imagens plásticas, como a Barrett .50 disparando, auxiliam bastante também. Uma real possibilidade para Simon West de fazer seu primeiro filme decente, após experiências esquecíveis como Tomb Raider e ridicularidades como Quando um Estranho Chama. Vale a pena, pela ação e o carisma de Statham.
*** 3 Estrelas
Cedar Rapids
O filme com a revelação de Se Beber Não Case!, Ed Helms, demonstra ser uma competente comédia, com um humor refinado e algumas referências divertidíssimas, explorando a imagem de looser construído para Helms. Fora isso, a distribuição da Fox Searchlight, divisão de arte da Fox, faz com que as esperanças crescam pra cima desse curioso filme. Um trailer inspirado sobre a história de um homem com poucas ambições, que vê em poucas coisas da vida, como num carro alugado, a alegria e sinal de status. Somando isso ao timing cômico perfeito de John C. Reilly, temos em Cedar Rapids uma das comédias mais promissoras do ano.
**** 4 Estrelas
Fornecendo críticas há 2 anos, o OSN é uma colaboração de Gabriel Papaléo e Joaquim Pedro, onde o Cinema é o assunto principal a ser analisado, debatido e admirado.
Old School Nerds
segunda-feira, 31 de janeiro de 2011
sexta-feira, 28 de janeiro de 2011
Amor e Outras Drogas
Roteiro quase sabota filme de atuações e temáticas interessantes .
Filmes de comédia romântica em geral têm fases na indústria cinematográfica . Há épocas em que as mocinhas são as encalhadas , épocas nas quais casais interagem em filmes de ação . Talvez uma fase da safra atual seja a do sexo sem muito comprometimento . O filmes No Strings Attached - traduzido no Brasil justamente como '' Sexo Sem Compromisso'' - ainda não estreou , mas já possui na sua sinopse essa temática de um casal que só quer se relacionar pelo sexo, não estando dispostos a ter um relacionamento propriamente dito , e se livrar das amarras e frustrações que um namoro de verdade pode ocasionar . Invariavelmente , os dois se apaixonam, e precisam lidar com isso .
Amor e Outras Drogas é um exemplo desse tipo de filme . Mas não se foca nessa temática, como o filme de Natalie Portman e Ashton Kutcher deve vir a fazer. Existe a exploração , vista já no seu título , com a indústria farmacêutica em geral, tomada de uma perspectiva mais cômica , e também de um drama relacionado a doença - no caso , a doença de Parkinson . Essas temáticas múltiplas , que acabam tendo até uma unidade , ao final, não são problema algum , ao contrário . O problema do novo filme de Edward Zwick é o seu script fortemente esquemático , previsível em cada detalhe, e que , devido a isso , não consegue fugir do clichê .
A história do filme começa do ponto de vista do vendedor de eltro-eletrônicos Jamie Randall (Jake Gyllenhaal) que se empregou na loja para contrariar o pai, que queria que ele seguisse a carreira de médico . Devido ao seu estilo completamente mulherengo , ele acaba sendo despedido, e na busca por um novo emprego , adentra nas fileiras dos representantes da indústria farmacêutica, mais exatamente na gigante Pfizer . Um dia, acompanhando um médico, ele conhece uma paciente, chamada Maggie Montgomery( Anne Hathaway) . Depois de chama-la para sair , eles constroem um acordo de apenas se encontrar para transar , sem nenhum compromisso . Lógico que eles acabam se envolvendo mais que isso, e têm que lidar com o amor e também com o mal de Parkinson de Maggie, que já tem a doença degenerativa com apenas 26 anos .
A introdução do filme é bem construída para mostrar alguns pormenores que o público não conhece das gigantes empresas farmacêuticas . Os métodos pouco ortodoxos que os vendedores bolam para passar as amostras do seu produto e não as amostras do concorrente , a chatice que os representantes proporcionam perseguindo os médicos , etc . Claro que isso é tudo alegoria e serve apenas de tempero para a história do casal protagonista . Mas são alegorias até interessantes e que produzem bons momentos - a descoberta do Viagra e a verdadeira revolução que o produto gerou é um ponto alto , afinal , o personagem de Gyllenhaal é uma verdadeira pílula azul ambulante , e combina como vendedor bonachão .
O núcleo da história que interessa - o romance entre Jamie e Maggie - era previsível desde o trailer , mas até aí , não temos um erro . O clichê por si só não é um deslize imperdoável, e alguns filmes simplesmente não conseguem fugir dele , mas , por possuírem uma execução bem fundamentada , conseguem agradar . O problema começa quando vemos na nossa frente a esquematização do roteiro . Uma coisa é você ter noção de qual vai ser o final de um filme, mas ter prazer em ver informações novas até lá , a outra é você saber exatamente qual arco está sendo apresentado no momento, e ter já conhecimento das curvas que a trama vai fazer até os créditos finais . Exemplos disso : Tron Legacy e Avatar , respectivamente . E fica complicado não comentar da esquematização escancarada de Amor e Outras Drogas , quando , em um momento, temos quase um vilão -imbecil - no filme . Fora isso, os 4 arcos clássicos dos filmes românticos são respeitados â risca , e temos, vejam só , uma quase ''cena de aeroporto '' . Aí fica difícil .
De inovador, porém ,podemos indicar a o arco da doença de Maggie - que é pelo menos ''incomum'' em filmes do gênero em geral - e a própria temática farmacêutica em si . Essas ''alegorias '' acabam por fazer sentido juntas, numa unidade , afinal . Mas o que mais pode se aproveitar em Amor e Outras Drogas são as atuações de Jake Gyllenhaal e Anne Hathaway . Os personagens são acima da média - principalmente a personagem de Hathaway - e as interpretações dos protagonistas são definitivamente superiores ás que podemos encontrar em filmes similares . E o melhor é que eles combinam , existe uma química interessante que deixa as cenas da dupla mais orgânicas, e talvez isso seja mérito também do diretor Edward Zwick . Apesar de aqui ele não mostrar muitos arroubos no manuseio das câmeras - faz o feijão com arroz com qualidade mínima necessária - ele tem competência suficiente para deixar os dois atores muito à vontade e extrair deles atuações muito eficientes .
O que é duro de engolir mesmo é a esquematização extrema do roteiro . Isso passa com dificuldade pela garganta , mas a perfomance de Jake Gyllenhaal e Anne Hathaway são a bebida que ajuda a descer. O desfecho piegas dá uma sensação desgostosa, assim como todo o chavão presente do filme também faz . Mas, sendo um produto inofensivo , não é preciso fazer nenhuma propaganda contra - mas também não farei a favor .
3 Estrelas *** - Aceitável
Filmes de comédia romântica em geral têm fases na indústria cinematográfica . Há épocas em que as mocinhas são as encalhadas , épocas nas quais casais interagem em filmes de ação . Talvez uma fase da safra atual seja a do sexo sem muito comprometimento . O filmes No Strings Attached - traduzido no Brasil justamente como '' Sexo Sem Compromisso'' - ainda não estreou , mas já possui na sua sinopse essa temática de um casal que só quer se relacionar pelo sexo, não estando dispostos a ter um relacionamento propriamente dito , e se livrar das amarras e frustrações que um namoro de verdade pode ocasionar . Invariavelmente , os dois se apaixonam, e precisam lidar com isso .
Amor e Outras Drogas é um exemplo desse tipo de filme . Mas não se foca nessa temática, como o filme de Natalie Portman e Ashton Kutcher deve vir a fazer. Existe a exploração , vista já no seu título , com a indústria farmacêutica em geral, tomada de uma perspectiva mais cômica , e também de um drama relacionado a doença - no caso , a doença de Parkinson . Essas temáticas múltiplas , que acabam tendo até uma unidade , ao final, não são problema algum , ao contrário . O problema do novo filme de Edward Zwick é o seu script fortemente esquemático , previsível em cada detalhe, e que , devido a isso , não consegue fugir do clichê .
A história do filme começa do ponto de vista do vendedor de eltro-eletrônicos Jamie Randall (Jake Gyllenhaal) que se empregou na loja para contrariar o pai, que queria que ele seguisse a carreira de médico . Devido ao seu estilo completamente mulherengo , ele acaba sendo despedido, e na busca por um novo emprego , adentra nas fileiras dos representantes da indústria farmacêutica, mais exatamente na gigante Pfizer . Um dia, acompanhando um médico, ele conhece uma paciente, chamada Maggie Montgomery( Anne Hathaway) . Depois de chama-la para sair , eles constroem um acordo de apenas se encontrar para transar , sem nenhum compromisso . Lógico que eles acabam se envolvendo mais que isso, e têm que lidar com o amor e também com o mal de Parkinson de Maggie, que já tem a doença degenerativa com apenas 26 anos .
A introdução do filme é bem construída para mostrar alguns pormenores que o público não conhece das gigantes empresas farmacêuticas . Os métodos pouco ortodoxos que os vendedores bolam para passar as amostras do seu produto e não as amostras do concorrente , a chatice que os representantes proporcionam perseguindo os médicos , etc . Claro que isso é tudo alegoria e serve apenas de tempero para a história do casal protagonista . Mas são alegorias até interessantes e que produzem bons momentos - a descoberta do Viagra e a verdadeira revolução que o produto gerou é um ponto alto , afinal , o personagem de Gyllenhaal é uma verdadeira pílula azul ambulante , e combina como vendedor bonachão .
O núcleo da história que interessa - o romance entre Jamie e Maggie - era previsível desde o trailer , mas até aí , não temos um erro . O clichê por si só não é um deslize imperdoável, e alguns filmes simplesmente não conseguem fugir dele , mas , por possuírem uma execução bem fundamentada , conseguem agradar . O problema começa quando vemos na nossa frente a esquematização do roteiro . Uma coisa é você ter noção de qual vai ser o final de um filme, mas ter prazer em ver informações novas até lá , a outra é você saber exatamente qual arco está sendo apresentado no momento, e ter já conhecimento das curvas que a trama vai fazer até os créditos finais . Exemplos disso : Tron Legacy e Avatar , respectivamente . E fica complicado não comentar da esquematização escancarada de Amor e Outras Drogas , quando , em um momento, temos quase um vilão -imbecil - no filme . Fora isso, os 4 arcos clássicos dos filmes românticos são respeitados â risca , e temos, vejam só , uma quase ''cena de aeroporto '' . Aí fica difícil .
De inovador, porém ,podemos indicar a o arco da doença de Maggie - que é pelo menos ''incomum'' em filmes do gênero em geral - e a própria temática farmacêutica em si . Essas ''alegorias '' acabam por fazer sentido juntas, numa unidade , afinal . Mas o que mais pode se aproveitar em Amor e Outras Drogas são as atuações de Jake Gyllenhaal e Anne Hathaway . Os personagens são acima da média - principalmente a personagem de Hathaway - e as interpretações dos protagonistas são definitivamente superiores ás que podemos encontrar em filmes similares . E o melhor é que eles combinam , existe uma química interessante que deixa as cenas da dupla mais orgânicas, e talvez isso seja mérito também do diretor Edward Zwick . Apesar de aqui ele não mostrar muitos arroubos no manuseio das câmeras - faz o feijão com arroz com qualidade mínima necessária - ele tem competência suficiente para deixar os dois atores muito à vontade e extrair deles atuações muito eficientes .
O que é duro de engolir mesmo é a esquematização extrema do roteiro . Isso passa com dificuldade pela garganta , mas a perfomance de Jake Gyllenhaal e Anne Hathaway são a bebida que ajuda a descer. O desfecho piegas dá uma sensação desgostosa, assim como todo o chavão presente do filme também faz . Mas, sendo um produto inofensivo , não é preciso fazer nenhuma propaganda contra - mas também não farei a favor .
3 Estrelas *** - Aceitável
terça-feira, 25 de janeiro de 2011
Biutiful
Iñarritu e sua sátira dramática involuntária.
Não é necessário acompanhar a carreira de Alejandro González Iñarritu a fundo para saber que o diretor mexicano tem como sua identidade os pesados arcos dramáticos. O diretor de Amores Brutos, 21 Gramas e Babel cruzava as tramas de forma com que sua narrativa ficasse pesada a ponto de fazer o público querer um descanso breve. E se sua dramaticidade era tão carregada, não era apenas devido a sua direção. O roteirista Guillermo Arriaga, autor dos 3 projetos do diretor, era o grande responsável por toda a desgraceira que Iñarritu gosta tanto de filmar. Porém, após a briga dos dois, Arriaga foi naufragar na sua estreia na direção, The Burning Plan. Agora, era a vez de Iñarritu provar seu valor por si só, sem a ajuda do célebre autor, responsável também pelo roteiro do intrigante Três Enterros.
E quando se percebe a trama de Biutiful, o novo projeto do cineasta, sente-se um quê de metalinguagem, uma tentativa cinematográfica de desprendimento a seus trabalhos anteriores. Se Arriaga criava tramas que causavam desconforto ao espectador, Iñarritu cria uma história de segundas chances. Uxbal é um homem que ganha a vida em Barcelona explorando imigrantes de diversas etnias. Dos chineses fabricantes de bolsas aos africanos camelôs vendedores delas, Uxbal ganha dinheiro por essa rede sem ser um cara sem escrúpulos, sendo mais uma vítima da luta pela sobrevivência. A realidade muda quando ele, que possui um dom de se comunicar com os mortos, descobre ter câncer. Então, começa a luta para o amargurado homem começar a ver beleza naquela vida suja.
Essa iniciativa de Iñarritu, buscando identidade própria ao tentar ver beleza no mundo cão de Arriaga, é uma interessante provocação ao seu antes parceiro e uma busca por novos horizontes. Ainda que anteriormente testada(o cinema já ensinou umas 100 vezes que todo homem terminal tem que ver beleza na vida antes de morrer), a trama poderia ser executada de maneira correta e, nesse ambicioso contexto, soaria algo até inovador. Mas se não havia melhor pessoa pra executar as tragédias sem fim de Babel e 21 Gramas, Iñarritu prova que não há pessoa pior pra mostrar beleza no mundo que ele.
O pessimismo e cinismo são pontos de partida para exemplares obras-primas, como Beleza Americana e Foi Apenas um Sonho(não por acaso, os dois de Sam Mendes), e até mesmo o mexicano havia provado saber bem explorar o melodrama moderno. Porém, Iñarritu compõe uma trama que simplesmente não tem sentido de existir em seu contexto de mundo justamente por ser imparcial em sua visão de narrador. Como as tramas paralelas anteriores foram embora, um único personagem é a vítima do mundo cão e a antes equilibrada balança trágica de Arriaga soa uma involuntária comédia de erros. Apresentando o filme de uma forma suja desde o início, quando os bonitos alpes italianos são retratados de maneira opaca e cinzenta, Iñarritu pesa mais ainda a mão quando introduz a Barcelona de sua história, um ninho sujo e horrível que aqui representa a metonímia da desgraça mundial pro diretor. Não por acaso, Arriaga explorava esse recurso de forma muito mais hábil em Babel, onde a tragédia acontecia nos diversos pólos do mundo justamente pra não soar forçada. Em Biutiful, porém, Barcelona não pode ter apenas camelôs, imigrantes ilegais e policiais corruptos. Tem que ter também um mendingo com um insistente pombo em cima dele e ainda ter prédios com fachadas destroçadas.
