A poesia psicodélica em forma de cinema de Gaspar Noé.
Apesar de não possuir um currículo muito extenso em número de longa-metragens, - afinal, são apenas 3 - o francês Gaspar Noé tem um feito que muitos cineastas com fichas recheadas de filmes não têm : um estilo próprio que se destaca anos-luz do lugar comum . Noé já tinha uma carreira formada em curtas e médias desde de 1985, entretanto , seu primeiro longa foi lançado em 1998 , o filme Sozinho Contra Todos . Com uma narrativa de temas fortes, o filme continuava a contar a história iniciada no média Carne, de 1992 . Um protagonista com uma vida agonizante foi o primeiro marco de Noé no cinema de longas, e já mostrava o que viria pela frente. Em 2002, o francês chocou a platéia em Cannes com Irreversível , um filme que dialogava sobre o tempo de maneira profunda , e sem medo de criar impacto, seja com a sua violência gráfica, ou com a famosa cena de estupro de 9 minutos . O modo de filmar completamente fora dos padrões pré-concebidos de Noé também virou os holofotes do mundo cinéfilo sobre o diretor. Camêras que voavam sem direção sobre o set configuravam uma característica intensa do cineasta.
Agora, já no final da década de 2000, Gaspar Noé vem lançar seu insano terceiro longa. E se o diretor gostou de fazer um discurso sobre o tempo em Irreversível, ele consegue aqui alcançar o ápice de sua reflexão em Enter The Void . Seu discurso sobre a transitividade não só do tempo, mas também da vida, é desenhado em forma de uma poesia -tanto narrativa quanto visual -agressiva e psicodélica .
A trama da vez conta a história de Oscar(Nathaniel Brown) e Linda(Paz de la Huerta) , dois irmãos que vivem no submundo de Tóquio como podem : ele, traficando drogas , e ela, sendo uma stripper. Em uma de suas entregas de drogas, Oscar é cercado pela polícia, e acaba sendo baleado . Morto, o espírito de Oscar começa a vagar pela cidade, observando o que acontece com seus amigos após sua morte. Em meio a delírios entre fantasia e realidade, Oscar busca cumprir a promessa de nunca abandonar a irmã.
O objetivo de Noé ao contar a história de Enter The Void é justamente estudar mais afundo o conceito de transitividade do tempo, das fases do tempo. Como uma continuidade da sua linha de raciocínio iniciada em Irreversível , que mostrava como o tempo aos poucos deteriorava tudo que era belo, em Enter The Void, tenta se passar um significado mais amplo para o tempo. Nada mais amplo para o tempo do que a vida, e também a morte. Um dos mistérios mais questionados da história da humanidade é explanado de forma belíssima nesta película , que retrata com sensibilidade e realismo os tons da vida e da morte. A sensação do chegar da morte e de uma montanha de sonhos desmoronar do nada é transmitida de uma forma tão sensata e tocante, que quase podemos enxergar as emoções brotando da tela. O filme da nossa vida que passa em nossas mentes quando morremos serve não só para ilustrar esta idéia, mas no filme também é usado de maneira inteligentíssima para nos mostrar a vida do protagonista até ali .
Depois da morte, temos então a desenvoltura do filme em relação a perspectiva do espírito. Viagens aéreas loucas e cheias de curvas pelo submundo sujo da cidade de Tóquio nos mostram com riqueza de emoções todo o resto da trajetória dos personagens que restaram . Enter The Void é também um filme belíssimo na construção de seus personagens, que são cristalinos e de uma tridimensionalidade invejável. Todo o drama de Linda é passado de maneira crua, sem medo, com os choques que Noé já nos acostumou a tomar. Se você é sensível, terá dificuldades de assistir alguns momentos, seja pela violência forte ou pela explicitação do sexo no seu patamar mais elevado. Mas, como algumas más línguas por ventura possam vir a reclamar, é preciso ser dito: Nada é gratuito. O cinema puro , livre das amarras hollywoodianas, de Gaspar Noé, constrói seus personagens com uma carpintaria dramática muito interessante, conseguindo penetrar em nossas mentes com força grandiosa, de modo que outros produtos mais recatados não conseguiriam ultrapassar nem mesmo nossa epiderme. Noé também ganha pontos no desenvolvimento de seu roteiro, com arcos narrativos que passam quase irretocáveis, conseguindo passar sua história com muito mérito. O mesmo , por exemplo, não conseguiu ser feito, por um filme que tinha uma história semelhante, mas muitos erros : Um Olhar no Paraíso, de Peter Jackson . Noé mostra ter muito mais talento, em todos os aspectos.