Logo, desde a ambientação da trama, somos apresentados ao mundo que Iñarritu parece tanto gostar. Auxiliado pela incisiva trilha de Gustavo Santaolalla, potencializando as emoções do espectador, Iñarritu ainda se apoia na sórdida fotografia de Rodrigo Prieto para mostrar tudo nos mínimos detalhes. Sem deixar de soar expositivo por um segundo sequer, o diretor ainda mostra a casa de Uxbal como um lugar inabitável, com piso desleixado e infiltrações diversas nas paredes. Além disso, desenvolvimento de personagens parece não ser o forte do roteiro de Armando Bo, Nicolás Giacobone e do próprio Iñarritu. Ainda que mostre Uxbal como um ser bem humano e tridimensional, os coadjuvantes são meros fantoches do mundo do diretor. Esquecendo a potencial sutileza de ser narrador-observador, o que tornaria a sua visão imparcial, no mínimo, justificável, Iñarritu interfere nas possíveis ambições e emoções de seus personagens só pra explicar pela milésima vez que ele acha o mundo um caso perdido.
Fora isso, Iñarritu ainda subestima todos os coadjuvantes e, não satisfeito, subestima sua própria equipe. Quando o filho de Uxbal chuta a mesa, o barulho é ouvido apenas pela excelente mixagem de som. Porém, Iñarritu ainda tem que fazer um take de baixo pra cima, pra reforçar que o garoto está chutando a mesa. Ainda que competente como diretor, com ângulos que contemplam seus atores com firmeza, o cineasta usa sua câmera de maneira incorreta em diversas cenas. Pra acabar de vez com qualquer possibilidade de identificação mínima com seus coadjuvantes-fantoches, o mexicano ainda evidencia sempre a presença do dinheiro em cena como algo mediador e solucionador dos problemas do filme. Um exemplo claro disso envolve a mulher de um africano, amiga de Uxbal. Iñarritu não deixa ela simplesmente se envolver emocionalmente com o sofrido protagonista ou até mesmo aceitar um dinheiro(olhe ele aí de novo) como fator de troca. Ele ainda tem que fazer a mulher pensar em fugir com o dinheiro sem cumprir o acordo. É tão forçado que consolida a idiotizante comédia de erros involuntária de Iñarritu. Talvez aí Biutiful tenha sua maior diferença á qualidade dos filmes anteriores do diretor. Aqui, Iñarritu se aproxima, sem intenção, do excelente e consciente de si, Um Homem Sério.
Impedindo qualquer chance de redenção de uma trama que simplesmente NECESSITAVA de redenção, Biutiful termina sem unidade ou propósito. Uxbal, vivido de forma esplendorosa e digna de prêmios por Javier Bardem, até tenta ver a tal beleza do título do filme, mas o diretor simplesmente não deixa. O coitado compra aquecedores para as famílias humildes e Iñarritu tem que fazer o gás vazar. É tão absurdo que o diretor simplesmente negue a fazer o que se propôs que chegam a ser engraçadas cenas como essa que citarei. A barbeiragem do diretor fica evidente ao cortar de Uxbal quase num sonho para uma imagem de conforto pessoal, o mar. Pois lá o diretor coloca os corpos, talvez ilustrando o pesar de consciência do protagonista. Porém, quando a cena se demonstra ser real, chega a ser hilário a incompetência do diretor nessa cena, que se parece com a batida de Sy Ableman, no já citado Um Homem Sério. Se os Coen utilizaram esse recurso de forma inteligente, Iñarritu simplesmente se chama de imbecil ao realizá-lo.
Biutiful assim termina, imperfeito, vítima de suas próprias ambições. Alejandro González Iñarritu prova que não mudou sua visão de mundo e que necessita de algum roteirista realmente competente pra retratar esse mundo cão que tanto adora, de forma competente. Exagerando tudo o que se coloca em tela em prol da desgraça, chega a ser emblemática a cena em que Uxbal está deitado na cama, enfermo. A sua amiga abre a janela, para a luz entrar. Talvez ali, quando a divina luz entra, Uxbal tivesse sua tão sonhada beleza e plenitude antes da morte. Mas, do nada, a janela fecha e é preciso que a amiga volte pra abri-la novamente. É engraçado pensar que o fantasminha de Iñarritu simplesmente tenha aparecido e fechado a janela, só por sadismo exarcebado. Não por acaso, Uxbal só alcança a plenitude naquela cena dos alpes, que abre e fecha o filme. Iñarritu se identifica tanto com o sadismo que realiza uma desgraça atrás da outra só para, no final, mostrar novamente o início. Filme desnecessário é pouco. Uma tremenda sátira á tragédia, de mal gosto e involuntária.
** 2 Estrelas
Não é necessário acompanhar a carreira de Alejandro González Iñarritu a fundo para saber que o diretor mexicano tem como sua identidade os pesados arcos dramáticos. O diretor de Amores Brutos, 21 Gramas e Babel cruzava as tramas de forma com que sua narrativa ficasse pesada a ponto de fazer o público querer um descanso breve. E se sua dramaticidade era tão carregada, não era apenas devido a sua direção. O roteirista Guillermo Arriaga, autor dos 3 projetos do diretor, era o grande responsável por toda a desgraceira que Iñarritu gosta tanto de filmar. Porém, após a briga dos dois, Arriaga foi naufragar na sua estreia na direção, The Burning Plan. Agora, era a vez de Iñarritu provar seu valor por si só, sem a ajuda do célebre autor, responsável também pelo roteiro do intrigante Três Enterros.
E quando se percebe a trama de Biutiful, o novo projeto do cineasta, sente-se um quê de metalinguagem, uma tentativa cinematográfica de desprendimento a seus trabalhos anteriores. Se Arriaga criava tramas que causavam desconforto ao espectador, Iñarritu cria uma história de segundas chances. Uxbal é um homem que ganha a vida em Barcelona explorando imigrantes de diversas etnias. Dos chineses fabricantes de bolsas aos africanos camelôs vendedores delas, Uxbal ganha dinheiro por essa rede sem ser um cara sem escrúpulos, sendo mais uma vítima da luta pela sobrevivência. A realidade muda quando ele, que possui um dom de se comunicar com os mortos, descobre ter câncer. Então, começa a luta para o amargurado homem começar a ver beleza naquela vida suja.
Essa iniciativa de Iñarritu, buscando identidade própria ao tentar ver beleza no mundo cão de Arriaga, é uma interessante provocação ao seu antes parceiro e uma busca por novos horizontes. Ainda que anteriormente testada(o cinema já ensinou umas 100 vezes que todo homem terminal tem que ver beleza na vida antes de morrer), a trama poderia ser executada de maneira correta e, nesse ambicioso contexto, soaria algo até inovador. Mas se não havia melhor pessoa pra executar as tragédias sem fim de Babel e 21 Gramas, Iñarritu prova que não há pessoa pior pra mostrar beleza no mundo que ele.
O pessimismo e cinismo são pontos de partida para exemplares obras-primas, como Beleza Americana e Foi Apenas um Sonho(não por acaso, os dois de Sam Mendes), e até mesmo o mexicano havia provado saber bem explorar o melodrama moderno. Porém, Iñarritu compõe uma trama que simplesmente não tem sentido de existir em seu contexto de mundo justamente por ser imparcial em sua visão de narrador. Como as tramas paralelas anteriores foram embora, um único personagem é a vítima do mundo cão e a antes equilibrada balança trágica de Arriaga soa uma involuntária comédia de erros. Apresentando o filme de uma forma suja desde o início, quando os bonitos alpes italianos são retratados de maneira opaca e cinzenta, Iñarritu pesa mais ainda a mão quando introduz a Barcelona de sua história, um ninho sujo e horrível que aqui representa a metonímia da desgraça mundial pro diretor. Não por acaso, Arriaga explorava esse recurso de forma muito mais hábil em Babel, onde a tragédia acontecia nos diversos pólos do mundo justamente pra não soar forçada. Em Biutiful, porém, Barcelona não pode ter apenas camelôs, imigrantes ilegais e policiais corruptos. Tem que ter também um mendingo com um insistente pombo em cima dele e ainda ter prédios com fachadas destroçadas.
Logo, desde a ambientação da trama, somos apresentados ao mundo que Iñarritu parece tanto gostar. Auxiliado pela incisiva trilha de Gustavo Santaolalla, potencializando as emoções do espectador, Iñarritu ainda se apoia na sórdida fotografia de Rodrigo Prieto para mostrar tudo nos mínimos detalhes. Sem deixar de soar expositivo por um segundo sequer, o diretor ainda mostra a casa de Uxbal como um lugar inabitável, com piso desleixado e infiltrações diversas nas paredes. Além disso, desenvolvimento de personagens parece não ser o forte do roteiro de Armando Bo, Nicolás Giacobone e do próprio Iñarritu. Ainda que mostre Uxbal como um ser bem humano e tridimensional, os coadjuvantes são meros fantoches do mundo do diretor. Esquecendo a potencial sutileza de ser narrador-observador, o que tornaria a sua visão imparcial, no mínimo, justificável, Iñarritu interfere nas possíveis ambições e emoções de seus personagens só pra explicar pela milésima vez que ele acha o mundo um caso perdido.
Fora isso, Iñarritu ainda subestima todos os coadjuvantes e, não satisfeito, subestima sua própria equipe. Quando o filho de Uxbal chuta a mesa, o barulho é ouvido apenas pela excelente mixagem de som. Porém, Iñarritu ainda tem que fazer um take de baixo pra cima, pra reforçar que o garoto está chutando a mesa. Ainda que competente como diretor, com ângulos que contemplam seus atores com firmeza, o cineasta usa sua câmera de maneira incorreta em diversas cenas. Pra acabar de vez com qualquer possibilidade de identificação mínima com seus coadjuvantes-fantoches, o mexicano ainda evidencia sempre a presença do dinheiro em cena como algo mediador e solucionador dos problemas do filme. Um exemplo claro disso envolve a mulher de um africano, amiga de Uxbal. Iñarritu não deixa ela simplesmente se envolver emocionalmente com o sofrido protagonista ou até mesmo aceitar um dinheiro(olhe ele aí de novo) como fator de troca. Ele ainda tem que fazer a mulher pensar em fugir com o dinheiro sem cumprir o acordo. É tão forçado que consolida a idiotizante comédia de erros involuntária de Iñarritu. Talvez aí Biutiful tenha sua maior diferença á qualidade dos filmes anteriores do diretor. Aqui, Iñarritu se aproxima, sem intenção, do excelente e consciente de si, Um Homem Sério.
Impedindo qualquer chance de redenção de uma trama que simplesmente NECESSITAVA de redenção, Biutiful termina sem unidade ou propósito. Uxbal, vivido de forma esplendorosa e digna de prêmios por Javier Bardem, até tenta ver a tal beleza do título do filme, mas o diretor simplesmente não deixa. O coitado compra aquecedores para as famílias humildes e Iñarritu tem que fazer o gás vazar. É tão absurdo que o diretor simplesmente negue a fazer o que se propôs que chegam a ser engraçadas cenas como essa que citarei. A barbeiragem do diretor fica evidente ao cortar de Uxbal quase num sonho para uma imagem de conforto pessoal, o mar. Pois lá o diretor coloca os corpos, talvez ilustrando o pesar de consciência do protagonista. Porém, quando a cena se demonstra ser real, chega a ser hilário a incompetência do diretor nessa cena, que se parece com a batida de Sy Ableman, no já citado Um Homem Sério. Se os Coen utilizaram esse recurso de forma inteligente, Iñarritu simplesmente se chama de imbecil ao realizá-lo.
Biutiful assim termina, imperfeito, vítima de suas próprias ambições. Alejandro González Iñarritu prova que não mudou sua visão de mundo e que necessita de algum roteirista realmente competente pra retratar esse mundo cão que tanto adora, de forma competente. Exagerando tudo o que se coloca em tela em prol da desgraça, chega a ser emblemática a cena em que Uxbal está deitado na cama, enfermo. A sua amiga abre a janela, para a luz entrar. Talvez ali, quando a divina luz entra, Uxbal tivesse sua tão sonhada beleza e plenitude antes da morte. Mas, do nada, a janela fecha e é preciso que a amiga volte pra abri-la novamente. É engraçado pensar que o fantasminha de Iñarritu simplesmente tenha aparecido e fechado a janela, só por sadismo exarcebado. Não por acaso, Uxbal só alcança a plenitude naquela cena dos alpes, que abre e fecha o filme. Iñarritu se identifica tanto com o sadismo que realiza uma desgraça atrás da outra só para, no final, mostrar novamente o início. Filme desnecessário é pouco. Uma tremenda sátira á tragédia, de mal gosto e involuntária.
** 2 Estrelas
segunda-feira, 24 de janeiro de 2011
O Turista
Diretor quadrado e roteiro vazio empalidecem produto descartável.
No último ano ficou claro a proposta hollywoodiana de faturar alto com blockbusters que misturam gêneros e agrupam grandes estrelas cinematográficas . James Mangold optou por um produto de entretenimento de fácil aceitação pelo público e nada ofensivo á critica - um retorno louvável de Tom Cruise, num roteiro simples, mas bem amarrado e desenvolvido, sendo muito bem capturado pela câmera contemplativa do diretor, que deixou seus astros bem á vontade para realizar um bom filme . Na contramão da honestidade bem executada de Encontro Explosivo , também foi cometido o deslize máximo de Robert Luketic, o pastiche enjoativo e cheio de erros Par Perfeito , que tentava - veja bem , tentava - usar uma química inexistente entre Ashton Kutcher e Katherine Heigl , para faturar alto mesclando comédia romântica com um filme de espionagem .
É o trabalho de Hollywood, afinal, tentar juntar gêneros para atrair o máximo de público possível . Nesse quesito, O Turista - remake do filme francês chamado Anthony Zimmer - já começa com larga vantagem . Juntar Johnny Depp, o queridinho de Hollywood , cotado para 11 entre 10 projetos da casa , e a musa Angelina Jolie , é a segurança mínima para pagar os 1oo milhões do orçamento . Ambientado 90 por cento de sua duração na bela cidade de Veneza , poderíamos apostar nossas fichas que o diretor do filme vencedor do Oscar - A Vida dos Outros - Florian Henckel Von Donnersmarck faria uma bela homenagem ao gênero de espionagem ao melhor estilo europeu . Contudo, essa afirmativa fica apenas nas intenções. O Turista é uma armadilha não só para o personagem de Depp - mas para todo o público .
A trama começa se baseando na esposa de um fugitivo da Interpol ( Angelina Jolie ) que é vigiada pela polícia 24 horas por dia onde quer que vá . Para tentar despistar o paradeiro do marido , ela recebe a missão de encontrar um outro homem , que se faça passar pelo parceiro ( que passou por uma cirurgia plástica) e o escolhido é o pacato professor de matemática Frank Dupello ( Johnny Depp). Claro que nada sai da forma planejada, e os dois acabam entrando em perigo nas paisagens venesianas.
Logo de cara, o roteiro de O Turista já começa com alguns leves deslizes . Toda a vigília em cima da personagem de Jolie é deveras expositiva , e mesmo que ela já soubesse que estava sendo vigiada - o que de fato sabia - não deixa o filme de ter, além destes momentos, uma espionagem conceitual um tanto escancarada, para um thriller do gênero . Esse, entretanto, é um dos erros mais ínfimos do longa de Von Donnesmarck . O script do filme tem muito mais defeitos - tanto de falta de respeito com o espectador, quanto de simples desleixo, e falta de aprimoramento ou acabamento . Note , ora, como a narrativa é extremamente vazia . Não há diferenciais explícitos , e muito menos implícitos, em O Turista . Perseguições comuns - e filmadas com pouco caso - não empolgam e dão a impressão enfadonha de alguém caminhando numa esteira : anda , anda, e não sai do lugar . Pode até sair do lugar , mudando de cenários, mas na mente de quem assiste, o filme parece continuar sem graça, e passa quase desapercebido pela tela .
Uma solução para isso seria tentar preencher de conteúdo nos locais que davam - e construção de personagens seria uma saída adequada . E , mesmo com uma atuação competente porém inibida de Johnny Depp - de Jolie só dá pra falar que ela se esforça como pode , principalmente pra imitar o sotaque inglês - não há nada que recheie suas personas com uma vitalidade . Von Donnesmarck sangra os closes o máximo tolerável ,e mesmo assim, a densidade dos personagens é diminuta , rasa como um pires . Não há vilões - aliás , o vilão do filme é bem esdrúxulo - ou coadjuvantes que possam fazer diferença e contrabalançar a palidez da construção dos dois protagonistas . O Turista molda seus personagens de maneira apática .
E se havia alguma maneira do longa não ser uma inutilidade completa , era necessário explorar os outros gêneros que permeiam o filme - como a comédia romântica, por exemplo . Neste ponto , esbarramos inevitavelmente na falta de aptidão do diretor com o tema . As cenas de ação , que no papel já não deviam estar lá essas coisas , transportadas paras as telas, perdem qualquer ponto positivo . Von Donnesmarck é um tanto quanto quadrado - engessado e sem a vivacidade necessária para embalar o filme de uma maneira interessante . E é verdade que a película tem alguns ápices cômicos , e se eles fazem rir, é mérito exclusivo do roteiro e da interpretação dos atores . Se Von Donnesmarck faz alguma coisa, é tornar qualquer momento mais opaco . E não é uma implicância sem motivo . O cineasta tem até bons momentos - como nos closes máximos nos protagonistas, que são esteticamente interessantes , e em um ou dois zoons ágeis bem eficientes - mas comete erros desnecessários - os closes no vilão são tão imperfeitos que beiram o amadorismo - e não consegue mudar seu estilo gelado um milímetro para favorecer o resultado final .
Ao acender das luzes , fica a sensação indigesta de uma metalinguagem sarcástica : O desfecho do longa é tão ridiculamente inconcebível , que passa a impressão de que uma persona do filme brincou e pregou uma verdadeira pegadinha em todo o resto dos personagens , do mesmo modo como O Turista prega uma peça maldita no público que pagou para assistir um produto lastimável . Poderia me estender ainda para falar nos inúmeros buracos de roteiro que saltam aos olhos numa avaliação final, mas é melhor parar por aqui . O Turista é , afinal, como Salt : Um produto descartável que não merecia nem existir .
1 Estrela * - Sofrível
No último ano ficou claro a proposta hollywoodiana de faturar alto com blockbusters que misturam gêneros e agrupam grandes estrelas cinematográficas . James Mangold optou por um produto de entretenimento de fácil aceitação pelo público e nada ofensivo á critica - um retorno louvável de Tom Cruise, num roteiro simples, mas bem amarrado e desenvolvido, sendo muito bem capturado pela câmera contemplativa do diretor, que deixou seus astros bem á vontade para realizar um bom filme . Na contramão da honestidade bem executada de Encontro Explosivo , também foi cometido o deslize máximo de Robert Luketic, o pastiche enjoativo e cheio de erros Par Perfeito , que tentava - veja bem , tentava - usar uma química inexistente entre Ashton Kutcher e Katherine Heigl , para faturar alto mesclando comédia romântica com um filme de espionagem .
É o trabalho de Hollywood, afinal, tentar juntar gêneros para atrair o máximo de público possível . Nesse quesito, O Turista - remake do filme francês chamado Anthony Zimmer - já começa com larga vantagem . Juntar Johnny Depp, o queridinho de Hollywood , cotado para 11 entre 10 projetos da casa , e a musa Angelina Jolie , é a segurança mínima para pagar os 1oo milhões do orçamento . Ambientado 90 por cento de sua duração na bela cidade de Veneza , poderíamos apostar nossas fichas que o diretor do filme vencedor do Oscar - A Vida dos Outros - Florian Henckel Von Donnersmarck faria uma bela homenagem ao gênero de espionagem ao melhor estilo europeu . Contudo, essa afirmativa fica apenas nas intenções. O Turista é uma armadilha não só para o personagem de Depp - mas para todo o público .
A trama começa se baseando na esposa de um fugitivo da Interpol ( Angelina Jolie ) que é vigiada pela polícia 24 horas por dia onde quer que vá . Para tentar despistar o paradeiro do marido , ela recebe a missão de encontrar um outro homem , que se faça passar pelo parceiro ( que passou por uma cirurgia plástica) e o escolhido é o pacato professor de matemática Frank Dupello ( Johnny Depp). Claro que nada sai da forma planejada, e os dois acabam entrando em perigo nas paisagens venesianas.
Logo de cara, o roteiro de O Turista já começa com alguns leves deslizes . Toda a vigília em cima da personagem de Jolie é deveras expositiva , e mesmo que ela já soubesse que estava sendo vigiada - o que de fato sabia - não deixa o filme de ter, além destes momentos, uma espionagem conceitual um tanto escancarada, para um thriller do gênero . Esse, entretanto, é um dos erros mais ínfimos do longa de Von Donnesmarck . O script do filme tem muito mais defeitos - tanto de falta de respeito com o espectador, quanto de simples desleixo, e falta de aprimoramento ou acabamento . Note , ora, como a narrativa é extremamente vazia . Não há diferenciais explícitos , e muito menos implícitos, em O Turista . Perseguições comuns - e filmadas com pouco caso - não empolgam e dão a impressão enfadonha de alguém caminhando numa esteira : anda , anda, e não sai do lugar . Pode até sair do lugar , mudando de cenários, mas na mente de quem assiste, o filme parece continuar sem graça, e passa quase desapercebido pela tela .
Uma solução para isso seria tentar preencher de conteúdo nos locais que davam - e construção de personagens seria uma saída adequada . E , mesmo com uma atuação competente porém inibida de Johnny Depp - de Jolie só dá pra falar que ela se esforça como pode , principalmente pra imitar o sotaque inglês - não há nada que recheie suas personas com uma vitalidade . Von Donnesmarck sangra os closes o máximo tolerável ,e mesmo assim, a densidade dos personagens é diminuta , rasa como um pires . Não há vilões - aliás , o vilão do filme é bem esdrúxulo - ou coadjuvantes que possam fazer diferença e contrabalançar a palidez da construção dos dois protagonistas . O Turista molda seus personagens de maneira apática .
E se havia alguma maneira do longa não ser uma inutilidade completa , era necessário explorar os outros gêneros que permeiam o filme - como a comédia romântica, por exemplo . Neste ponto , esbarramos inevitavelmente na falta de aptidão do diretor com o tema . As cenas de ação , que no papel já não deviam estar lá essas coisas , transportadas paras as telas, perdem qualquer ponto positivo . Von Donnesmarck é um tanto quanto quadrado - engessado e sem a vivacidade necessária para embalar o filme de uma maneira interessante . E é verdade que a película tem alguns ápices cômicos , e se eles fazem rir, é mérito exclusivo do roteiro e da interpretação dos atores . Se Von Donnesmarck faz alguma coisa, é tornar qualquer momento mais opaco . E não é uma implicância sem motivo . O cineasta tem até bons momentos - como nos closes máximos nos protagonistas, que são esteticamente interessantes , e em um ou dois zoons ágeis bem eficientes - mas comete erros desnecessários - os closes no vilão são tão imperfeitos que beiram o amadorismo - e não consegue mudar seu estilo gelado um milímetro para favorecer o resultado final .
Ao acender das luzes , fica a sensação indigesta de uma metalinguagem sarcástica : O desfecho do longa é tão ridiculamente inconcebível , que passa a impressão de que uma persona do filme brincou e pregou uma verdadeira pegadinha em todo o resto dos personagens , do mesmo modo como O Turista prega uma peça maldita no público que pagou para assistir um produto lastimável . Poderia me estender ainda para falar nos inúmeros buracos de roteiro que saltam aos olhos numa avaliação final, mas é melhor parar por aqui . O Turista é , afinal, como Salt : Um produto descartável que não merecia nem existir .
1 Estrela * - Sofrível
terça-feira, 18 de janeiro de 2011
Cisne Negro
Darren Aronofsky cria, num mix de seus trabalhos, a perfeição.
Uma bailarina vestida de branco começa a se movimentar num palco escuro. Ela não pode ser identificada inicialmente, apesar da iluminação contemplá-la quase divinamente. Então, a paixão da personagem, a dança, é filmada através de seus pés, com movimentos milimétricos, sem um completo erro. Logo, surge um segundo participante, um estranho ser vestido de preto, que dança de forma sincronizada com a bailarina. Porém, a coreografia é diferente. Ela é complicada e imprevisível, espetacular e plástica ao extremo, mas o tal ser parceiro da bailarina se transforma num cisne com cifres. Mas o mais estranho é a naturalidade com que a bailarina encara o parceiro transformado. Era até mesmo desnecessário que a bailarina comentasse depois que a tal coreografia era diferente das que foram ensaiadas. Os ensaios demonstram depois que os erros fazem parte do show. E naquela estranheza escura, dividida pelos dois participantes, a perfeição foi alcançada. Então, Nina Sayers acorda. O sonho não é o bastante. Ela quer a perfeição real.
Sem ao menos precisar saber do que se trata a película, Darren Aronofsky nos entrega tudo o que a personagem quer, de forma objetiva e inovadora, em dois minutos. E isso é apenas o primeiro elemento do êxtase de emoções que é Cisne Negro.
Desenvolvimento, aliás, é algo facilmente conduzido pelo diretor. Desde seu debute na direção, o alucinado Pi, o cineasta trabalha com isso. Porém, é normal dizer que um desenvolvimento lento é genial e todo o tempo do mundo deve ser gasto para desenvolver os personagens e situações. Em várias películas, como na obra de arte 2001, é exatamente assim e isso é digno de aplausos, sim. Mas é preciso ser um profundo conhecedor da sétima arte para dizer o que um personagem é e o que sua história pretende contar em apenas poucos minutos. Assim como o sonho inicial, fundamental para a ambientação com Nina, tudo em Cisne Negro é conciso e bem desenvolvido. Paradoxo, diriam os críticos adeptos do desenvolvimento lento. Mas aqui, é notável a capacidade que o roteiro de Mark Heyman, Andrés Heinz e John McLaughlin e a direção de Aronofsky de serem diretos, sem nunca soarem apressados. Não só o sonho de Nina é exemplo disso, como também seu arranhão nas costas ser apresentado rapidamente a trama. Essa concisão é recorrente a Aronofsky. O início de sua obra-prima, Requiem para um Sonho, já começa com uma discussão simples, mas que determina todo o ritmo aterrador da narrativa.
E se Nina não estranha o visual diabólico/bizarro que seu parceiro tem, é fácil constatar que estamos no seu subconsciente. E dele não saímos em nenhum momento do roteiro de Heyman, Heinz e McLaughlin, que não faz concessões a respostas fáceis e nunca entrega ao público soluções triviais para as complexas relações emocionais retratadas por Nina e os coadjuvantes. Dando apenas sinais da possível falta de realidade na qual Nina está, como sombras e a aparente falta de comunicação entre a bailarina e uma outra pessoa, Cisne Negro é repleto de simbolismos. Nina tem sua paixão ao balé retratada dessa mesma forma. Se diálogos e situações são desnecessários nessa concisão que os realizadores impuseram, nada melhor que usar vários elementos de cena para determinar o jeito de sua protagonista. Os simbolismos aqui servem não só como meras sacadas visuais, mas como determinantes chave para a compreensão da personagem. Sabemos que Nina é infantilizada por seus bichos de pelúcia no quarto. Entendemos a importância de uma tora de madeira apenas quando uma briga ocorre. Nada está ali por acaso ou de forma desnecessária.
Os simbolismos, aliás, são expandidos e aprimorados pelo gênio contemporâneo que é Darren Aronofsky. Se esses mesmos são recorrentes na carreira do diretor, que implodiu Fonte da Vida perante o público justamente por abusar dos simbolismos que afastam quem procura respostas fáceis numa narrativa, aqui ele insiste neles sem medo da reação, respondendo visualmente questões que o roteiro deixa em aberto, o que é uma demonstração legítima de coragem. Mesmo depois de ter seu segundo melhor filme, o belíssimo poema de amor e vida que é Fonte, massacrado pelo público, ele continua a fazer cinema de arte.
A complexidade de emoções é potencializada com a chegada de um inspetor, um mediador que determina a perfeição, que tanto Nina procura. Thomas Leroy, vivido com uma surpreendente presença de cena do excelente Vincent Cassel, é peça fundamental pro quebra-cabeça que Nina pretende construir. Seu professor de balé, extremamente rígido, impõe uma rotina de treinamentos que Nina não consegue balancear. Mesmo sendo totalmente dedicada, Thomas sempre está exigindo que a bailarina saiba interpretar o Cisne Negro, o extremo oposto do Cisne Branco, no qual Nina é perfeita. E é nesse momento que a bailarina começa a ter dúvidas de sua sanidade, quando entra nesse vácuo mental que pode destruí-la.
E é nisso que Aronofsky volta aos simbolismos. Se Nina é perfeita, porque então Thomas não a aceita? A resposta é implícita e apenas ANALISANDO o comportamento do professor, atentando ao seu olhar clínico e cheio de respostas, reproduzido pela complexa interpretação de Cassel. E essa análise não é jogada na tela á toa. Aos que não desvendarem a resposta, ficará um buraco. Os roteiristas e o diretor arriscam a compreensão de seu filme em nome da confiança no espectador. Não há uma representação mais apaixonada do que essa de um cineasta ao seu público, respeitando completamente sua inteligência. Tanto emocionalmente como fisicamente(existem cenas que ecoam o lado mais sombrio de David Cronenberg, como a retirada da unha), Cisne Negro não é uma experiência para fracos.