O que mais nos deixa cativados por Enter The Void talvez seja seu desfecho, sua tacada final que nos deixa pensando ''Como não pensei nisso desde o princípio?''. A mensagem final registrada é a cereja no bolo para todo o espetáculo anterior. O que nos é passado é a conclusão do cineasta em relação a toda o debate de si próprio sobre a transitividade da vida, num nível que chega próximo de um Fonte da Vida, do genial Darren Aronofsky.
E se Noé criou todo um roteiro de maneira incrível , fez o dobro em sua direção. O que há de muito particular em Enter The Void é o modo como a história a ser contada depende estruturalmente da direção, que precisa ser específica, sem o mínimo erro ou deslize que não caia bem . E Gaspar Noé dirige seu filme sem erros. Arrebenta fazendo um filme praticamente todo em primeira pessoa( Com efeitos de câmera soberbos e originais) . Os momentos de viagem mental pelo ácido, os incríveis vôos do espírito de Oscar por uma Tóquio suja , a câmera que dá efeitos de circularidade em ambientes, edições feitas pelas entradas em locais de luz...tudo é um espetáculo visual que como produto final, não tem precedentes . E como de costume, a fotografia aqui , como no filme anterior de Noé, continua suja , dando aspecto que dá o tom essencial para o visual da película.
Nas atuações, é interessante ver que nem Nathaniel Brown, nem Cyril Roy (que interpreta Alex) são atores profissionais, e mesmo assim, desempenham seus papéis de forma realista e incrivelmente competente. Já Paz de la Huerta que ''realmente estava consciente do fato que estava interpretando um papel'' como disse o próprio Noé , também consegue passar sua personagem com muita verdade e demonstra talento.
Por fim, é preciso dizer , para quem for assisitr Enter The Void, que se trata de uma experiência completamente diferente de tudo que é feito no cinema em geral. É um tipo de filme livre de qualquer recato, com uma intelectualidade muito própria , e marcante. Pode ser muito cedo para dizer , e talvez seja uma comparação estúpida, mas acredito que estejamos lidando com algo próximo do Laranja Mecânica da década. De fato, Enter The Void é um novo clássico, e até aqui, é a obra-prima de Gaspar Noé. Todos que amam cinema merecem contemplar esta Obra de Arte.
5 Estrelas ***** - Obra-Prima
Um filme tão pretensioso quanto seu diretor... Muito diferente de Laranja Mecânica e 2001, que sim são obras de arte, mas este aqui se demonstra apenas uma apresentação de slides com imagens fúteis e descartáveis... Roteiro vazio e simples, sim, simples... O cara morre e fica vagando.. vagando... vagando... vagando... efeitos pirotécnicos pra foderem a vista do espectador. Não, este filme é superestimado demais e é apenas por fãs de Noé e infuencias de críticos que muita gente fala bem dele... Um nada sobre nada.
ResponderExcluirPelo amor de deus esse comentário acima é extremamente BIZARRO, enter the void é, sem dúvida alguma, uma obra prima, desde a narrativa até a fotografia e roteiro, com certeza é um dos melhores filmes da decada, parabéns pela resenha, simplesmente sensacional, os que não gostaram, que se contentem com os blockbusters semanais
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