Essa dualidade presente durante todo o filme, em que estamos claramente dentro da mente de Nina(com exceção de raros contra-planos, como no clímax, em que Aronofsky nos tira, sem avisar, desse estado), é personificada por um personagem: Lily, interpretada com competência impressionante de Mila Kunis. A atriz, que merece todos os prêmios a que poderia ser indicada, demonstra com uma naturalidade espantosa toda a cerne de Lily. A perfeita candidata a Cisne Negro, ela exibe uma sensualidade e imperfeição em seus movimentos que atraem Thomas. E sendo a preferida do mediador para o papel de Odile, Lily é o que Nina queria ser: O lado obscuro da perfeição. Quando Nina tenta ser como Lily, é doída a cena que ela vai falar com Thomas em busca do papel de Swan Queen. Com seu jeito tímido e contido, com uma doçura incomensurável, Nina tenta representar a sensualidade de Odile do jeito que sabe. O simbolismo? Um desajeitado batom rosa. A simples cena determina o insucesso de Nina em ser adulta. Aí se abre o tal vácuo mental que pode destruir cada pedaço da pobre bailarina, vítima de suas altíssimas ambições.
E de onde vêm essas ambições? Há um núcleo específico pra isso, o que explora a mãe de Nina, Erica, interpretada por Barbara Hershey. Como a personagem de Cecília Roth em Ninho Vazio, Erica é complexa por não aparentar o que sente realmente de forma explícita. E Barbara Hershey, em atuação poderosa, transmite toda a incerteza de Erica. Os pequenos símbolos que a representam, como o genial coque preso no cabelo, fazem metade da construção da personagem, que tem uma rigidez ácida com Nina, talvez por alguma frustração passada que tenha a atingido. E o coque é a resposta crua que os realizadores nos dão.
Observando o núcleo dramático pesado que nos é apresentado, vemos que o filme percorre o caminho do filme-delírio, como em Pi. Mas Cisne Negro é uma evolução nítida em Aronofsky como contador de histórias, em relação ao debute, já que o mesmo explorava bem menos a dramaticidade extrema que Cisne tem. E essa dramaticidade é uma verdadeira carrasca de Nina, que está no papel que foi de Sara Goldfarb, em Requiem. Com a melhor atuação do ano, Natalie Portman capta toda a essência de Nina Sayers e entrega a interpretação mais fabulosa de sua carreira.
Não se deve subestimar a parte técnica do filme perante a narrativa. A fotografia de Matthew Libatique é granulada e lindíssima, dando um ar de realismo mesclado com onírico, nunca trocando os tons, fazendo com que nunca se saiba quando Nina está realmente sonhando. A trilha sonora do igualmente genial Clint Mansell pega trechos do balé de Tchaikovsky e utiliza uma orquestra á moda antiga, com instrumentos dificilmente utilizados como tambor e trompete. Fora isso, utiliza o seu habitual violino com uma beleza de tirar o fôlego. Aliados á trilha sonora angustiante, a mixagem e edição de som são igualmente bem-sucedidos ao implantar elementos que emulam ruídos na cabeça de Nina, o que é aterrador e apavorante em diversas cenas. A edição de Andrew Weisburn é precisa e, apesar da competência, é o quesito mais apagado do filme.
E se Darren Aronofsky evolui a cada segundo como contador de histórias, sua direção é de um apuro estético de fazer inveja a veteranos. Seus cortes rápidos de hip-hop montage, presentes em Pi e Requiem, são substituídos pelos planos-sequência gigantes de Cisne Negro, como a cena em que Nina dança como Odile, o que merecia uma resenha á parte. Momentos de pura genialidade, como a dança de Natalie Portman representada pelo espelho atrás de Vincent Cassel, são recorrentes e têm pelo menos mais 3 exemplos a serem citados: O clímax, a cena no metrô e a cena do hospital, perto do final.
Um espetáculo da sétima arte, Cisne Negro é ambicioso como qualquer filme de Aronofsky e entrega uma qualidade quase igualável aos dois melhores filmes do diretor. Com a marca do realizador em abordar diversos temas em apenas uma trama, Cisne é uma fábula contemporânea sobre a perda da inocência, a perda da castidade do Cisne Branco(como o espetacular plano que o diretor acompanha Natalie caminhando quase num êxtase sexual), o amadurecimento e a metalinguagem com o Lago dos Cisnes e a própria indústria cinematográfica(como a transformação física de Natalie e Mila denunciam). Uma experiência como poucas. Um monstro de cinematografia. Um retrato cru e melancólico da obsessão de um artista por sua paixão. A derrocada do ser humano é, mais uma vez, retratada por Darren Aronofsky. E com mais um filme que merece figurar no Panteão nos filmes mais importantes da história.
***** 5 Estrelas - Obra-Prima
Uma bailarina vestida de branco começa a se movimentar num palco escuro. Ela não pode ser identificada inicialmente, apesar da iluminação contemplá-la quase divinamente. Então, a paixão da personagem, a dança, é filmada através de seus pés, com movimentos milimétricos, sem um completo erro. Logo, surge um segundo participante, um estranho ser vestido de preto, que dança de forma sincronizada com a bailarina. Porém, a coreografia é diferente. Ela é complicada e imprevisível, espetacular e plástica ao extremo, mas o tal ser parceiro da bailarina se transforma num cisne com cifres. Mas o mais estranho é a naturalidade com que a bailarina encara o parceiro transformado. Era até mesmo desnecessário que a bailarina comentasse depois que a tal coreografia era diferente das que foram ensaiadas. Os ensaios demonstram depois que os erros fazem parte do show. E naquela estranheza escura, dividida pelos dois participantes, a perfeição foi alcançada. Então, Nina Sayers acorda. O sonho não é o bastante. Ela quer a perfeição real.
Sem ao menos precisar saber do que se trata a película, Darren Aronofsky nos entrega tudo o que a personagem quer, de forma objetiva e inovadora, em dois minutos. E isso é apenas o primeiro elemento do êxtase de emoções que é Cisne Negro.
Desenvolvimento, aliás, é algo facilmente conduzido pelo diretor. Desde seu debute na direção, o alucinado Pi, o cineasta trabalha com isso. Porém, é normal dizer que um desenvolvimento lento é genial e todo o tempo do mundo deve ser gasto para desenvolver os personagens e situações. Em várias películas, como na obra de arte 2001, é exatamente assim e isso é digno de aplausos, sim. Mas é preciso ser um profundo conhecedor da sétima arte para dizer o que um personagem é e o que sua história pretende contar em apenas poucos minutos. Assim como o sonho inicial, fundamental para a ambientação com Nina, tudo em Cisne Negro é conciso e bem desenvolvido. Paradoxo, diriam os críticos adeptos do desenvolvimento lento. Mas aqui, é notável a capacidade que o roteiro de Mark Heyman, Andrés Heinz e John McLaughlin e a direção de Aronofsky de serem diretos, sem nunca soarem apressados. Não só o sonho de Nina é exemplo disso, como também seu arranhão nas costas ser apresentado rapidamente a trama. Essa concisão é recorrente a Aronofsky. O início de sua obra-prima, Requiem para um Sonho, já começa com uma discussão simples, mas que determina todo o ritmo aterrador da narrativa.
E se Nina não estranha o visual diabólico/bizarro que seu parceiro tem, é fácil constatar que estamos no seu subconsciente. E dele não saímos em nenhum momento do roteiro de Heyman, Heinz e McLaughlin, que não faz concessões a respostas fáceis e nunca entrega ao público soluções triviais para as complexas relações emocionais retratadas por Nina e os coadjuvantes. Dando apenas sinais da possível falta de realidade na qual Nina está, como sombras e a aparente falta de comunicação entre a bailarina e uma outra pessoa, Cisne Negro é repleto de simbolismos. Nina tem sua paixão ao balé retratada dessa mesma forma. Se diálogos e situações são desnecessários nessa concisão que os realizadores impuseram, nada melhor que usar vários elementos de cena para determinar o jeito de sua protagonista. Os simbolismos aqui servem não só como meras sacadas visuais, mas como determinantes chave para a compreensão da personagem. Sabemos que Nina é infantilizada por seus bichos de pelúcia no quarto. Entendemos a importância de uma tora de madeira apenas quando uma briga ocorre. Nada está ali por acaso ou de forma desnecessária.
Os simbolismos, aliás, são expandidos e aprimorados pelo gênio contemporâneo que é Darren Aronofsky. Se esses mesmos são recorrentes na carreira do diretor, que implodiu Fonte da Vida perante o público justamente por abusar dos simbolismos que afastam quem procura respostas fáceis numa narrativa, aqui ele insiste neles sem medo da reação, respondendo visualmente questões que o roteiro deixa em aberto, o que é uma demonstração legítima de coragem. Mesmo depois de ter seu segundo melhor filme, o belíssimo poema de amor e vida que é Fonte, massacrado pelo público, ele continua a fazer cinema de arte.
A complexidade de emoções é potencializada com a chegada de um inspetor, um mediador que determina a perfeição, que tanto Nina procura. Thomas Leroy, vivido com uma surpreendente presença de cena do excelente Vincent Cassel, é peça fundamental pro quebra-cabeça que Nina pretende construir. Seu professor de balé, extremamente rígido, impõe uma rotina de treinamentos que Nina não consegue balancear. Mesmo sendo totalmente dedicada, Thomas sempre está exigindo que a bailarina saiba interpretar o Cisne Negro, o extremo oposto do Cisne Branco, no qual Nina é perfeita. E é nesse momento que a bailarina começa a ter dúvidas de sua sanidade, quando entra nesse vácuo mental que pode destruí-la.
E é nisso que Aronofsky volta aos simbolismos. Se Nina é perfeita, porque então Thomas não a aceita? A resposta é implícita e apenas ANALISANDO o comportamento do professor, atentando ao seu olhar clínico e cheio de respostas, reproduzido pela complexa interpretação de Cassel. E essa análise não é jogada na tela á toa. Aos que não desvendarem a resposta, ficará um buraco. Os roteiristas e o diretor arriscam a compreensão de seu filme em nome da confiança no espectador. Não há uma representação mais apaixonada do que essa de um cineasta ao seu público, respeitando completamente sua inteligência. Tanto emocionalmente como fisicamente(existem cenas que ecoam o lado mais sombrio de David Cronenberg, como a retirada da unha), Cisne Negro não é uma experiência para fracos.
Essa dualidade presente durante todo o filme, em que estamos claramente dentro da mente de Nina(com exceção de raros contra-planos, como no clímax, em que Aronofsky nos tira, sem avisar, desse estado), é personificada por um personagem: Lily, interpretada com competência impressionante de Mila Kunis. A atriz, que merece todos os prêmios a que poderia ser indicada, demonstra com uma naturalidade espantosa toda a cerne de Lily. A perfeita candidata a Cisne Negro, ela exibe uma sensualidade e imperfeição em seus movimentos que atraem Thomas. E sendo a preferida do mediador para o papel de Odile, Lily é o que Nina queria ser: O lado obscuro da perfeição. Quando Nina tenta ser como Lily, é doída a cena que ela vai falar com Thomas em busca do papel de Swan Queen. Com seu jeito tímido e contido, com uma doçura incomensurável, Nina tenta representar a sensualidade de Odile do jeito que sabe. O simbolismo? Um desajeitado batom rosa. A simples cena determina o insucesso de Nina em ser adulta. Aí se abre o tal vácuo mental que pode destruir cada pedaço da pobre bailarina, vítima de suas altíssimas ambições.
E de onde vêm essas ambições? Há um núcleo específico pra isso, o que explora a mãe de Nina, Erica, interpretada por Barbara Hershey. Como a personagem de Cecília Roth em Ninho Vazio, Erica é complexa por não aparentar o que sente realmente de forma explícita. E Barbara Hershey, em atuação poderosa, transmite toda a incerteza de Erica. Os pequenos símbolos que a representam, como o genial coque preso no cabelo, fazem metade da construção da personagem, que tem uma rigidez ácida com Nina, talvez por alguma frustração passada que tenha a atingido. E o coque é a resposta crua que os realizadores nos dão.
Observando o núcleo dramático pesado que nos é apresentado, vemos que o filme percorre o caminho do filme-delírio, como em Pi. Mas Cisne Negro é uma evolução nítida em Aronofsky como contador de histórias, em relação ao debute, já que o mesmo explorava bem menos a dramaticidade extrema que Cisne tem. E essa dramaticidade é uma verdadeira carrasca de Nina, que está no papel que foi de Sara Goldfarb, em Requiem. Com a melhor atuação do ano, Natalie Portman capta toda a essência de Nina Sayers e entrega a interpretação mais fabulosa de sua carreira.
Não se deve subestimar a parte técnica do filme perante a narrativa. A fotografia de Matthew Libatique é granulada e lindíssima, dando um ar de realismo mesclado com onírico, nunca trocando os tons, fazendo com que nunca se saiba quando Nina está realmente sonhando. A trilha sonora do igualmente genial Clint Mansell pega trechos do balé de Tchaikovsky e utiliza uma orquestra á moda antiga, com instrumentos dificilmente utilizados como tambor e trompete. Fora isso, utiliza o seu habitual violino com uma beleza de tirar o fôlego. Aliados á trilha sonora angustiante, a mixagem e edição de som são igualmente bem-sucedidos ao implantar elementos que emulam ruídos na cabeça de Nina, o que é aterrador e apavorante em diversas cenas. A edição de Andrew Weisburn é precisa e, apesar da competência, é o quesito mais apagado do filme.
E se Darren Aronofsky evolui a cada segundo como contador de histórias, sua direção é de um apuro estético de fazer inveja a veteranos. Seus cortes rápidos de hip-hop montage, presentes em Pi e Requiem, são substituídos pelos planos-sequência gigantes de Cisne Negro, como a cena em que Nina dança como Odile, o que merecia uma resenha á parte. Momentos de pura genialidade, como a dança de Natalie Portman representada pelo espelho atrás de Vincent Cassel, são recorrentes e têm pelo menos mais 3 exemplos a serem citados: O clímax, a cena no metrô e a cena do hospital, perto do final.
Um espetáculo da sétima arte, Cisne Negro é ambicioso como qualquer filme de Aronofsky e entrega uma qualidade quase igualável aos dois melhores filmes do diretor. Com a marca do realizador em abordar diversos temas em apenas uma trama, Cisne é uma fábula contemporânea sobre a perda da inocência, a perda da castidade do Cisne Branco(como o espetacular plano que o diretor acompanha Natalie caminhando quase num êxtase sexual), o amadurecimento e a metalinguagem com o Lago dos Cisnes e a própria indústria cinematográfica(como a transformação física de Natalie e Mila denunciam). Uma experiência como poucas. Um monstro de cinematografia. Um retrato cru e melancólico da obsessão de um artista por sua paixão. A derrocada do ser humano é, mais uma vez, retratada por Darren Aronofsky. E com mais um filme que merece figurar no Panteão nos filmes mais importantes da história.
***** 5 Estrelas - Obra-Prima
segunda-feira, 17 de janeiro de 2011
Bravura Indômita
Irmãos Coen voltam a faroeste, desta vez á moda antiga .
Em 2007 , os Irmãos Coen , famosos pela excelência cinematográfica e destreza inconfundível na criação de sátiras aos mais variados gêneros , trouxeram ás telas dos cinemas de todo o mundo a adaptação do belo livro escrito por Cormac McCarthy , Onde Os Fracos Não Têm Vez . Na ocasião , os Coen optaram pela abordagem séria de um faroeste moderno - moderno se tratando de um western, já que o filme se passava nos anos 80 - e obtiveram o sucesso de um novo clássico do gênero, que se encontrava na ''geladeira'', se assim podemos dizer, de Hollywood . Com praticamente nenhum similar das consagradas histórias do velho oeste até então , Joel e Ethan Coen arrancaram aplausos com a película , e fizeram a indústria dar o braço a torcer, e ter que reconhecer o talento nato da dupla premiando o filme com 4 carecas dourados .
Depois disso, passando por duas comédias geniais - Queime Depois de Ler e Um Homem Sério, respectivamente - os irmãos-cineastas parecem ter sentido falta do sabor de coordenar mais uma vez o set de um faroeste . Agora, em 2011 - tendo estreado nos USA em 2010 -chega ás telas do Brasil mais um longa da dupla , o remake do clássico de 1969 - o qual teve direito á presença de ninguém menos que John Wayne como protagonista - Bravura Indômita . Desta vez, os Coen parecem ter escolhido desfrutar do prazer de dirigir um western á moda antiga, um digno exemplar dos faroestes clássicos passados á pelo menos dois séculos atrás . E depois de assistir a uma sessão de Bravura Indômita, fica cada vez mais verdadeira a afirmação de que não há ninguém mais preparado para mexer nos temas do velho-oeste hoje em dia do que os dois talentosos irmãos .
A trama , uma estrutura de western típica , é narrada por Mattie Ross (Hailee Steinfield) já adulta, relembrando eventos da época que tinha 14 anos . Na época, Mattie perdeu o pai , assassinado por motivo torpe, por um bandido procurado em várias regiões , o meliante chamado Tom Chaney (Josh Brolin) . Inconformada, a jovem vai até a cidade tratar de procurar um homem para efetivar a caça a Chaney . Ela encontra o U.S. Marshal Rooster Cogburn ( Jeff Bridges) famoso pela sua bravura indômita ante os marginais . Juntam-se a eles na caçada de Chaney o Texas Ranger LaBoeuf(Matt Damon) , que persegue o bandido por crimes cometidos no Texas .
Sem ter assistido ao original, procurarei aqui avaliar o filme de maneira isolada , levando-o em consideração de forma independente ao filme de 1969 . E ,é precido ser dito, que de maneira clássica, Bravura Indômita coloca suas cartas na mesa. Como nos melhores westerns que costumavam ser feitos há décadas atrás , o longa nos introduz no universo mais típico do faroeste. Uma narrativa de vingança, que busca desenvolver seus personagens pouco a pouco, com toda uma temática de honra inerente aos filmes de bangue-bangue . Afinal, não se constroem os grandes filmes de faroeste apenas pela presença de cavalos, chápeus de cowboy e revólveres carregados . Fica nítido para o espectador estar vendo um produto cristalino e muito valoroso do gênero quando percebemos as atitudes singulares dos personagens . Ora, todos estão atrás de Chaney, e mesmo assim, a preocupação de Mattie é que o criminoso seja preso pelo assassinato de seu pai , e que ele esteja ciente disso . Essa sensação de punição, justiça e retribuição á moda antiga permeia toda a exibição e nos faz ter completo discernimento que a intenção dos Coen ao lançarem o filme é trazer de volta , com a marca de qualidade dos dois, toda a essência única que só o mais puro faroeste pode exalar .
Mas nada fica na superficialidade ou sequer esbarra no lugar-comum - Os Coen nunca deixariam isto acontecer . Temos elementos clássicos e indispensáveis para todo filme do gênero, e nesse aspecto, não há falhas ou meias-palavras . A repulsa criada quando vemos a face do personagem de Josh Brolin é de um sentimento de retorno aos vilões e fascínoras clássicos - nada mais emblemático para montar a áurea do vilão típico do que uma mancha negra na cara . Mas também há conceitos empregados neste Bravura que não são tão fáceis de encontrar pelos arquivos do velho oeste - o próprio fato de uma menina acompanhar uma jornada de vingança exemplifica bem isso . Desse modo, misturando conceitos já testados e consagrados com outros mais diferenciados, os Coen conseguem esculpir uma homenagem a um gênero que gostam, atribuindo-lhe detalhes que fogem do padrão, e nesse aspecto, não poderia haver trama mais precisa para se fazer um remake do que a de Bravura Indômita.
E a cereja no bolo para a homenagem ficar completa é a direção da dupla . Partindo de takes abertos , que valorizam os belos cenários de época , chegando até uma compreensão de plano e contra-plano estático muito eficiente , podemos ter uma noção de que Joel e Ethan estão fazendo uma direção interessante, mas não ao nível que já realizaram em filmes anteriores. Se evidencia então, ao longo do desdobramento do filme, e principalmente na sequencia de tiroteio final , que a homenagem ao gênero não poderia ser mais clara e elegante do que aqui . A câmera que pega da espora do cowboy antes do confronto frente a frente é o olhar da dupla embasado nos grandes mestres de antigamente. Preciso . E podemos incluir neste olhar saudosista a trilha de Carter Burwell - que por ter referencia tão forte ao século XIX e a westerns antigos , foi retirada da disputa do Oscar - e a fotografia de Roger Deakins ,que dificilmente poderia estar mais referencial e sutil do que está .
E se o original de 1969 tinha John Wayne encabeçando seu elenco, neste aqui temos Jeff Bridges . No ano seguinte ao que recebeu o Oscar por Coração Louco , Bridges trás uma interpretação absoluta e definitiva . Modifica a voz, a postura, o modo de falar, e é impossível encontrar no Rooster dele algo parecido a Kevin Flynn, de Tron Legacy, por exemplo . Este é um exemplo de ATOR DE VERDADE. O resto é outra história . E o melhor , Bridges não interpreta em nenhum momento imitando um estilo John Wayne . De igual, fica apenas a intensidade . Original e competente, ele engole o filme . Merece pelo menos uma indicação ao Oscar desse ano . Mas o filme não se resume apenas a Bridges. Matt Damon tem seus momentos , -confirmando seu talento - conduzindo seu personagem de maneira formidável . E Hailee Steinfield é mais um daqueles achados que prometem muito , como uma Chloe Moretz , por exemplo.
Fica um verdadeiro sentimento de gratidão ao terminar de assistir esta versão de Bravura Indômita . O prazer de poder saborear um western no dias de hoje é cada vez mais restrito, e é muito reconfortante saber que dois gênios consagrados tem interesse pelo gênero e talento de sobra pra conseguir trazer experiências sensacionais até nós . Se em 2007 eles nos premiaram com um faroeste moderno que media a força de dois opostos, aqui, eles nos trazem uma homenagem belíssima e diferenciada a um gênero tão interessante . Se alguém algum dia pensou que o faroeste tinha morrido no cinema, então esse alguém está um pouco enganado. Ainda existem Joel e Ethan Coen, e neles nós podemos acreditar.
5 Estrelas ***** - Excelente
Em 2007 , os Irmãos Coen , famosos pela excelência cinematográfica e destreza inconfundível na criação de sátiras aos mais variados gêneros , trouxeram ás telas dos cinemas de todo o mundo a adaptação do belo livro escrito por Cormac McCarthy , Onde Os Fracos Não Têm Vez . Na ocasião , os Coen optaram pela abordagem séria de um faroeste moderno - moderno se tratando de um western, já que o filme se passava nos anos 80 - e obtiveram o sucesso de um novo clássico do gênero, que se encontrava na ''geladeira'', se assim podemos dizer, de Hollywood . Com praticamente nenhum similar das consagradas histórias do velho oeste até então , Joel e Ethan Coen arrancaram aplausos com a película , e fizeram a indústria dar o braço a torcer, e ter que reconhecer o talento nato da dupla premiando o filme com 4 carecas dourados .
Depois disso, passando por duas comédias geniais - Queime Depois de Ler e Um Homem Sério, respectivamente - os irmãos-cineastas parecem ter sentido falta do sabor de coordenar mais uma vez o set de um faroeste . Agora, em 2011 - tendo estreado nos USA em 2010 -chega ás telas do Brasil mais um longa da dupla , o remake do clássico de 1969 - o qual teve direito á presença de ninguém menos que John Wayne como protagonista - Bravura Indômita . Desta vez, os Coen parecem ter escolhido desfrutar do prazer de dirigir um western á moda antiga, um digno exemplar dos faroestes clássicos passados á pelo menos dois séculos atrás . E depois de assistir a uma sessão de Bravura Indômita, fica cada vez mais verdadeira a afirmação de que não há ninguém mais preparado para mexer nos temas do velho-oeste hoje em dia do que os dois talentosos irmãos .
A trama , uma estrutura de western típica , é narrada por Mattie Ross (Hailee Steinfield) já adulta, relembrando eventos da época que tinha 14 anos . Na época, Mattie perdeu o pai , assassinado por motivo torpe, por um bandido procurado em várias regiões , o meliante chamado Tom Chaney (Josh Brolin) . Inconformada, a jovem vai até a cidade tratar de procurar um homem para efetivar a caça a Chaney . Ela encontra o U.S. Marshal Rooster Cogburn ( Jeff Bridges) famoso pela sua bravura indômita ante os marginais . Juntam-se a eles na caçada de Chaney o Texas Ranger LaBoeuf(Matt Damon) , que persegue o bandido por crimes cometidos no Texas .
Sem ter assistido ao original, procurarei aqui avaliar o filme de maneira isolada , levando-o em consideração de forma independente ao filme de 1969 . E ,é precido ser dito, que de maneira clássica, Bravura Indômita coloca suas cartas na mesa. Como nos melhores westerns que costumavam ser feitos há décadas atrás , o longa nos introduz no universo mais típico do faroeste. Uma narrativa de vingança, que busca desenvolver seus personagens pouco a pouco, com toda uma temática de honra inerente aos filmes de bangue-bangue . Afinal, não se constroem os grandes filmes de faroeste apenas pela presença de cavalos, chápeus de cowboy e revólveres carregados . Fica nítido para o espectador estar vendo um produto cristalino e muito valoroso do gênero quando percebemos as atitudes singulares dos personagens . Ora, todos estão atrás de Chaney, e mesmo assim, a preocupação de Mattie é que o criminoso seja preso pelo assassinato de seu pai , e que ele esteja ciente disso . Essa sensação de punição, justiça e retribuição á moda antiga permeia toda a exibição e nos faz ter completo discernimento que a intenção dos Coen ao lançarem o filme é trazer de volta , com a marca de qualidade dos dois, toda a essência única que só o mais puro faroeste pode exalar .
Mas nada fica na superficialidade ou sequer esbarra no lugar-comum - Os Coen nunca deixariam isto acontecer . Temos elementos clássicos e indispensáveis para todo filme do gênero, e nesse aspecto, não há falhas ou meias-palavras . A repulsa criada quando vemos a face do personagem de Josh Brolin é de um sentimento de retorno aos vilões e fascínoras clássicos - nada mais emblemático para montar a áurea do vilão típico do que uma mancha negra na cara . Mas também há conceitos empregados neste Bravura que não são tão fáceis de encontrar pelos arquivos do velho oeste - o próprio fato de uma menina acompanhar uma jornada de vingança exemplifica bem isso . Desse modo, misturando conceitos já testados e consagrados com outros mais diferenciados, os Coen conseguem esculpir uma homenagem a um gênero que gostam, atribuindo-lhe detalhes que fogem do padrão, e nesse aspecto, não poderia haver trama mais precisa para se fazer um remake do que a de Bravura Indômita.
E a cereja no bolo para a homenagem ficar completa é a direção da dupla . Partindo de takes abertos , que valorizam os belos cenários de época , chegando até uma compreensão de plano e contra-plano estático muito eficiente , podemos ter uma noção de que Joel e Ethan estão fazendo uma direção interessante, mas não ao nível que já realizaram em filmes anteriores. Se evidencia então, ao longo do desdobramento do filme, e principalmente na sequencia de tiroteio final , que a homenagem ao gênero não poderia ser mais clara e elegante do que aqui . A câmera que pega da espora do cowboy antes do confronto frente a frente é o olhar da dupla embasado nos grandes mestres de antigamente. Preciso . E podemos incluir neste olhar saudosista a trilha de Carter Burwell - que por ter referencia tão forte ao século XIX e a westerns antigos , foi retirada da disputa do Oscar - e a fotografia de Roger Deakins ,que dificilmente poderia estar mais referencial e sutil do que está .
E se o original de 1969 tinha John Wayne encabeçando seu elenco, neste aqui temos Jeff Bridges . No ano seguinte ao que recebeu o Oscar por Coração Louco , Bridges trás uma interpretação absoluta e definitiva . Modifica a voz, a postura, o modo de falar, e é impossível encontrar no Rooster dele algo parecido a Kevin Flynn, de Tron Legacy, por exemplo . Este é um exemplo de ATOR DE VERDADE. O resto é outra história . E o melhor , Bridges não interpreta em nenhum momento imitando um estilo John Wayne . De igual, fica apenas a intensidade . Original e competente, ele engole o filme . Merece pelo menos uma indicação ao Oscar desse ano . Mas o filme não se resume apenas a Bridges. Matt Damon tem seus momentos , -confirmando seu talento - conduzindo seu personagem de maneira formidável . E Hailee Steinfield é mais um daqueles achados que prometem muito , como uma Chloe Moretz , por exemplo.
Fica um verdadeiro sentimento de gratidão ao terminar de assistir esta versão de Bravura Indômita . O prazer de poder saborear um western no dias de hoje é cada vez mais restrito, e é muito reconfortante saber que dois gênios consagrados tem interesse pelo gênero e talento de sobra pra conseguir trazer experiências sensacionais até nós . Se em 2007 eles nos premiaram com um faroeste moderno que media a força de dois opostos, aqui, eles nos trazem uma homenagem belíssima e diferenciada a um gênero tão interessante . Se alguém algum dia pensou que o faroeste tinha morrido no cinema, então esse alguém está um pouco enganado. Ainda existem Joel e Ethan Coen, e neles nós podemos acreditar.
5 Estrelas ***** - Excelente
domingo, 16 de janeiro de 2011
127 Horas
Todo o segundo conta .
Iniciando com uma edição ágil e uma trilha animada, os créditos iniciais de 127 Horas dão o tom da vida acelerada do alpinista Aron Ralston (James Franco). O título do filme, porém, só aparece na tela - em um fotograma belíssimo - alguns minutos depois, quando o nosso vigoroso protagonista cai de repente numa fenda estreita do Canyon que escalava . Chocado, Aron fica alguns segundos suspenso sem acreditar no que acabou de acontecer . É possível enxergar na sua face os primeiros sentimentos de pânico em decorrência da situação unusual na qual acabara de entrar . E aqueles são apenas os primeiros segundos dos longos 5 dias e 7 horas que o alpinista teve de suportar com uma rocha imprensando seu braço contra a parede do canyon.
E dois anos depois de ser consagrado vencendo o Oscar pelo bom , porém hiper-valorizado Slumdog Millionaire , o diretor inglês Danny Boyle vem agora realizar o seu melhor trabalho nos últimos anos , contando exatamente a história verídica e espetacular de Aron Ralston , o alpinista que passou as 127 horas do título com o braço direito esmagado na fatídica rocha, em uma fenda do Blue John Canyon em Utah , Estados Unidos .
Na trama desenhada no filme, dá-se a entender que Aron, de certo modo, estruturou tudo o que fosse possível para que não fosse resgatado - Não retornava as ligações da mãe há dias, não mantinha mais contato com a ex-namorada Rana (Cleménce Poésy), e, principalmente, não tinha avisado pra ninguém aonde tinha ido . O último contato com seres humanos antes do acidente tinha sido com duas turistas, Kristi (Kate Mara) e Megan (Amber Tamblym), as quais ele tinha guiado por um tempo no passeio . Mas, como pode ser visto no próprio trailer, elas não conseguiram ouvir aos chamados desesperados de Aron . Ele estava sozinho, sem muito o que fazer .
E o roteiro de 127 horas aproveita muito bem todo o potencial que a história real impressionante dispunha . Com um braço amassado , preso , e uma rocha grande e pesada limitando seus movimentos, era muito fácil para Aron enveredar pelo caminho do desespero . ''Do not loose it , Aron '', entretanto, o aventureiro diz . Era preciso manter a paciência para seguir com chances de vida, e entrar em pânico não ajudaria em nada . Com esforço, ele passa por maus bocados - enfrenta a dor, as alucinações , a escassez de água e comida, culminando em ter que beber a própria urina - até ter o ímpeto de amputar o próprio braço com as ferramentas que possuía no momento . Como peça de ilustração de um fato real, o novo longa de Danny Boyle é excepcional . Utiliza sua trilha para temperar a tensão com certa ironia , mas também para pontuá-la em momentos de dor lancinante - como na inconfortável cena em que Aron corta o nervo de seu braço, cena , aliás, que fez pessoas passarem mal em festivais ao redor do mundo . Uma retratação muito talentosa e eficiente da jornada de superação do alpinista .
E talvez ''superação'' seja o adjetivo mais óbvio para 127 Horas . Realmente, a superação física é visível , mas não é só nisso que o termo se baseia . Superação do modo de agir, das concepções que Aron possuía antes de ficar preso por mais de 5 dias numa fenda . Fica muito claro no momento em que ele declara que aquela rocha estava esperando por ele desde que nasceu. Era o ponto de mudança que ele precisava passar, o aprendizado que necesitava adquirir .
E esse aprendizado tem as formas muito bem definidas pelas fases que o filme apresenta . No início, a agitada e divertida vida de Aron, e no decorrer do tempo após o acidente, as considerações dele sobre tudo que não chegaria a viver se aquele canyon fosse o último capítulo de sua vida. E nessa divisão de fases, Boyle se adequa muito bem a todas elas. Consegue colocar uma direção com ar de videoclipe - que ganha mais força com a montagem rápida - no início, e lidar com o drama seguinte de maneira competente , arrancando imagens belíssimas do ambiente no qual a produção se passa.
Mas , de fato, seria impossível falar de 127 Horas sem citar com veemência o nome de James Franco . Ele é o fator essencial que torna o filme de Boyle acima da média . Toda a emoção passada por Franco é real, assustadoramente tridimensional e penetrante . Nos sentimos tocados de maneira muito especial pela perfomance do jovem ator . Sua interpretação é singular desde sua postura corporal, passando por seu olhar enfraquecido, chegando ao climax nas partes em que encarna a dor que o alpinista passou na vida real . Uma verdadeira amostra de talento que a nova geração de atores possui . Ótimo, merece todas as indicações que vier a receber .
Numa avaliação geral, podemos constatar que 127 Horas é uma brilhante trama baseada em fatos, trasportada para as telas de cinema com muito esmero . E vale também para termos uma percepção mais elevada sobre a própria carreira de Danny Boyle . Ele veio de um filme - Slumdog - que relativiza muito sobre o lado poético da vida, onde o destino se encarrega de dar o rumo a seus personagens . Então deve ser de muito valor dirigir agora um filme biográfico, onde um personagem sozinho tenha que mudar, pela força de vontade de sobreviver, o próprio destino - e aprender com isso uma lição necessária .
5 Estrelas ***** - Excelente
Iniciando com uma edição ágil e uma trilha animada, os créditos iniciais de 127 Horas dão o tom da vida acelerada do alpinista Aron Ralston (James Franco). O título do filme, porém, só aparece na tela - em um fotograma belíssimo - alguns minutos depois, quando o nosso vigoroso protagonista cai de repente numa fenda estreita do Canyon que escalava . Chocado, Aron fica alguns segundos suspenso sem acreditar no que acabou de acontecer . É possível enxergar na sua face os primeiros sentimentos de pânico em decorrência da situação unusual na qual acabara de entrar . E aqueles são apenas os primeiros segundos dos longos 5 dias e 7 horas que o alpinista teve de suportar com uma rocha imprensando seu braço contra a parede do canyon.
E dois anos depois de ser consagrado vencendo o Oscar pelo bom , porém hiper-valorizado Slumdog Millionaire , o diretor inglês Danny Boyle vem agora realizar o seu melhor trabalho nos últimos anos , contando exatamente a história verídica e espetacular de Aron Ralston , o alpinista que passou as 127 horas do título com o braço direito esmagado na fatídica rocha, em uma fenda do Blue John Canyon em Utah , Estados Unidos .
Na trama desenhada no filme, dá-se a entender que Aron, de certo modo, estruturou tudo o que fosse possível para que não fosse resgatado - Não retornava as ligações da mãe há dias, não mantinha mais contato com a ex-namorada Rana (Cleménce Poésy), e, principalmente, não tinha avisado pra ninguém aonde tinha ido . O último contato com seres humanos antes do acidente tinha sido com duas turistas, Kristi (Kate Mara) e Megan (Amber Tamblym), as quais ele tinha guiado por um tempo no passeio . Mas, como pode ser visto no próprio trailer, elas não conseguiram ouvir aos chamados desesperados de Aron . Ele estava sozinho, sem muito o que fazer .
E o roteiro de 127 horas aproveita muito bem todo o potencial que a história real impressionante dispunha . Com um braço amassado , preso , e uma rocha grande e pesada limitando seus movimentos, era muito fácil para Aron enveredar pelo caminho do desespero . ''Do not loose it , Aron '', entretanto, o aventureiro diz . Era preciso manter a paciência para seguir com chances de vida, e entrar em pânico não ajudaria em nada . Com esforço, ele passa por maus bocados - enfrenta a dor, as alucinações , a escassez de água e comida, culminando em ter que beber a própria urina - até ter o ímpeto de amputar o próprio braço com as ferramentas que possuía no momento . Como peça de ilustração de um fato real, o novo longa de Danny Boyle é excepcional . Utiliza sua trilha para temperar a tensão com certa ironia , mas também para pontuá-la em momentos de dor lancinante - como na inconfortável cena em que Aron corta o nervo de seu braço, cena , aliás, que fez pessoas passarem mal em festivais ao redor do mundo . Uma retratação muito talentosa e eficiente da jornada de superação do alpinista .
E talvez ''superação'' seja o adjetivo mais óbvio para 127 Horas . Realmente, a superação física é visível , mas não é só nisso que o termo se baseia . Superação do modo de agir, das concepções que Aron possuía antes de ficar preso por mais de 5 dias numa fenda . Fica muito claro no momento em que ele declara que aquela rocha estava esperando por ele desde que nasceu. Era o ponto de mudança que ele precisava passar, o aprendizado que necesitava adquirir .
E esse aprendizado tem as formas muito bem definidas pelas fases que o filme apresenta . No início, a agitada e divertida vida de Aron, e no decorrer do tempo após o acidente, as considerações dele sobre tudo que não chegaria a viver se aquele canyon fosse o último capítulo de sua vida. E nessa divisão de fases, Boyle se adequa muito bem a todas elas. Consegue colocar uma direção com ar de videoclipe - que ganha mais força com a montagem rápida - no início, e lidar com o drama seguinte de maneira competente , arrancando imagens belíssimas do ambiente no qual a produção se passa.
Mas , de fato, seria impossível falar de 127 Horas sem citar com veemência o nome de James Franco . Ele é o fator essencial que torna o filme de Boyle acima da média . Toda a emoção passada por Franco é real, assustadoramente tridimensional e penetrante . Nos sentimos tocados de maneira muito especial pela perfomance do jovem ator . Sua interpretação é singular desde sua postura corporal, passando por seu olhar enfraquecido, chegando ao climax nas partes em que encarna a dor que o alpinista passou na vida real . Uma verdadeira amostra de talento que a nova geração de atores possui . Ótimo, merece todas as indicações que vier a receber .
Numa avaliação geral, podemos constatar que 127 Horas é uma brilhante trama baseada em fatos, trasportada para as telas de cinema com muito esmero . E vale também para termos uma percepção mais elevada sobre a própria carreira de Danny Boyle . Ele veio de um filme - Slumdog - que relativiza muito sobre o lado poético da vida, onde o destino se encarrega de dar o rumo a seus personagens . Então deve ser de muito valor dirigir agora um filme biográfico, onde um personagem sozinho tenha que mudar, pela força de vontade de sobreviver, o próprio destino - e aprender com isso uma lição necessária .
5 Estrelas ***** - Excelente
quarta-feira, 12 de janeiro de 2011
Além da Vida
Diferencial de Além da Vida fica por conta, basicamente, de Clint Eastwood.
Atualmente , parece que roteiros que lidam com a temática de vida após a morte vem ganhando mais e mais força dentro e fora do Brasil . Há todos os tipos de formas de abordar o tema : Dentro do Brasil, pudemos avaliar a força de movimentação de público que os filmes de Chico Xavier detiveram . Chico Xavier e Nosso Lar constaram como um dos recordes de bilheteria no Brasil em 2010, e tenderam - principalmente , Nosso Lar - para o tipo de abordagem religiosa , onde há enveredamento para o caráter da religião espírita em si . Fora do Brasil, pudemos observar um diretor premiado - Peter Jackson - brincar com o argumento quebrado de Um Olhar do Paraíso, nos entregando um filme fraco e descompassado, que tendia para um tipo de abordagem mais fantasiosa . Mais recentemente, Enter the Void, do genial Gaspar Noé, contribuiu para um tipo de visão do pós-morte muito inovadora, tanto no modo de se filmar, quanto no modo de se narrar. Agora, chega a vez de Clint Eastwood , um mestre consagrado e experiente, dar sua visão ao tema que tanto deu o que falar nos últimos tempos, principalmente dentro do Brasil.
E Além da Vida procura enxergar o tema por um viés menos religioso e mais expansivo , ou seja, sem definir um tipo de religião exata, tentando dissertar sobre a narrativa dos espíritos de forma mais geral , onde até uma pessoa que não possui uma religião definida, por exemplo, possa enxergar os acontecimentos relatados , sem ter que abraçar alguma crença específica. Este é um lado interessante de Além da Vida, e o único problema é que é um dos raros diferenciais encontrados no longa , que apenas fica na média, no seu conteúdo.
A trama se baseia na história de três personagens , que , em pontos diferentes do globo terrestre, apresentam um dilema com a morte - e a possível vida que existe após ela . Nos Estados Unidos , George Lonnegan ( Matt Damon) é um médium que tenta se afastar da sua antiga profissão como vidente profissional, para tentar alcançar uma vida normal. Na França, Marie Lelay ( Cecile de France ), é uma jornalista que , após sofrer uma experiência quase-morte numa viagem de suas férias , busca aprender mais sobre o mundo que existe depois da morte. Já em Londres , na Inglaterra, somos apresentados ao drama do garoto Marcus, que não consegue superar a recente perda do irmão gêmeo Jason .
O roteiro do habilidoso Peter Morgan - que escreveu o excelente Frost/Nixon - se desenvolve sem pressa, costurando com detalhes as três linhas narrativas que , como a própria sinopse oficial do filme já dizia , uma hora iriam se cruzar . Tudo se baseia no desenvolvimento isolado de cada arco até , basicamente, o desfecho do filme . E no aspecto de desenvolver arcos narrativos , Morgan utiliza sua experiência para não cometer deslizes, e manter um desenrolar de trama muito palatável . Como já escrevi anteriormente , Além da Vida tem uma visão da temática pós-morte interessante, pois não se apega a nenhuma religião, construindo sua história paralela a isso . O roteiro encontra muita facilidade ao retratar o tema dessa maneira , e Morgan carrega sua história até um nível bom . Entretanto, não vai além . Não se desenha nada mais ousado ou diferenciado . Toda a narrativa é coerente, consegue até nos envolver, mas é trabalhada com certo comedimento . Não sai muito da superficialidade, e atraca na zona segura de alguns clichês. Deveras, faltou um pouco de ousadia .
Entretanto, entra em cena então, o fator que atua como o grande diferencial em Além da Vida : Clint Eastwood . Como um verdadeiro Midas, o experiente diretor consegue tirar o filme da mediocridade com seu modo de filmar tão redondo e limpo . Eastwood não abusa, não expõe arroubos que já vimos anteriormente na sua carreira, mas com o mínimo de seu talento expresso na película , o longa já ganha muitos pontos . A competência de Eastwood em tirar o melhor de seu elenco , e o seu olhar muito característico e intimista atribuem ao filme um fôlego extra , evitando que seja facilmente esquecido . E que já fique registrado como uma das melhores sequencias do filme, a das tsunamis na Tailândia. Eastwood trabalha com os efeitos especiais de maneira muito eficiente, e o resultado final é uma cena belíssima e aterradora .
Também auxilia o filme o fato de seu elenco responder ao que seu diretor pede com muita eficiência . Matt Damon atua de forma bastante interessante ao interpretar um médium que deseja se afastar de seu dom, tratando-o como uma maldição. Sem exageros , Damon encarna seu personagem com realismo . Eastwood fez bem ao fazer questão de que ele estivesse no filme.
Nos quesitos técnicos, Além da Vida segue o estilo belíssimo dos outros filmes de Eastwood . Tom Stern, colaborador frequente do cineasta, demonstra uma fotografia límpida e bonita, típica dos filmes de Clint . A trilha , então, nos remete imediatamente a Gran Torino. Basicamente, se repete nas partes técnicas, o que deu certo em longas anteriores.
É possível dizer, num apanhado geral, que Além da Vida teve seu roteiro até bem trabalhado por Peter Morgan , que o deixou na média, e só pecou por não faze-lo ir além disso . Levou seu barco até um porto seguro, e preferiu não se arriscar a leva-lo até um destino mais à diante. O grande diferencial, fica mesmo por conta de Eastwood, que, ao emprestar seu olhar ao filme, eleva-o de nível onde pode. É a diferença que a presença de um verdadeiro cineasta faz num filme.
3 Estrelas *** - Aceitável
Atualmente , parece que roteiros que lidam com a temática de vida após a morte vem ganhando mais e mais força dentro e fora do Brasil . Há todos os tipos de formas de abordar o tema : Dentro do Brasil, pudemos avaliar a força de movimentação de público que os filmes de Chico Xavier detiveram . Chico Xavier e Nosso Lar constaram como um dos recordes de bilheteria no Brasil em 2010, e tenderam - principalmente , Nosso Lar - para o tipo de abordagem religiosa , onde há enveredamento para o caráter da religião espírita em si . Fora do Brasil, pudemos observar um diretor premiado - Peter Jackson - brincar com o argumento quebrado de Um Olhar do Paraíso, nos entregando um filme fraco e descompassado, que tendia para um tipo de abordagem mais fantasiosa . Mais recentemente, Enter the Void, do genial Gaspar Noé, contribuiu para um tipo de visão do pós-morte muito inovadora, tanto no modo de se filmar, quanto no modo de se narrar. Agora, chega a vez de Clint Eastwood , um mestre consagrado e experiente, dar sua visão ao tema que tanto deu o que falar nos últimos tempos, principalmente dentro do Brasil.
E Além da Vida procura enxergar o tema por um viés menos religioso e mais expansivo , ou seja, sem definir um tipo de religião exata, tentando dissertar sobre a narrativa dos espíritos de forma mais geral , onde até uma pessoa que não possui uma religião definida, por exemplo, possa enxergar os acontecimentos relatados , sem ter que abraçar alguma crença específica. Este é um lado interessante de Além da Vida, e o único problema é que é um dos raros diferenciais encontrados no longa , que apenas fica na média, no seu conteúdo.
A trama se baseia na história de três personagens , que , em pontos diferentes do globo terrestre, apresentam um dilema com a morte - e a possível vida que existe após ela . Nos Estados Unidos , George Lonnegan ( Matt Damon) é um médium que tenta se afastar da sua antiga profissão como vidente profissional, para tentar alcançar uma vida normal. Na França, Marie Lelay ( Cecile de France ), é uma jornalista que , após sofrer uma experiência quase-morte numa viagem de suas férias , busca aprender mais sobre o mundo que existe depois da morte. Já em Londres , na Inglaterra, somos apresentados ao drama do garoto Marcus, que não consegue superar a recente perda do irmão gêmeo Jason .
O roteiro do habilidoso Peter Morgan - que escreveu o excelente Frost/Nixon - se desenvolve sem pressa, costurando com detalhes as três linhas narrativas que , como a própria sinopse oficial do filme já dizia , uma hora iriam se cruzar . Tudo se baseia no desenvolvimento isolado de cada arco até , basicamente, o desfecho do filme . E no aspecto de desenvolver arcos narrativos , Morgan utiliza sua experiência para não cometer deslizes, e manter um desenrolar de trama muito palatável . Como já escrevi anteriormente , Além da Vida tem uma visão da temática pós-morte interessante, pois não se apega a nenhuma religião, construindo sua história paralela a isso . O roteiro encontra muita facilidade ao retratar o tema dessa maneira , e Morgan carrega sua história até um nível bom . Entretanto, não vai além . Não se desenha nada mais ousado ou diferenciado . Toda a narrativa é coerente, consegue até nos envolver, mas é trabalhada com certo comedimento . Não sai muito da superficialidade, e atraca na zona segura de alguns clichês. Deveras, faltou um pouco de ousadia .
Entretanto, entra em cena então, o fator que atua como o grande diferencial em Além da Vida : Clint Eastwood . Como um verdadeiro Midas, o experiente diretor consegue tirar o filme da mediocridade com seu modo de filmar tão redondo e limpo . Eastwood não abusa, não expõe arroubos que já vimos anteriormente na sua carreira, mas com o mínimo de seu talento expresso na película , o longa já ganha muitos pontos . A competência de Eastwood em tirar o melhor de seu elenco , e o seu olhar muito característico e intimista atribuem ao filme um fôlego extra , evitando que seja facilmente esquecido . E que já fique registrado como uma das melhores sequencias do filme, a das tsunamis na Tailândia. Eastwood trabalha com os efeitos especiais de maneira muito eficiente, e o resultado final é uma cena belíssima e aterradora .
Também auxilia o filme o fato de seu elenco responder ao que seu diretor pede com muita eficiência . Matt Damon atua de forma bastante interessante ao interpretar um médium que deseja se afastar de seu dom, tratando-o como uma maldição. Sem exageros , Damon encarna seu personagem com realismo . Eastwood fez bem ao fazer questão de que ele estivesse no filme.
Nos quesitos técnicos, Além da Vida segue o estilo belíssimo dos outros filmes de Eastwood . Tom Stern, colaborador frequente do cineasta, demonstra uma fotografia límpida e bonita, típica dos filmes de Clint . A trilha , então, nos remete imediatamente a Gran Torino. Basicamente, se repete nas partes técnicas, o que deu certo em longas anteriores.
É possível dizer, num apanhado geral, que Além da Vida teve seu roteiro até bem trabalhado por Peter Morgan , que o deixou na média, e só pecou por não faze-lo ir além disso . Levou seu barco até um porto seguro, e preferiu não se arriscar a leva-lo até um destino mais à diante. O grande diferencial, fica mesmo por conta de Eastwood, que, ao emprestar seu olhar ao filme, eleva-o de nível onde pode. É a diferença que a presença de um verdadeiro cineasta faz num filme.
3 Estrelas *** - Aceitável
domingo, 9 de janeiro de 2011
Incontrolável
Tony Scott ganha pura liberdade para acelerar.
Velocidade é um dos adjetivos que combinam com a filmografia de Tony Scott . Com a mão boa para ação , é do estilo do diretor filmar com urgência , literalmente ''acelerar'' com a câmera na mão . Nos últimos anos, Scott tem tido chances de váriar entre alguns acertos - como o bom De Ja Vú - e alguns erros - tome de exemplo o roteiro ruim de O Sequestro do Metro . De fato, estilo o cineasta possui, além de um dom para a ação invejável.
Falte talvez, então ,algum faro para assinar projetos que combinem com seu modo de dirigir. No seu último trabalho, ele fez o que pôde - girou em volta de Denzel Washington milhares de vezes , tentou apelar para a closes urgentes , enfim , mas nada funcionou pra valer . Era, afinal , um filme que , além de ter um roteiro falho, retratava um sequestro, e esse talvez não fosse o tema mais adequado para Scott . Ele se sente em casa quando realiza ação veloz, e nesse aspecto, tavez não houvesse projeto mais acertado do que este Incontrolável .
Á vontade, na sua zona de conforto, com um roteiro bem trabalhado e com um elenco forte - contando com mais uma participação de Denzel Washington - o diretor não decepciona . E por mais que a trama possa parecer um mero repeteco de diversos filmes onde há um veículo desgovernado, - os dois Velocidades Máximas, por exemplo - é preciso dizer que é quase impossível passar incólume a uma sessão de Incontrolável .
A trama conta a história de um trem de carga que, numa viagem na qual estava carregando toneladas de material inflamável, acabou saindo do controle dos maquinistas responsáveis por ele, e deu a partida acelerando sem ninguém na sua cabine de comando . No perigo iminente de um acidente catastrófico caso esse trem chegasse até o seu destino final, dois maquinistas recém conhecidos - o veterano Frank Barnes ( Denzel Washington) e o novato Will Colson ( Chris Pine ) - se sentem na obrigação de tentar fazer algo para freiar o trem , usando a locomotiva que têm a disposição .
O grande trunfo disponível no roteiro de Mark Bomback talvez seja o olhar diferenciado na composição dos seus personagens . Onde poderia haver fácil banalização pelo clichê - criando verdadeiros vilões e mocinhos - há um um cuidado interessante na humanização das personas ficcionalizadas em questão , e nesse aspecto, talvez o fato de ser um filme inspirado na realidade atue como fator importante . Logo no início do filme, o trem sai do controle por um erro grotesco de Dewey, o verdadeiro ''culpado'' por toda a aventura posterior. Ao longo do filme, Dewey só é tratado como algo do tipo bobão, o que de fato ele é , mas não há como rotulá-lo de vilão. Do mesmo modo, o diretor da empresa (Kevin Dunn) , um capitalista de raiz, não consegue ser vilanizado por completo, até pelo apelo cômico que seu personagem arranca. ''Está demitido'' é a frase-jargão disparada ante qualquer obstáculo. Quer algo mais caricatual que isso? De fato, não há como rotular personagens ''do bem'' ou ''do mal'' em Incontrolável . O que volta os holofotes diretamente sobre o trem em si , criando em cima dele uma vilanização, como no caminhão que inexplicavelmente perseguia o herói no primeiro filme de Steven Spielberg , Encurralado.
O resto, fica pela conta do desenvolvimento acima da média da tensão da perseguição que prende o expectador na cadeira com sucesso . Nisso , Tony Scott não precisa de ajuda alguma. Seu cinema é completamente associável com a velocidade, a adrenalina da correria, o cronômetro na mão, a contagem regressiva para uma possível pirotecnia . Scott respira isso melhor do que ninguém , e Incontrolável se desenha como um excelente exercício de porte mediano para o diretor. Deixando de lado a ação, Scott também consegue dirigir seus atores de forma interessante , deixando tanto Pine quanto Washington muito a vontade nos seus diálogos, e consegue enquadra-los nos seus closes com qualidade acima da média .
Com uma trilha agitada e atuações competentes - menção para Chris Pine, que consegue mais uma vez assegurar merecidamente um lugar de destaque em Hollywood - Incontrolável monta tudo o que Tony Scott pedia desde seu último trabalho. O esquema do diretor é mesmo buscar o movimento, a ação . No início do filme ele já caçava seus protagonistas com zoons rápidos em simples cenas de diálogos. Era a demontração do apetite do cineasta por um projeto que se ajustasse a seu estilo. E todos devemos estar, assim como ele, muito satisfeitos com o resultado final. Afinal, ele está livre pra acelerar.
4 Estrelas **** - Nota 7
Velocidade é um dos adjetivos que combinam com a filmografia de Tony Scott . Com a mão boa para ação , é do estilo do diretor filmar com urgência , literalmente ''acelerar'' com a câmera na mão . Nos últimos anos, Scott tem tido chances de váriar entre alguns acertos - como o bom De Ja Vú - e alguns erros - tome de exemplo o roteiro ruim de O Sequestro do Metro . De fato, estilo o cineasta possui, além de um dom para a ação invejável.
Falte talvez, então ,algum faro para assinar projetos que combinem com seu modo de dirigir. No seu último trabalho, ele fez o que pôde - girou em volta de Denzel Washington milhares de vezes , tentou apelar para a closes urgentes , enfim , mas nada funcionou pra valer . Era, afinal , um filme que , além de ter um roteiro falho, retratava um sequestro, e esse talvez não fosse o tema mais adequado para Scott . Ele se sente em casa quando realiza ação veloz, e nesse aspecto, tavez não houvesse projeto mais acertado do que este Incontrolável .
Á vontade, na sua zona de conforto, com um roteiro bem trabalhado e com um elenco forte - contando com mais uma participação de Denzel Washington - o diretor não decepciona . E por mais que a trama possa parecer um mero repeteco de diversos filmes onde há um veículo desgovernado, - os dois Velocidades Máximas, por exemplo - é preciso dizer que é quase impossível passar incólume a uma sessão de Incontrolável .
A trama conta a história de um trem de carga que, numa viagem na qual estava carregando toneladas de material inflamável, acabou saindo do controle dos maquinistas responsáveis por ele, e deu a partida acelerando sem ninguém na sua cabine de comando . No perigo iminente de um acidente catastrófico caso esse trem chegasse até o seu destino final, dois maquinistas recém conhecidos - o veterano Frank Barnes ( Denzel Washington) e o novato Will Colson ( Chris Pine ) - se sentem na obrigação de tentar fazer algo para freiar o trem , usando a locomotiva que têm a disposição .
O grande trunfo disponível no roteiro de Mark Bomback talvez seja o olhar diferenciado na composição dos seus personagens . Onde poderia haver fácil banalização pelo clichê - criando verdadeiros vilões e mocinhos - há um um cuidado interessante na humanização das personas ficcionalizadas em questão , e nesse aspecto, talvez o fato de ser um filme inspirado na realidade atue como fator importante . Logo no início do filme, o trem sai do controle por um erro grotesco de Dewey, o verdadeiro ''culpado'' por toda a aventura posterior. Ao longo do filme, Dewey só é tratado como algo do tipo bobão, o que de fato ele é , mas não há como rotulá-lo de vilão. Do mesmo modo, o diretor da empresa (Kevin Dunn) , um capitalista de raiz, não consegue ser vilanizado por completo, até pelo apelo cômico que seu personagem arranca. ''Está demitido'' é a frase-jargão disparada ante qualquer obstáculo. Quer algo mais caricatual que isso? De fato, não há como rotular personagens ''do bem'' ou ''do mal'' em Incontrolável . O que volta os holofotes diretamente sobre o trem em si , criando em cima dele uma vilanização, como no caminhão que inexplicavelmente perseguia o herói no primeiro filme de Steven Spielberg , Encurralado.
O resto, fica pela conta do desenvolvimento acima da média da tensão da perseguição que prende o expectador na cadeira com sucesso . Nisso , Tony Scott não precisa de ajuda alguma. Seu cinema é completamente associável com a velocidade, a adrenalina da correria, o cronômetro na mão, a contagem regressiva para uma possível pirotecnia . Scott respira isso melhor do que ninguém , e Incontrolável se desenha como um excelente exercício de porte mediano para o diretor. Deixando de lado a ação, Scott também consegue dirigir seus atores de forma interessante , deixando tanto Pine quanto Washington muito a vontade nos seus diálogos, e consegue enquadra-los nos seus closes com qualidade acima da média .
Com uma trilha agitada e atuações competentes - menção para Chris Pine, que consegue mais uma vez assegurar merecidamente um lugar de destaque em Hollywood - Incontrolável monta tudo o que Tony Scott pedia desde seu último trabalho. O esquema do diretor é mesmo buscar o movimento, a ação . No início do filme ele já caçava seus protagonistas com zoons rápidos em simples cenas de diálogos. Era a demontração do apetite do cineasta por um projeto que se ajustasse a seu estilo. E todos devemos estar, assim como ele, muito satisfeitos com o resultado final. Afinal, ele está livre pra acelerar.
4 Estrelas **** - Nota 7
quinta-feira, 6 de janeiro de 2011
Enter The Void
A poesia psicodélica em forma de cinema de Gaspar Noé.
Apesar de não possuir um currículo muito extenso em número de longa-metragens, - afinal, são apenas 3 - o francês Gaspar Noé tem um feito que muitos cineastas com fichas recheadas de filmes não têm : um estilo próprio que se destaca anos-luz do lugar comum . Noé já tinha uma carreira formada em curtas e médias desde de 1985, entretanto , seu primeiro longa foi lançado em 1998 , o filme Sozinho Contra Todos . Com uma narrativa de temas fortes, o filme continuava a contar a história iniciada no média Carne, de 1992 . Um protagonista com uma vida agonizante foi o primeiro marco de Noé no cinema de longas, e já mostrava o que viria pela frente. Em 2002, o francês chocou a platéia em Cannes com Irreversível , um filme que dialogava sobre o tempo de maneira profunda , e sem medo de criar impacto, seja com a sua violência gráfica, ou com a famosa cena de estupro de 9 minutos . O modo de filmar completamente fora dos padrões pré-concebidos de Noé também virou os holofotes do mundo cinéfilo sobre o diretor. Camêras que voavam sem direção sobre o set configuravam uma característica intensa do cineasta.
Agora, já no final da década de 2000, Gaspar Noé vem lançar seu insano terceiro longa. E se o diretor gostou de fazer um discurso sobre o tempo em Irreversível, ele consegue aqui alcançar o ápice de sua reflexão em Enter The Void . Seu discurso sobre a transitividade não só do tempo, mas também da vida, é desenhado em forma de uma poesia -tanto narrativa quanto visual -agressiva e psicodélica .
A trama da vez conta a história de Oscar(Nathaniel Brown) e Linda(Paz de la Huerta) , dois irmãos que vivem no submundo de Tóquio como podem : ele, traficando drogas , e ela, sendo uma stripper. Em uma de suas entregas de drogas, Oscar é cercado pela polícia, e acaba sendo baleado . Morto, o espírito de Oscar começa a vagar pela cidade, observando o que acontece com seus amigos após sua morte. Em meio a delírios entre fantasia e realidade, Oscar busca cumprir a promessa de nunca abandonar a irmã.
O objetivo de Noé ao contar a história de Enter The Void é justamente estudar mais afundo o conceito de transitividade do tempo, das fases do tempo. Como uma continuidade da sua linha de raciocínio iniciada em Irreversível , que mostrava como o tempo aos poucos deteriorava tudo que era belo, em Enter The Void, tenta se passar um significado mais amplo para o tempo. Nada mais amplo para o tempo do que a vida, e também a morte. Um dos mistérios mais questionados da história da humanidade é explanado de forma belíssima nesta película , que retrata com sensibilidade e realismo os tons da vida e da morte. A sensação do chegar da morte e de uma montanha de sonhos desmoronar do nada é transmitida de uma forma tão sensata e tocante, que quase podemos enxergar as emoções brotando da tela. O filme da nossa vida que passa em nossas mentes quando morremos serve não só para ilustrar esta idéia, mas no filme também é usado de maneira inteligentíssima para nos mostrar a vida do protagonista até ali .
Depois da morte, temos então a desenvoltura do filme em relação a perspectiva do espírito. Viagens aéreas loucas e cheias de curvas pelo submundo sujo da cidade de Tóquio nos mostram com riqueza de emoções todo o resto da trajetória dos personagens que restaram . Enter The Void é também um filme belíssimo na construção de seus personagens, que são cristalinos e de uma tridimensionalidade invejável. Todo o drama de Linda é passado de maneira crua, sem medo, com os choques que Noé já nos acostumou a tomar. Se você é sensível, terá dificuldades de assistir alguns momentos, seja pela violência forte ou pela explicitação do sexo no seu patamar mais elevado. Mas, como algumas más línguas por ventura possam vir a reclamar, é preciso ser dito: Nada é gratuito. O cinema puro , livre das amarras hollywoodianas, de Gaspar Noé, constrói seus personagens com uma carpintaria dramática muito interessante, conseguindo penetrar em nossas mentes com força grandiosa, de modo que outros produtos mais recatados não conseguiriam ultrapassar nem mesmo nossa epiderme. Noé também ganha pontos no desenvolvimento de seu roteiro, com arcos narrativos que passam quase irretocáveis, conseguindo passar sua história com muito mérito. O mesmo , por exemplo, não conseguiu ser feito, por um filme que tinha uma história semelhante, mas muitos erros : Um Olhar no Paraíso, de Peter Jackson . Noé mostra ter muito mais talento, em todos os aspectos.
O que mais nos deixa cativados por Enter The Void talvez seja seu desfecho, sua tacada final que nos deixa pensando ''Como não pensei nisso desde o princípio?''. A mensagem final registrada é a cereja no bolo para todo o espetáculo anterior. O que nos é passado é a conclusão do cineasta em relação a toda o debate de si próprio sobre a transitividade da vida, num nível que chega próximo de um Fonte da Vida, do genial Darren Aronofsky.
E se Noé criou todo um roteiro de maneira incrível , fez o dobro em sua direção. O que há de muito particular em Enter The Void é o modo como a história a ser contada depende estruturalmente da direção, que precisa ser específica, sem o mínimo erro ou deslize que não caia bem . E Gaspar Noé dirige seu filme sem erros. Arrebenta fazendo um filme praticamente todo em primeira pessoa( Com efeitos de câmera soberbos e originais) . Os momentos de viagem mental pelo ácido, os incríveis vôos do espírito de Oscar por uma Tóquio suja , a câmera que dá efeitos de circularidade em ambientes, edições feitas pelas entradas em locais de luz...tudo é um espetáculo visual que como produto final, não tem precedentes . E como de costume, a fotografia aqui , como no filme anterior de Noé, continua suja , dando aspecto que dá o tom essencial para o visual da película.
Nas atuações, é interessante ver que nem Nathaniel Brown, nem Cyril Roy (que interpreta Alex) são atores profissionais, e mesmo assim, desempenham seus papéis de forma realista e incrivelmente competente. Já Paz de la Huerta que ''realmente estava consciente do fato que estava interpretando um papel'' como disse o próprio Noé , também consegue passar sua personagem com muita verdade e demonstra talento.
Por fim, é preciso dizer , para quem for assisitr Enter The Void, que se trata de uma experiência completamente diferente de tudo que é feito no cinema em geral. É um tipo de filme livre de qualquer recato, com uma intelectualidade muito própria , e marcante. Pode ser muito cedo para dizer , e talvez seja uma comparação estúpida, mas acredito que estejamos lidando com algo próximo do Laranja Mecânica da década. De fato, Enter The Void é um novo clássico, e até aqui, é a obra-prima de Gaspar Noé. Todos que amam cinema merecem contemplar esta Obra de Arte.
5 Estrelas ***** - Obra-Prima
Apesar de não possuir um currículo muito extenso em número de longa-metragens, - afinal, são apenas 3 - o francês Gaspar Noé tem um feito que muitos cineastas com fichas recheadas de filmes não têm : um estilo próprio que se destaca anos-luz do lugar comum . Noé já tinha uma carreira formada em curtas e médias desde de 1985, entretanto , seu primeiro longa foi lançado em 1998 , o filme Sozinho Contra Todos . Com uma narrativa de temas fortes, o filme continuava a contar a história iniciada no média Carne, de 1992 . Um protagonista com uma vida agonizante foi o primeiro marco de Noé no cinema de longas, e já mostrava o que viria pela frente. Em 2002, o francês chocou a platéia em Cannes com Irreversível , um filme que dialogava sobre o tempo de maneira profunda , e sem medo de criar impacto, seja com a sua violência gráfica, ou com a famosa cena de estupro de 9 minutos . O modo de filmar completamente fora dos padrões pré-concebidos de Noé também virou os holofotes do mundo cinéfilo sobre o diretor. Camêras que voavam sem direção sobre o set configuravam uma característica intensa do cineasta.
Agora, já no final da década de 2000, Gaspar Noé vem lançar seu insano terceiro longa. E se o diretor gostou de fazer um discurso sobre o tempo em Irreversível, ele consegue aqui alcançar o ápice de sua reflexão em Enter The Void . Seu discurso sobre a transitividade não só do tempo, mas também da vida, é desenhado em forma de uma poesia -tanto narrativa quanto visual -agressiva e psicodélica .
A trama da vez conta a história de Oscar(Nathaniel Brown) e Linda(Paz de la Huerta) , dois irmãos que vivem no submundo de Tóquio como podem : ele, traficando drogas , e ela, sendo uma stripper. Em uma de suas entregas de drogas, Oscar é cercado pela polícia, e acaba sendo baleado . Morto, o espírito de Oscar começa a vagar pela cidade, observando o que acontece com seus amigos após sua morte. Em meio a delírios entre fantasia e realidade, Oscar busca cumprir a promessa de nunca abandonar a irmã.
O objetivo de Noé ao contar a história de Enter The Void é justamente estudar mais afundo o conceito de transitividade do tempo, das fases do tempo. Como uma continuidade da sua linha de raciocínio iniciada em Irreversível , que mostrava como o tempo aos poucos deteriorava tudo que era belo, em Enter The Void, tenta se passar um significado mais amplo para o tempo. Nada mais amplo para o tempo do que a vida, e também a morte. Um dos mistérios mais questionados da história da humanidade é explanado de forma belíssima nesta película , que retrata com sensibilidade e realismo os tons da vida e da morte. A sensação do chegar da morte e de uma montanha de sonhos desmoronar do nada é transmitida de uma forma tão sensata e tocante, que quase podemos enxergar as emoções brotando da tela. O filme da nossa vida que passa em nossas mentes quando morremos serve não só para ilustrar esta idéia, mas no filme também é usado de maneira inteligentíssima para nos mostrar a vida do protagonista até ali .
Depois da morte, temos então a desenvoltura do filme em relação a perspectiva do espírito. Viagens aéreas loucas e cheias de curvas pelo submundo sujo da cidade de Tóquio nos mostram com riqueza de emoções todo o resto da trajetória dos personagens que restaram . Enter The Void é também um filme belíssimo na construção de seus personagens, que são cristalinos e de uma tridimensionalidade invejável. Todo o drama de Linda é passado de maneira crua, sem medo, com os choques que Noé já nos acostumou a tomar. Se você é sensível, terá dificuldades de assistir alguns momentos, seja pela violência forte ou pela explicitação do sexo no seu patamar mais elevado. Mas, como algumas más línguas por ventura possam vir a reclamar, é preciso ser dito: Nada é gratuito. O cinema puro , livre das amarras hollywoodianas, de Gaspar Noé, constrói seus personagens com uma carpintaria dramática muito interessante, conseguindo penetrar em nossas mentes com força grandiosa, de modo que outros produtos mais recatados não conseguiriam ultrapassar nem mesmo nossa epiderme. Noé também ganha pontos no desenvolvimento de seu roteiro, com arcos narrativos que passam quase irretocáveis, conseguindo passar sua história com muito mérito. O mesmo , por exemplo, não conseguiu ser feito, por um filme que tinha uma história semelhante, mas muitos erros : Um Olhar no Paraíso, de Peter Jackson . Noé mostra ter muito mais talento, em todos os aspectos.
O que mais nos deixa cativados por Enter The Void talvez seja seu desfecho, sua tacada final que nos deixa pensando ''Como não pensei nisso desde o princípio?''. A mensagem final registrada é a cereja no bolo para todo o espetáculo anterior. O que nos é passado é a conclusão do cineasta em relação a toda o debate de si próprio sobre a transitividade da vida, num nível que chega próximo de um Fonte da Vida, do genial Darren Aronofsky.
E se Noé criou todo um roteiro de maneira incrível , fez o dobro em sua direção. O que há de muito particular em Enter The Void é o modo como a história a ser contada depende estruturalmente da direção, que precisa ser específica, sem o mínimo erro ou deslize que não caia bem . E Gaspar Noé dirige seu filme sem erros. Arrebenta fazendo um filme praticamente todo em primeira pessoa( Com efeitos de câmera soberbos e originais) . Os momentos de viagem mental pelo ácido, os incríveis vôos do espírito de Oscar por uma Tóquio suja , a câmera que dá efeitos de circularidade em ambientes, edições feitas pelas entradas em locais de luz...tudo é um espetáculo visual que como produto final, não tem precedentes . E como de costume, a fotografia aqui , como no filme anterior de Noé, continua suja , dando aspecto que dá o tom essencial para o visual da película.
Nas atuações, é interessante ver que nem Nathaniel Brown, nem Cyril Roy (que interpreta Alex) são atores profissionais, e mesmo assim, desempenham seus papéis de forma realista e incrivelmente competente. Já Paz de la Huerta que ''realmente estava consciente do fato que estava interpretando um papel'' como disse o próprio Noé , também consegue passar sua personagem com muita verdade e demonstra talento.
Por fim, é preciso dizer , para quem for assisitr Enter The Void, que se trata de uma experiência completamente diferente de tudo que é feito no cinema em geral. É um tipo de filme livre de qualquer recato, com uma intelectualidade muito própria , e marcante. Pode ser muito cedo para dizer , e talvez seja uma comparação estúpida, mas acredito que estejamos lidando com algo próximo do Laranja Mecânica da década. De fato, Enter The Void é um novo clássico, e até aqui, é a obra-prima de Gaspar Noé. Todos que amam cinema merecem contemplar esta Obra de Arte.
5 Estrelas ***** - Obra-Prima
domingo, 2 de janeiro de 2011
Old School Trailers
The Other Woman
Natalie Portman está em muitas produções cinematográficas atualmente, e neste ano de 2011 ela estrelará filmes como Thor, Black Swan( que estréia no Brasil em 2011) , Your Highness e The Other Woman . O trailer do filme dirigido por Don Roos, roteirista de Marley e Eu , conta a história de uma advogada que, depois de separar seu chefe da esposa, casa-se com ele. Juntos, eles tem uma filha, a qual morre ainda bebê . A trama então parece se focar na tentativa da advogada em manter um relacionamento saudável com o seu enteado, fruto da relação anterior do marido. O trailer conta bastante da história, mas não gera muitas expectativas em relação a narrativa . O nosso aguardo fica por mais uma atuação deslumbrante da talentosíssima Natalie Portman.
3 Estrelas ***
Natalie Portman está em muitas produções cinematográficas atualmente, e neste ano de 2011 ela estrelará filmes como Thor, Black Swan( que estréia no Brasil em 2011) , Your Highness e The Other Woman . O trailer do filme dirigido por Don Roos, roteirista de Marley e Eu , conta a história de uma advogada que, depois de separar seu chefe da esposa, casa-se com ele. Juntos, eles tem uma filha, a qual morre ainda bebê . A trama então parece se focar na tentativa da advogada em manter um relacionamento saudável com o seu enteado, fruto da relação anterior do marido. O trailer conta bastante da história, mas não gera muitas expectativas em relação a narrativa . O nosso aguardo fica por mais uma atuação deslumbrante da talentosíssima Natalie Portman.
3 Estrelas ***
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